Além de prejuízos financeiros, os jogos de azar causam conflitos familiares
O número de apostadores em jogos de azar superou o de investidores no último ano. Segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), o percentual da população que aposta ficou em 14%, enquanto o de investidores em ações atingiu a marca de 2%. Entre os jogos de azar mais populares está o jogo do “Tigrinho” e casas de apostas esportivas conhecidas como “bets”, que se refere a uma aposta feita em relação ao resultado incerto de um evento, como esportes e jogos de cassino.
O número de apostadores é 7x maior que o de investidores no Brasil, segundo a Anbima | Infográfico: Annelise dos Santos
As apostas esportivas já são regulamentadas no Brasil, enquanto as plataformas de jogos são ilegais. A regulamentação aconteceu em 2023, com a justificativa da então Ministra do Esporte Ana Moser, de que assim iriam coibir a manipulação de resultados e preservar a integridade esportiva. Entretanto, inúmeras pessoas relatam as perdas e vícios com as apostas em jogos. A popularização do jogo do Tigrinho e bets se dá pela ilusão de fácil obtenção de lucro. Os investimentos seguros necessitam de conhecimento, o que não é necessário nos jogos de azar.
Em Ponta Grossa, poucas escolas atuam com disciplinas de educação financeira , o que facilita a disseminação das apostas no município.Viviane Schovartez é apostadora no jogo do Tigrinho e conta que perdeu R$500 somente em uma jogada: “O jogo é imprevisível, eu jogava direto e ficava neurótica. Queria jogar mais e mais. Se eu tivesse conhecimento de educação financeira, evitaria muita coisa”. Viviane relata sua experiência e afirma que o jogo tem seus ganhos, mas as perdas são maiores. Além do fato de ser viciante, quanto mais ela ganhava, mais ela queria jogar: “Se você ganha, você quer mais. Aí já era”.
Vício
A psicóloga Suellen Ramos fala sobre a predisposição ao vício, como principal efeito negativo dos jogos de azar. O apostador pode desenvolver ansiedade, depressão, isolamento, mas principalmente a dependência com os jogos, causando o mesmo efeito que as drogas causam no cérebro. Além disso, os conflitos familiares estão presentes: “A pessoa para de se socializar. Vai ter problemas com a família e rompimento de relações. O motivo financeiro pode causar problemas com os cônjuges no momento que o dinheiro investido em aposta faltará para as necessidades básicas da casa”, explica complementa.
Ramon Santos percebeu que estava viciado nas apostas esportivas quando tinha um ganho e apostava novamente. Depois disso, apostava mais uma vez e perdia todo o valor. O primeiro contato do jogador com as bets aconteceu por rede social, com a divulgação feita por muitos influenciadores digitais e até mesmo jogadores de times de futebol. Atualmente, inúmeros times da série A do Brasileirão são patrocinados por casas de apostas esportivas, com suas logos estampadas em camisetas de time e nos painéis de publicidade de estádios de futebol. “A divulgação deve ser proibida, os influencers divulgam ganhos que não são reais, assim influenciando as pessoas a perderem dinheiro”, afirma Santos.
O apostador conta que não sabe dizer o valor perdido em apostas que eram feitas por análise dos jogos, mas que em uma única perdeu R$1000 de uma vez só e a motivação era ganhar cada vez mais dinheiro. “A regulamentação é um assunto a ser debatido, pois muitas pessoas estão ficando endividadas por conta desses jogos”, complementa.
Em comentários no TikTok, pessoas relatam suas perdas com os jogos de apostas | Infográfico: Annelise dos Santos
Visão econômica
Segundo o economista José Renato Olszewski, as apostas em jogos de azar representam um desperdício de renda, isso porque parte dela será transferida para uma perspectiva muito baixa de ganho, o que gera até mesmo insatisfação familiar e desconforto com as pessoas que vivem na mesma casa. “O jogo de azar é uma sensação de bem-estar de curtíssimo prazo. A partir do momento que você transfere renda para uma situação que não te trará conforto, você deixa de investir na educação, saúde, bem-estar e qualificação”, afirma Olszewski. Na opinião do economista, essas jogadas levam ao empobrecimento a médio e longo prazo. As apostas em jogos de azar não sofrem qualquer tipo de obstáculo. Conforme o economista, o acesso é muito fácil já que a aposta pode ser feita em qualquer lugar e a qualquer momento, levando ao vício.
Ainda na visão de Olszewski, o investimento seguro precisa de conhecimento e disciplina, como na poupança que o retorno financeiro só é visto com um determinado tempo. Para famílias de baixa renda, outras formas de investimentos não estão ao alcance, a não ser a caderneta de poupança, o que não é lucrativo em curto prazo. Além disso, a facilidade de acesso aos jogos de azar, que podem ser realizados em casa, é muito maior do que ir até os bancos físicos para realizar as aplicações financeiras.
Ficha técnica:
Produção: Annelise dos Santos
Edição e publicação: Lucas Veloso e Radmila Baranoski
Supervisão de produção: Carlos Alberto de Souza
Supervisão de publicação: Cândida de Oliveira e Kevin Furtado