Praticante de skate arrisca manobra na pista improvisada do Parque Ambiental. De cimento e com obstáculos, a antiga área destinada a roller e patins agora é o principal local de skate street da cidade
Atualmente, a pista do Parque Ambiental é a mais frequentada da cidade (Foto: Vitor Carvalho)

Quem vê a principal pista de skate, localizada no Parque Ambiental, não consegue imaginar que o esporte tem longa história na cidade. O estilo urbano, que marca a tendência mais atual, de longe se parece com a prática do final dos anos 1970, quando o skate encontrou seus primeiros seguidores na cidade.

Se os pioneiros se lançavam em pistas cujo traçado permitia um movimento que imitava o surfar sobre as rodas, os praticantes de hoje usam espaços planos. Na pista improvisada, ao lado do Terminal Central, corrimões e caixotes fazem parte do cenário do skate em sua versão street.

No começo, Ponta Grossa contava apenas com rampas inspiradas em piscinas vazias, prática que marcou a modalidade quando ela foi criada nos Estados Unidos. Na década de 1990, a geração, que cresceu vendo os pioneiros do skate, migrou para as pistas particulares. De estilo livre e com preços baixos para andar o dia todo, os novos espaços ganharam força. Campeonatos nacionais eram sediados na cidade trazendo renomados atletas profissionais. Era o auge.

O estilo mais atual dos skatistas reflete nas lojas ligadas a artigos da modalidade.  Ao todo, existem dez estabelecimentos comerciais voltados ao esporte. Mas os eventos, que eram regulares nos anos 1990, hoje tornaram-se escassos. De acordo com Fábio Ignácio, o ‘Crowd’, dono de duas lojas na cidade, a falta do diálogo entre os lojistas impede uma maior regularidade dos campeonatos.

Quando os eventos acontecem, eles visam um estilo que está incorporado por quase todo skatista da nova geração. As pistas ‘street’, uma forma mais urbana de praticar os esportes, combinam obstáculos e caixotes. Segundo Fábio, eventos street movimentam o mercado atual.

Para ‘Crowd’, o skate continua forte. No entanto, ele reconhece que antigamente os praticantes eram mais fiéis. “Eu acho que o skate nunca parou. Antes eram menos skatistas, mas era mais concentrado, verdadeiro. Hoje existem 100, mas nem todos levam a sério o skate. Antigamente era mais forte, pois era fiel”, avalia.

Fábio enxerga o skate como uma arte que não depende somente de campeonatos para sobreviver.  A aposta dele é na estratégia de englobar tudo o que é relacionado ao estilo de vida. “A gente abrange o skate por geral, por meio da arte, cultura, foto e vídeo. Hoje em dia há menos campeonatos, mas tem muito mais visibilidade”, enfatiza.

 

Pista improvisada no Parque Ambiental

Após a demolição da pista de skate no bairro Olarias, em meados dos anos 2000, os skatistas buscaram alternativas centrais para a prática. No Parque Ambiental, um espaço cercado era usado para patinação, mas pouco frequentado. O local acabou atraindo o público interessado pelo skate urbano que ganhava força na cidade, mas se encontrava sem um espaço com estrutura adequada.

“A gente começou com falta de espaço. Não tínhamos uma pista central de street. E, então, começamos a fazer uns obstáculos [no Parque Ambiental] com caixotes e com barras de ferro”, conta ‘Crowd’, que acabou assumindo a frente do movimento responsável por reformar a pista.
    
Houve três reformas na pista improvisada do Ambiental. Nenhuma delas, no entanto, teve a participação do poder público. ‘Crowd’ foi o responsável por arrecadar o dinheiro e cuidar da manutenção do local.

Em duas das reformas, os próprios skatistas “colocaram a mão na massa”, lembra o skatista Fábio Ignácio, o ‘Crowd’, que há 20 anos trabalha com a modalidade. Em 2010, na revitalização do parque promovida pela prefeitura, os skatistas foram consultados sobre o projeto e suas reinvindicações resultaram apenas em um piso novo.

Na cidade, existem quatro pistas. A do Ambiental, improvisada pelos skatistas, foi a primeira. Em seguida, vieram as pistas do Rio Verde, no bairro Neves, e do Santa Paula, ambas construídas em 2010 com verba do Governo Federal destinada a esportes radicais nos municípios.

