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 A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 06/2019 sobre a reforma da Previdência Social, assinada pelo Ministro da Economia, Paulo Guedes, visa modificar e definir novas regras para a aposentadoria, pensões por morte e limite de acumulação de benefícios. Enviada à Câmara Federal, no dia 20 de fevereiro, a PEC tramita nas comissões internas da Casa Parlamentar, antes de ir à votação.   

 

A Previdência Social, no Brasil, é um direito previsto no art. 6° da Constituição Federal de 1988. As mudanças nos benefícios, segundo o Governo Federal, vão impactar todas as classes trabalhadoras do regime geral e serviço público, nas instâncias federal, com previsão para aplicação nos Estados e Municípios, em 180 dias a partir da aprovação da lei.

A advogada Cindy Nidaira, membra da Comissão de Direito Previdenciário da OAB/PG, defende que a reforma da Previdência garantirá que o sistema previdenciário continue funcionando. “Ainda é difícil falar em impactos positivos ou negativos, porque a reforma, certamente, sofrerá mudanças”, destaca. “O mais adequado é falar que a reforma é necessária para garantir a continuidade do regime geral”, acrescenta.

Para o presidente regional do Sindicato dos Trabalhadores de Educação Pública do Paraná (APP), Tércio Alves do Nascimento, a reforma proposta pelo governo atende apenas às necessidades do sistema e do mercado de trabalho. “A única certeza que temos é que essa reforma da Previdência não vai assistir as necessidades da classe trabalhadora”, afirma.

Cerca de R$ 500 bilhões foram gastos no Brasil com a Previdência Social, em 2018, de acordo com dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). No Paraná, R$28 bilhões e em Ponta Grossa um total de R$ 923 milhões, divididos entre a população urbana e rural. No mês de dezembro de 2018, Ponta Grossa emitiu mais de 52 mil benefícios, cerca de R$71 milhões. Cerca de 15% da população da cidade recebe fundos da Previdência.

 

A DÍVIDA DAS EMPRESAS

De acordo com dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), os maiores devedores previdenciários são as grandes empresas. O valor total, extraído de fevereiro de 2017, chega a mais de R$ 50 bilhões. “O rombo existe porque quem deixou de cumprir o seu papel é a própria elite, são eles que deixam de arcar com as despesas”, comenta Nascimento. Entre os maiores devedores estão a Associação Educacional Luterana do Brasil, Banco Bradesco, Marfrig Global Foods S.A e o Instituto Presbiteriano Mackenzie.

De acordo com o advogado João Alfredo Morgado, especialista em Direito Previdenciário, a reforma deveria ser feita de forma que ajudasse os trabalhadores, progredindo com a igualdade e garantindo os direitos já existentes. “Falando em igualdade, é difícil aceitar o fato de existir aposentadorias e pensões milionárias e vitalícias para filhas de militares, políticos, e até para o próprio Presidente Bolsonaro”, expõe.

Segundo Nidaira, outras alternativas para solucionar o rombo do orçamento seria diminuir o percentual dos valores desviados por meio da Desvinculação das Receitas da União (DRU), que era de 20% e aumentou para 30%. Para a advogada, existe a possibilidade de cobrança, por parte dos governos, das grandes dividas da previdência. “É necessário rever questões tributárias, administrativas, corte de privilégios e consolidar e efetivar medidas de combate à corrupção”, ressalta.

“Mais importante que as possíveis reformas, é a abrangência da medida. É necessário que sejam combatidos os privilégios de determinadas categorias e que, todos os trabalhadores, autoridades e políticos participem da reforma”, evidencia Nidaira.

 

OS TRABALHADORES QUE PAGAM

Nascimento avalia os impactos da reforma como negativos. “Trabalhando por mais tempo, impeço a rotatividade de novos profissionais. Assim o desemprego tende a aumentar”, explica. “Um país que não contrata, prejudica de maneira direta a receita, que, sendo limitada, não vai ter como crescer”, informa.  

O presidente da APP prevê consequências com a ampliação da idade mínima e tempo de contribuição para os professores. “Existe a preocupação com a qualidade de vida do profissional da educação e a qualidade de trabalho que será prejudicada também”, examina. “É praticamente impossível um professor trabalhar até os 70 anos de idade”, conclui.

Para Nascimento, a reforma da Previdência tem que ser feita, mas, de outra maneira. “É necessária uma reforma equilibrada, em que a classe trabalhadora não tenha que arcar com as consequências sozinha”, explica. “A atual proposta visa beneficiar as empresas; o trabalhador é o único prejudicado”, afirma.

