Guia de turismo durante visitação ao Parque Estadual de Vila Velha Foto: Ângelo Rocha
Em bancos próximos à entrada do Parque Estadual de Vila Velha os guias aguardavam pela chegada dos visitantes. Uma pequena movimentação no local, típico de sexta-feira. A orientação inicial veio de um vídeo, com aproximadamente 15 minutos de duração, e as regras eram claras: não saiam da trilha, não alimentem os animais, mantenham-se sempre próximos ao guia. Com um olhar cheio de curiosidade e mochila nas costas, o grupo de visitantes - de 10 pessoas - seguiu pela trilha atento aos arenitos e às indicações. “Percebem um rosto ali?”, “aquela é a cabeça de um índio”, explicava a guia Franciele Costa. Atualmente o Núcleo de Guias e Turismo de Ponta Grossa (NGTUR) é o responsável pelos guias de turismo que acompanham o passeio dentro do Parque Vila Velha. O NGTUR é autônomo, vinculado à Associação Comercial, Industrial e Empresarial de Ponta Grossa (ACIPG). Em março, estes passeios guiados pelo Núcleo aconteciam apenas durante as segundas, quartas e quintas-feiras. Desde setembro de 2017, o NGTUR, em parceria com a Associação Brasileira de Guias de Turismo (ABGTUR), passou a atender também durante os finais de semana. Não há um contrato entre a entidade e o Instituto Ambiental do Paraná (IAP), que administra o Parque, trata-se de uma autorização de um ano, mas que mediante pedido de uma das partes pode ser finalizado a qualquer momento.
Desing: Aline Cristina
NEM SÓ DE ARENITOS O PARQUE É COMPOSTO
Antes do NGTUR ser responsável pela gestão dos guias do Parque Estadual de Vila Velha, a contratação destes profissionais era feita pela Paraná Projetos, antiga EcoParaná. Entre os anos de 2012 e 2016, através de um processo seletivo foram contratados nove guias de turismo para o período de cinco anos com renovação anual. Nessa seleção havia 13 vagas, mas nem todas foram preenchidas, porque os candidatos deveriam estar de acordo com as exigências do contrato. Quase no final do contrato, o Parque Estadual de Vila Velha precisou regularizar o número de guias por conta de problemas com o Ministério Público.
Nem todos os guias permaneceram até o final do contrato, uma vez que houve dois casos de demissão e outros de desistências. Leandro Leal e Ana Emília Barbisan trabalharam no Parque durante essa época e contaram para nossa equipe de reportagem os vários problemas da gestão. “Era um conflito constante. Não faziam jus com o estabelecido em nosso contrato de trabalho. Nosso foco era interpretação da paisagem, mas para eles só deveríamos falar dos desenhos nas rochas”, revela Leandro Leal.
Foto: Angelo Rocha
Os guias sentiam falta de conversar com os visitantes sobre o significado de unidade de conservação explicando o que uma legislação ambiental prevê. Já que segundo o Plano de Manejo de Vila Velha, a área precisa ser viabilizada para pesquisa, educação e uso científico. Isso inclui falar de recursos hídricos, flora, fauna, áreas degradadas, geologia, paleontologia, entre outros temas que envolvem a situação, história e contexto do Parque.
Para Leal, os gestores da unidade achavam que eles apenas queriam vender um discurso político, mas na verdade prezavam pela conscientização dos turistas. “Nós não trabalhamos para o Beto Richa, estávamos ali para interpretar todo contexto da unidade, o que inclui expor também os problemas do Parque”, ressalta. Devido essa pressão da gestão do parque, Leal e Barbisan revelam que não podiam falar do museu que estava fechado, da igreja que não podia receber visita, da poluição e desmatamento do parque, da falta de profissionais especializados na Paraná Projetos, da presença excessiva de cargos comissionados e da falta de recursos para realização de atividades de recreação e educação ambiental no Parque Estadual de Vila Velha.
No final de 2013, os guias de turismo fizeram uma greve por conta de atraso de salário dos funcionários. Depois disso, os conflitos no Parque aumentaram. Para Ana Barbisan, dentro do próprio grupo de condutores havia uma divisão entre os que obedeciam a gestão e os que defendiam estar certos e amparados pela legislação. “Nós queríamos fazer os turistas refletirem sobre questões ambientais e explicar a situação política do Parque”, aponta.
O Parque Estadual de Vila Velha é considerado um laboratório a céu aberto que abriga arenitos, furnas, Lagoa Dourada, museu, igreja, além de espécies de fauna e flora espalhados pelos seus 18 quilômetros quadrados. Tombado como patrimônio histórico e cultural do estado do Paraná, a unidade de conservação é uma das maiores da região que contém monumentos naturais de diversas eras. Leal ressalta que o Parque é também uma beleza cênica, mas não dá para reduzir a história da área apenas a imagens de animais.Uma das críticas dos guias de turismo refere-se ao modo como a gestão do Parque enxerga o local. “A verdade é que imaginam o Parque apenas como um produto de venda para o turista e não como uma unidade de conservação. Um exemplo disso seria que, apesar da Presidente de Associação de Moradores de Vila Velha, Fernanda Hauer, afirmar que existe um envolvimento dos moradores no local, a preocupação com a comunidade ao redor do Parque não existia”, denuncia Leal.
Ao acessar a página do Facebook do Parque Estadual de Vila Velha, nota-se que muitos turistas acabam reclamando da situação da estrutura do local. O guia de turismo Leandro Leal afirma que o Parque está longe de ser um modelo de unidade de conservação. “Parecia que o parque estando com a grama cortada e tendo papel no banheiro já era suficiente. Isso é o mínimo do mínimo”, alega.
Os guias do Parque Estadual de Vila Velha precisam necessariamente estar vinculados ao NGTUR ou ABGTUR para atuarem no Parque. Todo dinheiro recebido pelos guias é direcionado para o Núcleo que fica responsável pela divisão deste, entre os funcionários. “O guia precisa ser associado destas duas empresas e passar ainda por um treinamento. Não adianta ter curso técnico de guia ou ser algum especialista, se não for associado não pode atuar dentro do Parque”, enfatiza Murici Francisco Leal, representante do NGTUR.
Muitos dos guias que trabalham com o turismo, organizam viagens e trajetos autônomos voltados a interesses de grupos específicos. Yuri Vergani já trabalha de guia no Parque e conta as dificuldades que encontra para acessar a unidade atualmente. “Não quis me filiar ao NGTUR, pois acredito que como ele está vinculado à ACIPG possui um viés político que não concordo. Por conta disso, não posso atuar no parque, mesmo tendo experiência na área”, afirma. Ao entrar em contato com da ACIPG, a assessoria de imprensa explicou que o NGTUR “é um núcleo setorial da ACIPG. Existe uma relação que não é política, mas que todos os núcleos têm”, afirma.
Em Ponta Grossa, um curso técnico em guia de turismo prepara os interessados em trabalhar na área. O curso possui disciplinas específicas na área de conservação e meio ambiente. Com duração de 3 semestres, não há uma orientação específica voltada ao Parque Vila Velha. “Nós possuímos apenas visitas técnicas agendadas, algumas aulas práticas lá, sempre orientadas por um guia do próprio Parque”, explica a coordenadora do curso técnico, Silvana Kloster.
A equipe de reportagem entrou em contato com o IAP e não obteve o posicionamento da gestão sobre a política atual do Parque até o fechamento desta matéria.