Mais recentemente, o Centro de Artes e Esportes Unificados (CEU) da Vila Coronel Cláudio, no bairro Uvaranas, recebeu uma pequena pista de skate. Em abril deste ano, o local completou um ano de funcionamento. Presidente da Associação dos Sktistas de Ponta Grossa, James Robson, conhecido como ‘Sádico’, ressalta que, nos bairros, o perfil dos skatistas é diferente do Ambiental devido às rampas que fogem ao estilo urbano.

 

 

 

 Novas pistas

Duas pistas serão construídas em Ponta Grossa. A construção de uma delas estava prevista no projeto do Lago de Olarias (obra em andamento desde o fim de 2014), mas ela acabou sendo realocada. Por um pedido dos próprios skatistas da região central da cidade, as duas pistas serão instaladas em um terreno próximo ao Complexo Esportivo Arena Ponta Grossa.

De acordo com o presidente da Fundação Municipal de Esportes, Leopoldo Guimarães, o novo projeto inclui as duas praças de skate dentro de uma pista de atletismo. Segundo o presidente, o local já possui arquibancada. Além disso, com as duas pistas, uma ao lado da outra, acredita-se que mais pessoas poderiam utilizariam o espaço.

As obras fazem parte do projeto ‘Parque Central’, que integrará o trecho entre a Estação Saudade e a Biblioteca Pública Municipal. Uma das pistas já foi aprovada pela prefeitura A proposta inicial era a construção de cinco campos de futebol society e a pista de skate. Os campos já foram entregues, mas a verba restante para o término das obras ainda não foi liberada pelo Governo estadual.

Cada pista possui um estilo próprio, diz Leopoldo. Uma delas atenderá o estilo urbano, semelhante à pista do Parque Ambiental. Já a segunda, que ainda não foi aprovada, será composta por rampas, o que facilita a realização de campeonatos.

 

 

Cerca de 30 skatistas presentes para o Campeonato de Roller Show
Skatistas reunidos para o Campeonato Roller Show, em 1990, durante o auge do skate na cidade (Foto de arquivo cedida por Fabiano Moura)

 

O começo da prática em Ponta Grossa

Surfar no asfalto. Na Califórnia (EUA), as pranchas mudaram de local. Com rodas e nas ruas entorno do litoral de Santa Mônica, o estilo “dogtown” chamava a atenção. Foi a partir da expansão dessa prática pelo mundo afora que o skate, tido como arte para alguns e esporte para outros, chegou a Ponta Grossa, nos anos 1970.

Do mar para uma piscina vazia. Posteriormente, as primeiras pistas começaram a ser construídas. No Parque Monteiro Lobato, bairro Jardim Carvalho, um pequeno espaço de cimento foi palco da primeira pista de skate em Ponta Grossa. Inaugurado no meio de uma propriedade, em 1978, hoje o local está abandonado.

A paisagem natural deu conta de escondê-la. De longe, é praticamente impossível avistar um chão de concreto no meio da vegetação, composta por árvores que acabam escondendo a pista. Se hoje a pista do Monteiro não existe mais, ao menos ela influenciou a construção de outra, já na década seguinte.

 

 

Pista de cimento no meio de uma propriedade particular no bairro Jardim Carvalho. Cercada da vegetação da região dos Campos Gerais, praticamente não é vista de longe
Primeira pista de skate da cidade, localizada no Parque Monteiro Lobato (Foto: Fabrício Corrêa)

 

Sob o governo do antigo prefeito de Ponta Grossa, Otto Cunha (1983-1987), a pista do ‘Banks’ ficava em uma área mais central. O nome veio da semelhança com piscinas vazias, o que caracterizava as pistas de skate dos anos 1970, nos EUA. Localizada no bairro Olarias, próximo ao Terminal Central, ela foi o principal ponto encontro dos skatistas da década.

No entanto, o projeto só foi possível graças à ação de um amante do esporte. Fabricio Corrêa, naquela época um adolescente, colheu assinaturas através de um abaixo-assinado que reivindicou a construção da pista.

“Articulei umas assinaturas e minha mãe entregou ao então prefeito Otto Cunha. Coincidência ou não, ele fez uma pista em Ponta Grossa”, conta Fabricio, que hoje é jornalista, mas naquela época se dividia entre as paixões pelas ondas com o surf e com as rodinhas do skate.

‘Bicudo’, como o jornalista é conhecido no meio dos skatistas, começou a andar com a prancha de rodas no começo dos anos 1980. A influência veio da geração pioneira da cidade.

