Ocupação Erickson John Duarte enfrenta problemas como a falta de acesso a rede de esgoto e a proliferação de doenças na região

Ponta Grossa ocupa a 11ª colocação dos municípios que possuem o melhor saneamento básico do país, segundo dados do Ranking de Saneamento Básico em 2023 feito pelo Instituto Trata Brasil. O levantamento considera apenas as 100 maiores cidades brasileiras e analisa indicadores do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS). Apesar da classificação positiva, algumas regiões vulneráveis da cidade, como a Ocupação Erickson John Duarte, tem passando por problemas como a falta de acesso a rede de esgoto, e a proliferação  de doenças na região. Atualmente em Ponta Grossa 7 mil famílias moram em ocupações localizadas em vales.

Foto: Leonardo DuarteAlgumas ruas de terra se encontram com o esgoto escorrendo entre as casas | Foto: Leonardo Duarte

O relatório indica que Ponta Grossa possui 99% de atendimento total de água e de esgoto, mas que apenas 88,2% do esgoto é tratado em relação ao consumo de água. A Presidente Executiva Instituto Trata Brasil, Luana Preto, detalha como é feito esse levantamento. “Nós compilamos esses dados no que se refere a percentual da população com acesso a água, a coleta e tratamento de esgoto e ponderamos também o quanto tem sido investido em saneamento básico, então categorizamos esses dados e avaliamos”, explica.

Os dados apresentados na pesquisa, entretanto, não contemplam o cotidiano de Rosa Alves* (nome fictício a fim de preservar a identidade da fonte), que mora há quase dois anos na ocupação Erickson John Duarte afirma que a água encanada vem de forma irregular da operadora Sanepar, que trabalha com a rede de saneamento básico no município.Na ocupação a dona de casa Rosa abre a torneira de sua cozinha e também possui água encanada, mas a diferença é que para ela ter acesso a esse direito básico foi necessário fazer uma ligação clandestina na rede de água. 

Na ocupação, algumas ruas de terra se encontram com o esgoto escorrendo entre as casas devido a falta de acesso a rede de esgoto, situação que causa mau cheiro próximo às casas. As redes irregulares de encanamento de água também estão visíveis. Há pontos que o cano estourado se mistura com a lama onde as crianças brincam, em outros pontos o encanamento fica sobre o esgoto contaminando a água potável.

Para a maioria dos moradores do local a água irregular vem da rua Osmário Gonçalves onde há rede de saneamento básico. Na residência de Mariana Ferreira*, todo o esgoto do banheiro e da cozinha vai para a fossa. "Todo o esgoto é despejado na fossa nos fundos de casa. É o que temos por enquanto, a rede de esgoto vai até a avenida ali para cima. Toda casa deveria ter sua fossa, mas nem todas têm", relata Mariana. Atualmente 154.098 unidades são atendidas pela Sanepar, de acordo com os dados de 2021 do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social, das quais 142.956 são residências. Já o atendimento de esgoto é um pouco menor, são 139.230, sendo destas 129.345 residências.

 

A relação entre doenças de veiculação hídrica e a falta de saneamento básico

Na ocupação Erickson John Duarte, no Parque das Andorinhas, as viroses, doença que seria eventual se tornar frequente. Longe de somente ter acesso a água e esgoto, a falta de saneamento básico envolve saúde pública, moradia e planejamento urbano.

O cotidiano das pessoas excluídas do acesso a água e rede de esgoto faz com que surjam as doenças de veiculação hídrica, situação que ocorre com Mariana. “É normal que a gente ou as crianças peguem uma virose ou outra. A gente tem bastante problema com mosquito por causa das fossas”, comenta.

As doenças de veiculação hídrica são o contato com microrganismos, bactérias, fungos e vírus presentes na água e esgoto não tratado. As principais doenças que acometem as pessoas são: giardíase, amebíase, febre tifóide, cólera, hepatites infecciosas, dengue, leptospirose e outros. Os principais sintomas são a diarréia, vômito, mal estar generalizada no corpo, dores de cabeça, febre e se não for tratado pode gerar desidratação no corpo.

O tratamento para essas doenças costumam ser simples e de fácil acesso, como explica Adriana Cristina Chaves Karau, enfermeira da Unidade de Saúde Básica Antero de Machado de Mello, que atende os moradores da ocupação. "Nós mesmos tratamos esses pacientes com a medicação correta, soro, antibióticos e orientamos beber bastante líquido para a hidratação”. Os dados do Painel Saneamento Brasil indicam que entre os anos de 2011 a 2021 Ponta Grossa teve despesas com internações por doenças de veiculação hídrica estimadas em R$55 milhões. Ainda de acordo com o Data SUS em 2021 o município registrou 27 internações.

05 foto leonardo duarteA falta de saneamento básico envolve saúde pública, moradia e planejamento urbano | Foto: Leonardo Duarte

A falta de planejamento urbano e sua relação histórica em Ponta Grossa

Para além das cidades, as regiões rurais dos municípios também possuem dificuldade de acesso ao sistema de saneamento devido à distância dos aglomerados urbanos. Nessas residências é comum haver fossas para o despejo do esgoto acarretando em problemas ambientais. “Isso acaba contaminando tanto plantações quanto nascentes de águas que geralmente são nascentes de rios que futuramente vai servir para captação de água dos municípios”, explica Luana.

As moradias em situação irregular são desassistidas de infraestrutura básica. Em um levantamento realizado em 2021 pela extinta Companhia de Habitação de Ponta Grossa (Prolar) mostrou que aproximadamente 7 mil famílias moram em ocupações localizadas em vales, próximos a córregos e no final de loteamentos, todos espalhados por diversos bairros do município.

A falta de planejamento urbano em Ponta Grossa é algo enfrentado há mais de 40 anos. Ainda nos anos de 1980, Claudete Delabona, coordenadora da antiga ocupação Delabona e ex-vereadora do município relata como eram as moradias irregulares da época. “Todo o entorno do arroio da Souza Naves não existia encanamento de esgoto, existia arroio alí. Em Ponta Grossa não existe desabamento de casas, existem alagamentos, porque as pessoas moram dentro de arroios”, aponta.

Em 2022, Ponta Grossa registrou mais de 17 mil famílias na fila de espera por moradia popular, segundo a prefeitura. Enquanto o processo de planejamento urbano para moradias persiste estagnado no município e os investimentos em saneamento básico estão centralizados para pessoas que já possuem esse direito, Rosa Alves segue esperando possuir o direito ao acesso à água e esgoto. “Ia ser bom, ia ser uma melhoria, uma higiene a mais com água e esgoto, sem precisar estar escorrendo sujeira por aí, só que na realidade a gente vai ficar aí esperando”.

 

Ficha técnica:

Reportagem: Leonardo Duarte

Edição: Pamela Tischer e Vittória Mulfait 

Publicação: Pamela Tischer

Supervisão de produção: Manoel Moabis Pereira dos Anjos

Supervisão de publicação:  Marizandra Rutilli