Reforma tramita no Congresso em duas PECs

“É um erro grotesco e amador acreditar que a solução para o país é criar mais impostos, sem reduzir os inchaços da máquina e os crescentes gastos públicos” | Foto: Agência Brasil

Tramita no Congresso Nacional duas Propostas de Emenda à Constituição (PECs) sobre o sistema tributário no Brasil. No Senado encontra-se a proposta (PEC 110/2019), que tem como base o texto do ex-deputado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB), que propõe a unificação de nove tributos federais, estaduais e municipais. Já a PEC 45/2019, em tramitação na Câmara Federal, baseia-se no texto do economista Bernard Appy e do deputado Baleia Rossi (MDB), que pretende a unificação de sete tributos, já aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

Nas duas PECs em tramitação, está a modificação do Imposto de Renda de empresas e pessoas físicas, que prevê a criação de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) ou Impostos sobre Bens e Serviços (IBS). A proposta viria como substitutivo dos sete impostos: Programa de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/PASEP), Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), uma parcela do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) além do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) dos Estados e os Impostos sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) municipais. O novo imposto seria administrado por um comitê gestor formado pela União, Estados e Municípios, conforme previsto no texto original da proposta aprovado na CCJ da Câmara Federal.

Porém, as medidas de simplificação e a criação de um imposto único têm recebido críticas pelo temor da criação de uma nova Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), extinta em 2007. Para o economista Leandro Batistta Camargo, a criação de uma nova CPMF será um equívoco. “É um erro grotesco e amador acreditar que a solução para o país é criar mais impostos, sem reduzir os inchaços da máquina e os crescentes gastos públicos”, diz Camargo.

Para o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Sandro Silva, as propostas para reforma tributária acabam focando na simplificação dos impostos. “O objetivo dessas propostas é a simplificação que não é o principal problema. Além dessa questão, tem o fato do governo centralizar a receita. Uma grande parte da arrecadação tributária do país acaba sendo da esfera federal, onde ele tem que repassar partes para os estados e municípios”, afirma Silva.

Segundo o contador Jair Gordia, da maneira como está sendo debatida a reforma tributária ela apenas visa reduzir a carga de impostos, o que está errado. “Isso pode reduzir o custo burocrático na apuração e recolhimento dos tributos, além do aumento da produtividade e do PIB potencial brasileiro, porém, não traz uma solução para todos os problemas tributários”, explica Gordia.

Para a advogada da Comissão Tributária da OAB - Ponta Grossa, Bianca Karla Wiecheteck Alves, propostas como a reforma tributária exigem um grande esforço político por alterarem a competências de tributos estaduais e municipais, pois podem trazer riscos para a autonomia das instâncias. “O melhor seria uma reforma tributarista apenas infraconstitucional, com alterações na legislação nacional, como no Código Tributário Nacional e leis de normas gerais dos impostos, pois alterações na legislação poderiam conferir maior segurança jurídica ao processo administrativo e judicial na esfera tributária”, afirma Alves.

Camargo explica que a reforma pode reduzir a sonegação, implicando em uma melhor distribuição de renda. Ele enfatiza que, se a reforma tributária não for elencada entre as prioridades de governo, a proposta não vai prosperar. “Toda vez que se vai discutir reforma tributária, a classe que acha que vai perder algum benefício imediato reage. Ninguém consegue enxergar o processo como um todo, pois o modelo atual está implicando enormes dificuldades para o crescimento econômico no país,” enfatiza o economista.

Pesquisa de 2017 do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), ligado ao Ministério da Economia, indica que o “Brasil possui umas das piores legislações tributárias do mundo”. Segundo a pesquisa, apenas 0,30% da população detém 45% do PIB nacional em patrimônio. O País ainda possui uma das taxas tributárias mais elevadas, a carga tributária brasileira chega a 30% do PIB e o número de impostos pagos pela população chega a mais de 60%.

Reforma Tributaria Solidária

O economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) explica que está em andamento no Congresso Nacional a proposta de Reforma Tributária Solidária, proposta defendida pela Associação Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Anfip), a Federação Nacional do Fisco (Fenafisco), a Frente Parlamentar Mista em Defesa da Previdência Social e Centrais Sindicais, tendo como objetivo um sistema tributário mais progressivo e democrático para cobranças de impostos.

Para o economista Sandro Silva, a questão solidária da reforma é seguir a lógica da cobrança de impostos. “Essa medida seria cobrar mais de pessoas que têm uma situação melhor, para que a situação de quem ganha menos melhore e possa movimentar a economia de forma correta, se tributaria mais na renda e na propriedade, reduzindo a tributação sobre o consumo e a produção, levando um aumento do poder aquisitivo da população”.

Silva explica que o sistema tributário atual necessita de mudanças, pois gera muita deformação na renda da população. “Uma pessoa que ganha um salário mínimo paga o mesmo imposto sobre o arroz, feijão, carne e a conta de luz do que uma pessoa que ganha 10 salários mínimos. Isso acaba gerando uma distorção. É visto muito nos repasses indiretos que estão embutidos nos preços dos produtos e serviços que, independente da renda da pessoa, acaba pagando o mesmo valor em impostos”, comenta.

Segundo o economista, atualmente mais de um terço das contas de luz e água é referente ao ICMS. No caso de redução desse imposto, as pessoas teriam mais dinheiro disponível para gastar e, assim, girar a economia mais rapidamente. “Um outro ponto é a questão da produção. Se você tributar menos produtos e mais a renda, vai abaixar a produção e terá um efeito positivo na redução dos preços. Consequentemente, as pessoas vão consumir mais. Basicamente, a proposta da Reforma Tributária Solidária pretende reduzir a tributação dos mais pobres e aumentar a renda disponível, diminuindo a desigualdade”, defende o economista.

 

Ficha técnica:

Reportagem: Alexander Marques
Foto: Agência Brasil
Supervisores: Angela Aguiar, Fernanda Cavassana, Ben-Hur Demeneck, Rafael Kondlatsch
Edição: Natália Barbosa