Cinco anos no comando da boleia foram suficientes para que Charles Douglas Dziuba traga uma série de experiências e casos para contar. Engana-se quem pensa que ser caminhoneiro é um projeto de vida. Durante oito anos vestindo trajes sociais e desfrutando do ar-condicionado na administração de uma agência bancária, dois foram como gerente, trabalhando em Jaguariaíva, Ponta Grossa e Arapoti, nessa ordem. Ele também dividia seu tempo na empresa própria de comunicação visual. Em 2017, depois da falência da empresa e com as dívidas chegando aos baldes, ele optou pela demissão do banco para se arriscar nas estradas do Brasil. “É impossível você trabalhar em qualquer instituição financeira tendo problemas com Serasa, esse tipo de coisa”, afirma Charles.
Charles raspou as economias e comprou um caminhão Scania 113, ano 1995, já bem usado. Sua primeira carga foi adubo, transportado de Paranaguá para Mato Grosso, uma distância que mede, no mínimo, 3000 km de distância. A viagem foi um desafio para quem estava acostumado com o dia a dia bancário.
Ele é casado com Alessandra e tem dois filhos, Gustavo e Izadora. Neste momento, ele e a família se mudaram para Castro, cidade natal de Charles, e sua esposa começou a trabalhar em um laboratório de análises clínicas, como atendente.
Arquivo: Periódico
Não é porque experimentava uma novidade que tudo seria flores. Em dezembro de 2017, o caminhão de Charles foi roubado enquanto saía de Várzea Grande, região metropolitana de Cuiabá, para fazer um carregamento. “Levaram o caminhão e fiquei dois dias e meio em cativeiro, deitado em um quarto, amarrado, com um pano na cabeça. Eu achei que eu ia morrer”. Somente após ter sido agredido, foi solto no meio do nada, em um matagal. O caminhoneiro conta que foi complicado conseguir ajuda na beira da estrada para ir até a polícia. “Me soltaram igual mendigo no meio do mato, que até para conseguir uma carona foi difícil”.
No dia 21 de dezembro, seis dias depois de voltar para casa, ele conseguiu um novo emprego em Ponta Grossa e ainda persistiu na função de caminhoneiro. De acordo com Charles, a sensação foi de gratidão por passar as festas de fim de ano com a família e com dinheiro no bolso mesmo depois do trauma que tinha vivenciado. Seis meses mais tarde, começou a trabalhar em outra empresa de transporte da cidade. Desta vez, como motorista de bitrem e caçamba.
Apesar do reconhecimento que recebia como motorista da transportadora, Charles queria deixar a estrada até o final de 2021. “Caminhoneiro é muito mal tratado em fila de carregamento, de descarga, sofre perigo de roubo. Você sair de casa e ter que ficar 25 dias fora. Tem que gostar muito, o que não era o meu caso”, explica Charles.
No final de 2021, ele trocou as rodovias pela função de gestor de tráfego. Por conta da sua experiência anterior com atendimento ao público quando trabalhava no banco e do seu bom relacionamento com os colegas motoristas, Charles aceitou essa oportunidade que lhe foi oferecida. A função do gestor de tráfego é ser o primeiro contato com o motorista, controlar os caminhões, traçar planos, estratégias e fazer controle de atividades.
Charles trabalhou cinco anos na estrada e se sente realizado na posição em que está hoje. Ele conta que atualmente seu salário é a metade do que ganhava como motorista, mas que é uma escolha de vida. “Não é que o motorista ganha bem, na verdade o motorista trabalha muito. Todo dia de domingo a domingo, não tem final de semana, não tem feriado, não tem nada. Muitas pessoas hoje trabalham com caminhão por conta do atrativo financeiro, mas é uma vida muito sofrida”, declara.
Ficha Técnica:
Repórter: Larissa Onorio
Edição e publicação: Valéria Laroca
Supervisão de produção: Muriel E. P. Amaral
Supervisão de publicação: Marcos Zibordi e Maurício Liesen