Os principais sintomas da síndrome estão relacionados à apatia e desmotivação no ambiente de trabalho
Nos últimos anos, a Síndrome de Burnout, caracterizada por um estado de exaustão extrema associada ao estresse prolongado,tem atingido níveis alarmantes, não apenas em ambientes de trabalho, mas também entre estudantes. A combinação de sobrecarga de tarefas, metas irreais e um cenário global de incertezas contribuem para o crescimento exponencial da síndrome, que agora é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e foi incluída na 11ª Revisão de Classificação Internacional de Doenças (CID-11) como um fenômeno ocupacional.
Infográfico: Laura Urbano
Segundo levantamento do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), em 2019 foram registrados 178 casos de afastamento de trabalhadores em decorrência da Síndrome de Burnout. Já em 2023, o INSS indicou que 421 pessoas foram afastadas das suas atividades laborais pela mesma razão. Estes números indicam o aumento de 136% no índice de licença do trabalho após o diagnóstico da síndrome. O índice de 2023, até o momento, representa o maior número de afastamentos registrados no Brasil nos últimos dez anos.
Especialistas em saúde mental alertam que os sinais de Burnout costumam aparecer de forma sutil, mas tendem a se agravar com o tempo se não forem tratados. Muitas pessoas, devido à incerteza sobre os sintomas ou até mesmo a falta de conhecimento sobre o assunto, não procuram ajuda médica.
Letícia Hinsching, de 20 anos, é estudante e conta que enfrentou a síndrome no início da graduação. “Por muito tempo, meu corpo deu sinais de cansaço, dores de cabeça, febres sem explicação, emagrecimento, estresse e esquecimento e eu não dei atenção”. Ela explica que conseguiu, aos poucos, retomar as atividades rotineiras em um ritmo mais saudável. “Precisei dar um passo atrás, procurar terapia e reaprender a cuidar de mim. Entendi que a saúde mental é algo que não podemos deixar de lado, por mais que a pressão seja grande”, relata.
Diagnóstico e tratamento de Burnout
A psicóloga Aryane Wosniak, especialista em psicologia clínica e organizacional, explica parte do processo de diagnóstico e principais sintomas. "O burnout, ou síndrome do esgotamento profissional, foi classificado pela OMS como esgotamento fruto do estresse crônico no local de trabalho que não foi gerenciado com êxito. Podem ser percebidos sintomas como: exaustão emocional e física, dores no corpo, alienação em relação às atividades ligadas ao trabalho e desempenho reduzido".
Ela ressalta que o tratamento inclui uma combinação de estratégias, que variam de acordo com o grau de comprometimento do paciente. "A primeira coisa é procurar um profissional capacitado para o tratamento que pode incluir psicoterapia e/ou medicação. Bem como desenvolver estratégias de gerenciamento de estresse, higiene e rotina do sono, realizar atividades físicas, lazer e tempo de qualidade com família e amigos". Wosniak também aponta que, além da individualização do tratamento, a conscientização sobre os fatores de risco nas empresas e escolas é essencial para prevenir novos casos.
Formulário aponta dados alarmante sobre Burnout
Para compreender a incidência da Síndrome de Burnout em Ponta Grossa e região, foi realizada uma pesquisa via formulário nas redes sociais que contou com 104 respostas de trabalhadores e estudantes. Os dados revelam que 99% dos participantes afirmam já ter percebido sintomas de burnout, como exaustão extrema e falta de motivação. Entre esses, 56,6% relataram que ainda não reconhecem os sintomas como Síndrome de Burnout e 21,2% demoraram mais de três meses para reconhecerem a possibilidade de estarem com a doença.
Como forma de minimizar os impactos da doença, 30% das pessoas mudaram a rotina de trabalho/estudos e 27% buscaram ajuda médica e psicológica. Uma pessoa registrou que foi demitida logo depois do diagnóstico. O advogado Renato Michelon, especialista em direito trabalhista, explica a inconstitucionalidade da demissão em casos como esses. “O funcionário diagnosticado tem a garantia da estabilidade no emprego, de no mínimo 12 meses, após o retorno ao trabalho, conforme o artigo 118 da Lei nº 8.213/91. Isso significa que ele não pode ser dispensado sem justa causa durante esse período”. Michelon também explica que se a doença não for ocupacional, o trabalhador não tem estabilidade garantida após o retorno ao trabalho.
O formulário mostrou que a maioria dos respondentes registraram exaustão física e mental (84%), dificuldade de concentração (76%) e sentimento de incompetência (72%).
Infográfico: Laura Urbano
O que as empresas estão fazendo para contornar a doença
Diante do aumento dos casos de burnout entre trabalhadores de diferentes setores, algumas empresas têm adotado estratégias para amenizar o impacto da síndrome e criar ambientes mais saudáveis. Em empresas da região, ações focadas em saúde mental estão sendo implementadas, com ênfase em programas de apoio psicológico, estratégias de relaxamento e flexibilização nos horários de trabalho. No entanto, os resultados ainda variam e dependem da postura adotada pela organização e da prioridade dada à qualidade de vida dos funcionários.
De acordo com Daniel Rodrigues, gestor de equipe em uma empresa multinacional instalada em Ponta Grossa, as mudanças começaram a partir do reconhecimento da gravidade da situação. “Nós, gestores, falamos com periodicidade mensal nas reuniões de entrada de turno sobre saúde mental, de forma que o funcionário se sinta motivado a buscar auxílio profissional caso ele esteja passando por algum problema”. A partir do questionário online, pôde ser percebido que em 48 casos a empresa não tomou nenhuma providência para apoiar trabalhadores com Burnout ou nunca abordou o assunto, 16 indicaram flexibilização no ambiente e na carga de trabalho e seis ofereceram suporte psicológico.
O gestor explica que a multinacional onde atua tem investido em programas de bem-estar para os funcionários, com objetivo de reduzir a incidência do esgotamento. Entre as iniciativas, a empresa oferece day off para descanso, incentiva passeios e atividades de lazer com as famílias, além de disponibilizar playlists de música de relaxamento para criar um ambiente mais leve e agradável no trabalho. “Essas ações são parte de um esforço maior para melhorar a qualidade de vida no dia a dia, e permitem que os funcionários tenham momentos de descontração e equilíbrio entre a vida pessoal e profissional”, conclui.
Direitos das pessoas diagnosticados com Burnout
Uma pesquisa realizada pela Associação Nacional de Medicina do Trabalho (Anamt), indica que cerca de 30% dos trabalhadores brasileiros sofrem com a Síndrome de Burnout.
Segundo Michelon, é fundamental que a pessoa conheça seus direitos e as responsabilidades do empregador em garantir um ambiente de trabalho saudável. "A CLT tem um conjunto de normas que impõe ao empregador a obrigação de garantir ambiente de trabalho seguro e saudável para seus funcionários. Isso inclui monitoramento de riscos psicossociais. Segundo a NR-17 (que trata da ergonomia), as empresas devem adotar medidas que garantam condições adequadas de trabalho, tanto físicas quanto psicológicas, incluindo o controle de fatores que possam causar estresse excessivo, fadiga e problemas de saúde mental".
Ficha técnica
Produção: Laura Urbano
Edição e publicação: Ana Beatriz de Paiva, Loren Leuch e Radmila Baranoski
Supervisão de produção: Carlos Alberto de Souza
Supervisão de publicação: Aline Rosso e Kevin Furtado