Trabalho doméstico é fonte de renda para pessoas que não têm outras oportunidades

 

“Faz vinte anos que eu tenho esta profissão e posso dizer que não é fácil. O trabalho é exaustivo e algumas vezes precisei lidar com indiferenças e humilhações de quem me contratava.” Este é o relato de Márcia Carine, que começou a trabalhar como diarista aos 22 anos de idade para conseguir criar sua filha pequena.

Devido à grande demanda de serviços domésticos que precisava realizar em uma casa de família e por estar sempre em contato com produtos químicos de limpeza, Márcia sofreu com problemas de saúde. Após exames, foi diagnosticada com febre reumática e realizou tratamento para conseguir amenizar suas dores e sintomas. "Fiquei seis meses fazendo o tratamento e não parei de trabalhar. Eu ia trabalhar mesmo com dor. Como eu era diarista, eu não podia me encostar.", desabafa Márcia. Hoje, ela intercala seu trabalho de diária em uma clínica, com atendimentos em seu salão de beleza.

Com uma experiência semelhante de sobrecarga no trabalho aos 18 anos, Débora, nome fictício da mulher entrevistada pela reportagem, fazia faxina em casas de famílias. Havia um acordo: a diarista faria os trabalhos de casa de segunda a sexta e em troca, os patrões não lhe dariam salário, mas pagariam seu curso técnico em enfermagem. “Como desde pequena eu não tive muita oportunidade fácil de estudo, quando eles falaram que pagariam meu tão sonhado curso, meus olhos encheram de lágrimas.” relata. A rotina de trabalho de Débora se assemelha ao trabalho escravo, considerado crime no Brasil desde uma lei federal aprovada em 2003.


Ela conseguiu finalizar o curso e atualmente trabalha em uma Unidade Básica de Saúde (UBS). Mesmo em um trabalho não remunerado, Débora tem um sentimento de gratidão aos patrões, pois acreditava receber grande ajuda, mas depois que saiu do emprego, o sentimento mudou. “Meses depois que me formei, eu descobri que a mensalidade do curso era só R$422. Me senti explorada e desvalorizada.” desabafa.

Assim como Débora, muitas jovens encontram oportunidade na profissão. A diarista Rahyssa Rontani tem 18 anos e trabalha na área há dois anos. Devido à pandemia, ela começou a trabalhar como faxineira, mas as demandas eram baixas em função da inexperiência e da crise sanitária. Hoje, Rahyssa relata uma rotina que a sobrecarrega, porém é sua única fonte de renda desde que deixou de ser vendedora. “Limpo duas casas por dia, uma pela manhã e uma pela tarde. Sempre que possível também trabalho em empresas, em casas de show e faço faxinas de fim de obra”, destaca.


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Trabalho diário de limpar casas é pesado e maçante. Foto: Kathleen Schenberger


A realidade da falta de oportunidades não permite que essas mulheres optem por fazerem o que realmente querem. Oportunidades de estudo e trabalho não são oferecidas a todas. Por isso, a preocupação de se sustentar e uma crise mundial foram fatores que contribuíram para que Rahyssa recorresse a essa profissão. Em situação de informalidade, é recorrente que muitos empregadores não cumpram com suas responsabilidades e até desrespeitem as profissionais.


Mesmo sendo muito nova, Rahyssa já se deparou com algumas implicâncias por parte dos patrões. Embora não tenha vivenciado nenhuma situação de desrespeito, ela frisa que a maior dificuldade enfrentada diariamente são as exigências inalcançáveis. “É complicado atender clientes que procuram a perfeição, nem sempre é possível atender às expectativas. Às vezes uma colher fora do lugar já é o suficiente para reclamações ou falarem que fez mal feito”, conta.


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Limpezas incluem faxinar a casa, polir móveis, e em alguns casos, até passar roupa e cozinhar. Foto: Maria Eduarda Ribeiro


Em Ponta Grossa, esses relatos não são isolados, pois é comum ver mulheres trabalhando como diaristas. Esse trabalho é visto como um subemprego, sendo uma das poucas opções àquelas que não tiveram oportunidades. E ainda assim, cada vez mais jovens procuram trabalhar com faxina. Apesar de ser um recurso, esse trabalho nem sempre tem os direitos assegurados e muitas permanecem na profissão por falta de outra opção de emprego. “O trabalho de diarista não é uma segurança de receber o salário no final do mês, não temos direito a férias, se trabalha muito, mas não se pode reclamar também, no momento é a única fonte de renda”, explica Márcia Carine de Oliveira.


Outro problema é o salário. A remuneração obtida pela pessoa subocupada, em relação a um trabalhador formal, é inferior muitas das vezes, em relação a mesma quantidade de horas trabalhadas. A Lei Complementar 150, conhecida como “PEC das Domésticas”, garante carteira de trabalho assinada e salário mensal caso a empregada trabalhe por mais de três dias na casa do empregador. Porém, muitos contratantes não cumprem com a legislação, “Trabalhei alguns anos na mesma casa de quatro a cinco dias na semana. Quando entrou essa lei diminuíram os dias que eu trabalhava e precisei pegar outras casas para limpar para complementar minha renda no final do mês”, conta Márcia.

 

Ficha técnica:
Reportagem: Kathleen Schenberger e Maria Eduarda Ribeiro
Edição e publicação: Vinicius Sampaio
Supervisão de produção: Muriel E. P. Amaral
Supervisão de publicação: Marcos Zibordi e Maurício Liesen