Falta de discussão em políticas afirmativas aumenta a desigualdade racial, aponta membros de movimentos raciais
O Brasil é reconhecido um dos países mais desiguais do planeta, e uma das dimensões dessa desigualdade é racial, através da falta de oportunidades de estudo, trabalho, alimento, moradia e saneamento básico, perante a população negra. O reflexo desse contraste pode ser visto nas eleições municipais de Ponta Grossa, onde dos cinco candidatos que disputam o pleito à Prefeitura, Professora Elizabeth (PSD), Professor Edson (PT), Professor Gadini (PSOL), Mabel Canto (PSC), Marcio Pauliki (Solidariedade). Nenhum deles discute propostas voltadas especialmente a população negra em seus planos de governo. Uma ampla comunidade que representa 20% dos habitantes pontagrossenses, segundo o último censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010.
No Paraná, segundo estimativas do IBGE, em 2018, 34% da população era negra. Contudo, o estado é o que apresenta o maior número de casos de injúria racial, conforme o anuário divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), onde mostra que entre os anos de 2017 e 2018, o estado registrou um total de 2.528 casos, uma média de 3,46 ocorrências diárias. Outros dados expõem o aumento de homicídios (mortes por agressão), contra a população negra no Paraná. Conforme dados do Sistema de Informações sobre mortalidade do Ministério da Saúde, de 2014 a 2018, houve um aumento de 5,33% dos casos de homicídios contra negros no Estado.
Os números pioram quando se analisa os homicídios cometidos contra mulheres negras no Paraná. Segundo o levantamento do Atlas da Violência, feito pelo FBSP em 2018, o número de homicídios contra mulheres negras, no período de 2017 a 2018, teve um aumento de 90,9%. Em 2017 ocorreram 33 homicídios contra mulheres negras, já em 2018, este número subiu para 63. No mesmo período, o número de homicídios cometidos contra mulheres não negras, teve uma queda de 29,5%. Foram cometidos 207 assassinados em 2017, caindo em 2018 para 146. Com esses índices, o Paraná se coloca na primeira posição, no aumento de casos de homicídios cometidos contra mulheres negras no país.
No Brasil, esta desigualdade racial trazida pela falta de politicas públicas é revelada também na questão trabalhista, onde segundo o IBGE, no segundo trimestre de 2020, os primeiros meses da pandemia do Covid-19, a taxa de desemprego entre negros no país ficou 71% maior do que entre a população branca.
Para o fundador e coordenador do Centro Cultural Humaitá, Adegmar da Silva, a falta de políticas públicas e a desigualdade racial mostrada nos indicadores sociais, apenas confirma o abismo que se encontra a população negra no Brasil. “Vivemos um desmonte, em todas os mecanismos de apoio e suporte a população negra por parte do Estado e da elite branca que está no poder. Várias medidas e propostas que poderiam ser implementadas não são debatidas, pois não é agradável, que tais movimentos e grupos ocupem espaço no poder, o prejuízo que ocasiona são os dados das pesquisas”, explica Silva.
O ex-presidente e atual secretário-geral do Instituto Sorriso Negro dos Campos Gerais, José Luiz Teixeira, comenta que esta ausência de proposta para a diminuição da desigualdade racial em Ponta Grossa, acaba não trazendo justiça a comunidade negra. “Os candidatos não têm interesse na população negra, portanto não haverá justiça em um país onde a maioria dos setores da sociedade são homens brancos e ricos, onde não exista um debate voltado ao interesse da maioria da população brasileira, que é formado pela população negra”, diz Teixeira.
Outro fator que acompanha esta falta de discussão, sobre politicas públicas para a comunidade negra, é a questão trabalhista que se entrelaça mutualmente com a renda entre brancos e negros no país, onde segundo dados do IBGE, de 2018, a população branca ganhava, em média 73,9%, a mais do que a população negra no Brasil.
Para a professora de economia da Universidade Estadual de Ponta Grossa, Augusta Raiher, que pesquisa a renda média entre a população branca e negra, a desigualdade na arrecadação é um processo histórico que foi construída no país. “A distribuição das riquezas sempre beneficiou a população branca. As oportunidades de qualificação sempre foram direcionadas à população branca, intensificando o círculo vicioso da pobreza na população negra e condenando as futuras gerações a cenários similares”, enfatiza Raiher.
A discussão sobre políticas públicas de igualdade racial ainda é escasso não só em Ponta Grossa, mas também em vários municípios no Paraná, onde apenas as cidades de Curitiba e Pontal do Paraná, aderiram ao Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (SINAPIR). Para o jornalista Nilson de Paula Júnior, o tradicionalismo é o grande impasse para um debate mais aprofundado. “No Paraná o conservadorismo é muito forte. Ele impera em várias cidades, agindo não apenas em negros, mas também em outros setores de minoria social. Com isso, o poder público tenta omitir a existência do racismo no estado e, como consequência, o debate pelo poder público não acontece”, diz o jornalista.
“O Paraná é o estado com maior população negra da Região Sul, mas o que vemos é um poder público que tenta a todo momento invisibilizar esta população e omitir a existência de um racismo e desigualdade entre negros e brancos na sociedade, um fator que vem acompanhado da não realização de politicas públicas específicas a comunidade negra”, comenta Adegmar da Silva.
Ficha técnica:
Repórter: Alex Marques
Edição: Teodoro Anjos
Supervisão: professores das disciplinas de Textos III e NRI II