Tutora tinha 380 gatos, e mesmo após o resgate, alguns ainda econtram dificuldades para socializar

Em fevereiro de 2020, o Grupo de Auxílio aos Resgatinhos (GAR) participou do resgate de aproximadamente 380 gatos que residiam na casa de uma acumuladora no bairro Contorno, em Ponta Grossa.

Os moradores da região denunciaram à Polícia ambiental a presença de cheiro forte na vizinhança vindo da casa da acumuladora. Chegando lá, a equipe da policia encontrou os animais vivendo em condições precárias. Parte deles estava presa em caixas, quartos e banheiros, sem acesso a água ou luz do sol. Em um abrigo de 9 m², localizado aos fundos da casa, estavam mais de 50 gatos. Muitos deles estavam desnutridos e apresentavam problemas graves de saúde.

Cerca de 40 gatos foram encaminhados para o abrigo do GAR. Devido a grande repercussão do caso na cidade, muitos dos animais foram adotados logo nos meses seguintes ao resgate, após serem castrados e tratados. Contudo, alguns deles residem até hoje no abrigo, principalmente, por terem desenvolvido traumas psicológicos no período em que estavam na casa da tutora.

Isabele Futerko, presidente do GAR, comenta sobre ‘Café’, um gato de aproximadamente 6 anos de idade que apresenta dificuldades para socializar com humanos. “Quando ele chegou para nós, ele era completamente selvagem e muito arisco, não tinha como manejar e não deixava pegar”, afirma. Hoje Café aceita carinho, mas ainda é desconfiado e costuma manter distância dos voluntários do GAR e visitas.

 

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Café durante consulta ao veterinário | Foto por: Isabele Futerko

De acordo com Isabele, Café praticamente não tinha contato com humanos o que o deixou pouco acostumado com a presença de pessoas, porém ele ficava na companhia de outros gatos. Um deles era Felix Felpudo, que foi adotado por Beatriz Mayer em 2020. “No início ele era bem medroso. Precisamos ter muita paciência para lidar porque ele quase não comia, ficava se escondendo e não queria interagir com os outros gatos que eu tinha. Mas ele foi se adaptando e ficou mais confiante. Hoje ele é amigável com pessoas e outros animais, mas ainda fica um pouco arisco”, explica Beatriz ao falar de Felix.

Apesar de Café e Felix não terem sofrido agressões físicas, o trauma gerado pela situação em que se encontravam afetou diretamente a forma com que se relacionavam com seres humanos. Segundo a pesquisa ‘’ A acumulação de animais e a formação de veterinários’’, de Paula Tavolaro e Tamara Leite Cortez, o fenômeno da acumulação ainda é mal compreendido tanto por autoridades quanto pela sociedade no geral, e pode causar mais sofrimento, morte de animais e lesões do que atos intencionalmente cruéis. 

Segundo Patrick Passos, biólogo comportamentalista felino que atua como terapeuta e consultor de comportamento de gatos em uma clínica de Ponta Grossa, os traumas são experiências que podem ficar marcadas por muito tempo no emocional dos animais, podendo afetar o comportamento e a forma com que se relacionam com o mundo. “O trauma é muito diferente do medo. O medo é um estado de alerta que é ativado de uma forma praticamente instantânea para alertar sobre algum perigo, e já o trauma é como se fosse uma marca profunda, que deve ser tratada a longo prazo para restaurar o equilíbrio emocional do animal”, afirma. 

De acordo com Patrick, lidar com traumas exige paciência por parte do tutor, que deve estar preparado para avanços e possíveis regressões. Ele explica que alguns dos pontos mais importantes durante o processo são: ter empatia pelo animal; não forçá-lo a interações desconfortáveis; orientar visitas que devem ser respeitosas com o animal; e, por fim, associar situações de estresse a situações positivas. “Aos poucos o animal vai entender que ele está seguro. Muitas vezes os tutores se frustam ao longo do processo, desistem e doam o animal, mas é importante entender que o tempo deles é diferente do nosso e que a confiança vai surgindo de forma gradual”, conclui.

 

Ficha Técnica:

Produção: Ana Carolina Barbato

Edição e publicação: Quiara Camargo

Supervisão de produção: Luiza C. Dos Santos

Supervisão de publicação: Luiza C. dos Santos, Marizandra Rutilli e Maria Eduarda Ribeiro