Um terço do PIB do Paraná e do Brasil, gerados pela agricultura, dependem de fertilizantes vindos principalmente da Rússia

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Foto: Yuri A.F. Marcinik

Desde 24 de fevereiro, quando tropas russas invadiram a Ucrânia, organizações ocidentais impuseram severas sanções econômicas ao país governado por Vladmir Putin. Um dos principais setores afetados é o de exportação de fertilizantes agrícolas.

Atualmente, segundo o Sindicato Nacional da Indústria de Matérias-Primas para Fertilizantes (Sinprifert), 85% desse produto consumido no Brasil, é importado, sendo 23% diretamente negociado com a Rússia. Por isso, os embargos impactam diretamente na produção agrícola nacional, que segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), compõem 27,4% da economia brasileira.
Esse número sobe para 33,9% no Paraná. Via assessoria de imprensa, o diretor-presidente da Portos do Paraná, Luiz Fernando Garcia, comunicou que os portos de Paranaguá e Antonina são as principais portas de entrada para os fertilizantes importados.

Garcia também comenta que o país possui um estoque de quase três milhões de toneladas de nitrogênio, fósforo e potássio-NPK, matéria prima dos fertilizantes. Essa quantidade, importada no início deste ano da Bielorrússia, é suficiente para três meses de atividade agrícola no país.

Contudo, o professor da UEPG, Renato Alves, economista especializado em agronegócio, alerta sobre as consequências da possível extensão do conflito. “O Brasil pode ficar refém de países produtores, como Canadá e Irã, que reajustaram seus valores contratuais e, assim, gerar uma grande crise interna de insegurança alimentar”.

 

Dependência antiga

A dependência brasileira da importação de fertilizantes tem 26 anos. Segundo o Siniprifert, de 1996 a 2021, a importação de NPK estrangeiro foi de 25% para 85%, subindo em média 2,4% ao ano.

Nos últimos anos, essa dependência foi acentuada por políticas de desestruturação da produção e regulação de NPK nacionais, como o fechamento da Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados do Paraná (Fafen) de Araucária, em 2020. O controle de companhias estrangeiras – principalmente ligadas aos russos - do mercado nacional de fertilizantes, agravou a situação.

Entre elas figuram entidades como a Eurocheim Group, Acrom e PhosAgro - todas com acionistas nas listas de embargos econômicos da União Europeia, EUA e Reino Unido. A PhosAgro possuía como acionista majoritário o oligarca russo Andrey Guryev, presidente do Conselho Empresarial Rússia-Brasil, que renunciou ao cargo. Uma semana antes da invasão russa à Ucrânia, ele foi condecorado com a medalha da Ordem do Rio Branco pelo presidente Jair Bolsonaro em evento em Moscou.

Sobre essa priorização da importação dos fertilizantes, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, declarou em 2019 que essa estratégia era mais econômica em relação à produção. Para o professor Renato Alves, a situação de dependência do Brasil tem contornos mais delicados que envolvem não apenas as políticas econômicas do atual governo e dos anteriores, mas também questões ambientais.

Segundo Alves, os 15% dos fertilizantes fabricados no país eram produzidos pela Unidade de Fertilizantes Nitrogenados da Petrobrás, no estado do Sergipe. Contudo, com a falta de incentivos e de estrutura adequada, o preço alto dificultava a concorrência no mercado. “Os custos elevados impedem o fertilizante de ser competitivo quando se compara à produção de países como Rússia, China, Canadá e Irã, os quais produzem gás natural, que dilui os custos de produção dos fertilizantes”.

Mesmo com o prosseguimento do conflito na Ucrânia, o Governo Federal está negociando a venda da Unidade de Fertilizantes Nitrogenados da Petrobrás com o grupo Acron. A transação foi anunciada pela própria ministra da Agricultura no dia 4 de fevereiro.

De acordo com o professor Renato Alves, além da falta de estrutura, os locais onde há concentração de compostos úteis para a produção de fertilizantes são legalmente inacessíveis. “O Brasil não possui capacidade de instalações para produzir NPK e questões legais impedem a extração dos compostos, concentrados em reservas indígenas e de proteção ambiental”.

 

Impactos locais

Com a suspensão de importação de fertilizantes vindos da Rússia e a renegociação com outros países para suprir a falta causada pelo conflito, os principais afetados são os pequenos produtores. Dependentes dos processados de NPK disponíveis no comércio varejista, eles temem a alta do preço a longo prazo em decorrência do possível prolongamento do conflito no leste europeu.

“Com certeza o preço desses insumos irá se elevar, e, além disso, não terá para todos os produtores, já que as empresas nacionais de produção foram fechadas nos últimos dois anos”, aponta Célio Rodrigues, integrante do Pré-Assentamento Emiliano Zapata de Ponta Grossa, cuja a fonte de renda vem diretamente da agricultura familiar dos produtores.

Segundo ele, como alternativa aos fertilizantes convencionais, as famílias do Pré-Assentamento pretendem utilizar opções agroecológicas. “As famílias que optam por processos agroecológicos irão usar adubos orgânicos para substituir os químicos”.

A crise atual, na opinião do professor Renato Alves, pode alertar para os benefícios de métodos agroecológicos como medidas de prevenção contra fatalidades que impactem a cadeia produtiva. “Assim como a adoção de técnicas de agricultura orgânica, tem a alternativa das agroflorestas. É vantajosa, já que dispensa a necessidade de reposição de fertilizantes, pois a própria floresta é capaz de produzir o fertilizante com o ciclo de plantas com raízes micorrizas, que são capazes de absorver o nitrogênio da atmosfera”, explica.

 

Ficha técnica:

Repórter & Publicação: Yuri A.F. Marcinik 

Edição: Marcos Zibordi

Supervisão de produção: Rafael Kondlatsch

Supervisção de publicação: Marcos Zibordi e Maurício Liesen