A possibilidade de implementação da Emenda Constitucional (EC) nº 93 de 8 de setembro de 2016 ameaça a gestão das universidades estaduais do Paraná, que já sofrem com cortes orçamentários nos últimos anos. A alteração autoriza a transferência, para os cofres do governo, de 30% dos recursos próprios de órgão, fundo ou despesa. O Portal Periódico investigou os impactos dessa medida para a gestão da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG).
A prestação de contas de 2017 da UEPG mostra que, entre recursos do tesouro (R$ 251.302.200,78), próprios (R$ 11.412.884,65) e de convênios (R$14.702.786.14), foram gastos R$ 277.417.871,57, ou seja, 99% do orçamento previsto, que era de R$ 280.364.011. Na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2018, foram autorizados R$ 291.797.299, entre as três categorias: tesouro (R$ 241.047.299), recursos próprios (R$ 15.600.000) e convênios (R$ 35.150.000).
Os recursos próprios vêm de diversas fontes de receita, como a arrecadação da taxa de vestibular, restaurante universitário, aluguéis de seus espaços, produção vegetal e animal e patrocínio da Caixa. Há ainda os recursos de convênios estaduais e federais de instituições, como os estabelecidos com a Fundação Araucária e com a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), agências dos governos estadual e federal que financiam a pesquisa e extensão na Universidade.
No ano passado, foram captados R$10,6 milhões de recursos próprios pela UEPG, com uma média mensal de R$ 883 mil. Em uma conta básica, 30% desse total corresponderiam a R$ 3.181.395,30.
Os vestibulares (R$ 3.269.483,92) e o Processo Seletivo Seriado (PSS) (R$ 1.019.463) representaram, em 2017, à primeira e à terceira maiores fontes de receita, respectivamente. A segunda fonte foi obtida pela produção vegetal e animal da Fazenda Escola Capão da Onça (R$ 1.125.841,85), onde se realizam pesquisas do curso de Agronomia. Juntas, as três fontes somam cerca de 50% dos recursos próprios.
Se consideradas as origens dos recursos próprios, as áreas de Saúde e de Agronomia sofreriam sensível impacto com a Emenda Constitucional 93. Além da Fazenda Escola, que abastece o Restaurante Universitário, a Farmácia Escola (R$ 376.549,90) e as Clínicas Integradas de Odontologia (R$123.082,96), que oferecem serviços à comunidade e representam espaços de vivência profissional dos alunos da universidade, estiveram, em 2017, entre as fontes de receita que se destacaram.
No ano passado, foram captados R$ 18.904.477 de recursos próprios pelo Hospital Universitário (HU). Em uma conta básica, 30% desse total corresponderiam a R$ 5.671.343. Vale lembrar que laboratórios da Medicina são beneficiados por recursos próprios do HU.
No demonstrativo de receitas e de despesas referentes aos recursos próprios no último ano, tal como descrito na prestação de contas de 2017 da UEPG, percebe-se que a despesa (R$ 11.412.884,65) foi maior que a receita gerada (R$ 10.604.651,42) no ano. Entretanto, a diferença foi suprida pelo superávit (R$ 832.438,61) do ano anterior.
Orçamento é apertado
O reitor Miguel Sanches Neto, que assumiu a gestão da UEPG em agosto passado, diz que, em anos anteriores, o confisco acabou não acontecendo para universidades e hospitais universitários. A questão ainda permanece em aberto, dependendo de um acordo entre as instituições universitárias e o Governo Estadual. Sanches Neto afirma que, ainda neste ano, ele irá, com representantes de outras reitorias, pressionar o governo para excluir as Instituições de Ensino Superior (IES) dessa medida.
O pró-reitor de Assuntos Administrativos da gestão passada da UEPG, Amaury dos Martyres, ressalta que a totalidade dos recursos próprios ajuda a manter o ensino, pesquisa e extensão. Os recursos próprios resultam da receita gerada pelas atividades internas da Universidade.
Mesmo se o confisco de parte dos recursos próprios não for efetivado, cortes orçamentários na UEPG já existem. Em entrevista aos alunos do curso de Jornalismo, o ex-reitor Carlos Luciano Vargas, destacou a redução de 30% da verba de custeio em 2016. A verba de custeio é aplicada em despesas com contratos de prestação de serviços, aquisição de materiais de consumo, diárias, passagens, bolsas e benefícios aos estudantes.
Se considerados a prestação de contas de 2014 a 2017 e o orçamento de 2018 da UEPG, é possível perceber que o confisco de 30% dos recursos próprios comprometeria mais a gestão. Nesse período, o menor percentual de orçamento utilizado foi 91,88%, em 2014, e, numa marcha crescente, o percentual chegou a 99%, em 2017.
Emenda do confisco vigora até 2023
A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 4 de 2015 deu origem à Emenda Constitucional 93, que modificou o artigo 76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). Em caráter provisório, a ATDC complementa a Constituição Federal.
A alteração do artigo 76 entrou em vigor em 1º de janeiro de 2016 e prorroga até 31 de dezembro de 2023 a vigência da Desvinculação de Receitas da União (DRU) e estabelece a desvinculação de receitas dos estados, Distrito Federal e municípios. Isso quer dizer que, até o final do ano de 2023, 30% da arrecadação da União relativa às contribuições sociais podem ser captadas pelo Estado.
No Estado do Paraná, a desvinculação está prevista pelo Decreto 5158, de 27 de setembro de 2016, que regulamenta o artigo 76 da EC 93. Esses 30% são repassados para o Tesouro Geral do Estado e essa transferência é regulada pela Secretaria de Estado da Fazenda.
Segundo o site do Senado, a Desvinculação de Receitas da União (DRU) pode ser usada livremente nas áreas de “educação, saúde e previdência social em qualquer despesa considerada prioritária e na formação de superávit primário”. Além disso, a desvinculação “também possibilita o manejo de recursos para o pagamento de juros da dívida pública”.