Fabrício já surfava na Praia de Leste, litoral do Paraná, quando conheceu o skate. Para ele, o novo esporte era uma alternativa. “Na verdade, o skate era só uma curtição para mim. Era mais para matar a vontade quando estava longe do mar”, explica.

 

 

Homem faz manobra no ar com seu skate. Ao fundo, a antiga pista do 'Banks'
Antiga pista do ‘Banks’, localizada próximo à Biblioteca Pública Municipal, no bairro Olarias (Foto: Arquivo Pessoal do Fábio ‘Bicudo’

 

A pista do Banks foi a mais utilizada na cidade, diz ‘Sádico’.Em uma fase anterior ao auge do skate na cidade, a maioria dos praticantes procurava a pista. Entretanto, nos anos 2000, o local foi transformado.

No segundo mandato do governo do prefeito Pedro Wosgrau (2005-2012), a pista foi demolida para a construção do Centro Esportivo para Pessoas com Deficiência ‘Jamal Farjallah Bazzi’, inaugurado em 2009.

Um espaço para a prática de skate foi encontrado no Centro da cidade, o Parque Ambiental. Por iniciativa de quem já se dedicava ao esporte, o local destinado à prática de patins e roller foi apropriado pelos skatistas da região.

Ao lado da entrada dos ônibus da VCG no Terminal Central, com vista para o maior Shopping Center da cidade e em frente à Maria Fumaça, a pista - em formato street, sem rampas e com obstáculos baixos - entrou no mapa de quem possuía skate em Ponta Grossa.

 

Era do Skate Park

Na década de 1990, eclodiu a onda das pistas particulares de skate. Donos de lojas de artigos para skate, que detinham terrenos grandes e eram favoráveis à construção de pistas, começaram a explorar o novo nicho de mercado.

Naquela época, pagava-se um valor simbólico, conta  ‘Sádico’. “A gente pagava R$ 5 para andar o dia todo”. Os locais sobreviviam graças a eventos e acordos entre as lojas.

A cidade era referência nacional no skate e skatistas profissionais passaram por aqui. Até mesmo campeonatos, que reuniram praticantes de todo o país, foram organizados por pessoas da cidade.

O Campeonato Profissional Brasileiro de Skate, que era o torneio mais famoso, infelizmente, acabou não acontecendo em Ponta Grossa. O Centro de Eventos, local mais apropriado para a realização do evento, não foi liberado. O campeonato, por esse motivo, foi transferido para Londrina, lembra Sádico.

Em 1994, Ponta Grossa tornou-se a primeira cidade do Brasil a ter uma pista fechada, chamada de Skate Park Indoor. O local, que hoje não existe mais, ficava na entrada do Monteiro Lobato, em frente à Marmoraria São Tomé.

 

 

Homem prepara o piso de um galpão para o torneio de skate
Preparativos para o Campeonato Profissional Brasileiro de Skate, em 1997. O evento foi organização por skatistas ponta-grossenses, mas aconteceu em Londrina. (Foto: Arquivo Pessoal do ‘Sadico’)

 

 

 

Esporte mal visto

O movimento de 40 anos sofreu resistência da sociedade até boa parte dos primeiros anos do século XXI. Nas ruas, os skatistas andavam sempre em ‘bandos’, justamente para evitar a retaliação.

Na década de 80, eram comuns expulsão de locais, batidas de Polícia e até mesmo repressão por simplesmente andar na rua com o skate. Fábio lembra que mesmo praticar o esporte em paisagens urbanas e levar um amigo para fotografar skatistas eram motivos para ser repreendido.

César Augusto, o ‘Cesinha’, também se lembra da época em que o skate era visto com maus olhos. Em meados dos anos 2000, segundo o skatista, “cinco ou seis gerais da Polícia aconteciam”. Até mesmo a presença de usuários de crack, no Ambiental, era associada aos skatistas.

“Era mais difícil ser skatista. Hoje você não vê a galera andar na rua, os caras andam na rua com o skate embaixo do braço, pra eles skatista é ser isso. Qualquer um pode virar skatista, ele vai à loja, entra normal e sai skatista”, critica ‘Sádico’, ao descrever os praticantes atuais.

Para ‘Sádico’, a sociedade tratava o skate como uma prática de bandido. Segundo ele, as pessoas tinham medo de se aproximar dos skatistas por eles andarem sempre em grandes grupos. “Hoje é bonito, a mãe até leva o filho na loja de skate. Antigamente, o filho escondia o skate e a mãe jogava fora quando achava”, recorda.

 

 

 

 

 

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