 

O DÉFICIT DA PREVIDÊNCIA

De acordo com o Ministério da Fazenda do Brasil, cerca de 13% do Produto Interno Bruto (PIB) do país é destinado aos gastos com a Previdência Social, que engloba o Sistema Único de Saúde, a Seguridade Social e a Aposentadoria.  Os gastos são proporcionais aos de países como Áustria e Portugal, onde o percentual da população idosa é maior que do Brasil. Segundo dados do Ministério da Economia, o déficit da Previdência Social, em 2018, foi de R$ 266 bilhões, a projeção para 2019 é de R$ 292 bilhões.

Para Morgado, o rombo orçamentário do país não é por causa da Previdência e sim devido à má administração do governo. “A intenção do governo é solucionar um problema tirando os direitos do trabalhador brasileiro, a única intenção deles é apenas arrecadar”, afirma.

Morgado enfatiza que ao analisar as contas previdenciárias, o governo apresenta a receita das contribuições ao INSS, descontando os gastos dos benefícios da Previdência. O advogado explica que o Sistema de Seguridade Social, previsto nos artigos 194 e 195 da Constituição Federal, existe a partir de outras arrecadações, além da previdenciária, como Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS); Contribuição Social sobre Lucro Líquido PIS/PASEP (destinado ao seguro-desemprego) e Receita de Concurso de Prognósticos.

“O governo, para justificar o falso déficit, está deixando de citar as outras receitas que também fazem parte dos pagamentos de benefícios previdenciários”, afirma. “Considerando todas essas arrecadações é muito provável que, ao invés de acontecer um deficit, ocorrerá um superavit”, avalia Morgado, levando em conta as possibilidades entre saldos negativos e positivos, respectivamente.

 

REFORMA ADIA SONHO DA APOSENTADORIA

Segundo Mauro Pereira, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Ponta Grossa os trabalhadores serão impactados com a possibilidade de não se aposentar. “A reforma da Previdência rouba o sonho da aposentadoria do trabalhador. Ele precisaria estar na ativa com 65 anos e essa não é a realidade que se vê hoje, principalmente dentro das indústrias”, relata.

Pereira afirma que o Chile, país em que foi implementada a reforma em 1981, é usado como parâmetro para a análise da qualidade de vida da população. O salário mínimo daquele país é 264 mil pesos (aproximadamente R$ 1.500). Mas, de acordo com dados da Superintendência de Pensões do Governo Chileno, 90% dos aposentados recebem menos que 150.000 pesos (R$ 854). O que é muito baixo.

“O aposentado não tem renda suficiente para se sustentar. O que vira um problema social”, explica Pereira. De acordo com o sindicalista, o governo não tem condição de suprir a demanda econômica da população. “O reflexo disso são os aumentos no número de suicídios de idosos no país”, afirma.

Para os dois sindicatos, os trabalhadores não estão cientes das mudanças que a reforma da Previdência. Se aprovada, irá causar no mercado de trabalho. “A população é induzida ao erro de acreditar que a única saída é essa reforma. Mas podem existir outros formatos que privilegiem o trabalhador e não só o mercado”, retrata Pereira. “O que vemos sempre é a priorização da visão do mercado e das empresas”, avalia.

O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos ressalta que faltam informações claras sobre o papel do trabalhador no mercado. “Faz parte da cultura brasileira acreditar que o trabalhador não deve ser valorizado e que não é participante da mudança”, comenta. Para o presidente da APP, o erro dos trabalhadores é querer se manter fora do meio político. “Esperamos que a classe trabalhadora abra os olhos a tempo de entender os prejuízos que poderemos enfrentar”, confirma.

Nascimento vê a reforma da Previdência como um retrocesso nos direitos da população. “O sistema atual não se preocupa com os trabalhadores. A população vai perder poder aquisitivo e direitos. Se a reforma for aprovada, é essa realidade que iremos enfrentar”, alerta. Para os presidentes dos dois sindicais, as melhores estratégias para a conscientização da classe trabalhadora ocorrem através de manifestações, de mobilizações e da abertura de espaço na mídia para a pluralização de vozes.

De acordo com o Departamento de Recursos Humanos do INSS de Ponta Grossa, os funcionários do órgão não estão permitidos para falar da PEC da Reforma da Previdência. Até o momento do fechamento desta reportagem, não foi possível contato com a assessoria do INSS, localizada em Curitiba. O Sindicato Rural de Ponta Grossa e a Associação Comercial, Industrial e Empresarial de Ponta Grossa (ACIPG) foram contatados mas não quiseram dar entrevista.

 Publicada em 06/06/2019, às 13h56 Republicada em 14/06/2019, às 15h37