Nova alterações na lei de Registros Públicos possibilita processo mais rápido e sem constrangimento

 

Segundo o dicionário, o termo ‘nome’ é uma palavra que designa uma pessoa. A definição é simples, mas o peso de um nome pode ser muito grande. Muitos brasileiros mostram rejeição ao nome ou ao sobrenome e sentem a necessidade de fazer alterações para reforçar sua identidade. No Brasil, a possibilidade de mudar o nome não é algo novo, porém, o processo enfrentado era longo e em muitos casos, até constrangedor. 

Em julho de 2022, instituiu-se alterações na Lei de Registros Públicos (14.382/2022). As modificações realizadas facilitam o processo para troca de nome. Anteriormente, após atingir a maioridade, a pessoa tinha um prazo de um ano para fazer a mudança e precisava justificar os motivos. Com a nova lei, as alterações podem ser feitas a qualquer momento e sem a necessidade de justificativas. Contudo, para evitar fraudes, o processo poderá ser feito apenas uma vez. 

A lei também contempla alterações de nome para pessoas trans. Para se adaptar às novidades, cartórios estão passando por treinamentos e adaptações para colocar na prática as novas condutas.

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A mudança feita pela Lei Federal de número 14.382/2022 não requer mais autorizações judiciais/ Foto: Kathleen Schenberger

Inclusão de sobrenomes familiares

Gabriela (nome fictício para preservar a fonte) não possui relações com o pai biológico. Ela conviveu com ele somente até os oito meses de vida. Hoje, com 20 anos, Gabi compreende que seu pai verdadeiro é seu padrasto. Por isso, deu entrada no processo para alterar seu sobrenome e colocar em seus documentos o nome de seu padrasto, que desde pequena a criou cercada de amor, conforto, educação e respeito. “Quando fiquei sabendo das alterações na lei me senti incentivada a incluir o nome do homem que me criou a vida toda. Acredito que é uma forma de agradecer por tudo”, afirma.

 

Inclusão ou exclusão de sobrenome do cônjuge

As mulheres que se casaram e incorporaram o sobrenome dos maridos não precisam conviver mais com o nome de casada. Após 14 anos de matrimônio, a administradora Simone Borges de Campos vivenciou o fim de uma relação difícil. Segundo ela, ao se casar adquiriu o sobrenome do marido por ser uma prática comum na época. “Quando me casei não tinha noção do quanto isso é machista, soa como se a mulher fosse propriedade da família do marido. Hoje questiono: por que as mulheres têm o sobrenome do marido e o marido não tem o da mulher?”, frisa.

  Atualmente, no processo de divórcio, Simone explica que se sente muito mal por ainda ter o sobrenome do ex-marido nos documentos. Ela espera poder usufruir da nova lei para fazer a troca do sobrenome de uma forma mais ágil. A administradora reforça o arrependimento por ter substituído o sobrenome de sua família pelo do ex-marido. “Não vejo a hora de mudar essa situação, é muito importante para mim  ter o nome da minha família de novo e não de uma família a qual não faço mais parte”, destaca. 

 

Mudança de nome e gênero

A nova lei também é um alívio para pessoas trans. Mesmo havendo a possibilidade de mudança de nome autorizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2018, a lei atual deixa o caminho mais viável. O processo, assim como nas outras situações, requeria ação judicial com justificativas para a mudança.  O gestor de tráfego Icaro Rocha é um homem trans que precisou juntar dinheiro para contratar um advogado e enfrentou meses de espera até a finalização do processo. 

Ele relata que, ao entrar em contato com os cartórios, passou por situações de constrangimento para justificar a mudança de nome. “Às vezes, quando entrava em contato com os cartórios não era tratado bem. Os atendentes não entendiam o que eu queria fazer, não sabiam do processo para mudar o gênero ou me questionavam o porquê de querer mudar para um nome tão diferente”. Com as alterações na lei, não será mais necessário informar as motivações. Porém, Rocha espera que os cartórios tenham um treinamento melhor para atender pessoas trans e não constrangê-las. 

Além disso, o gestor se mostra mais esperançoso quanto ao novo processo. Para ele, poder ser chamado pelo nome que se identifica é um passo extremamente importante para a causa de trans, travestis e não-binários. “Eu que consegui acesso jurídico e financeiro de forma mais fácil, já enfrentei meses de espera, imagino que para quem não tem suporte fosse mais demorado. Acredito que o processo pode ser menos complicado para as pessoas mais vulneráveis.” 

Para todos esses casos, a mudança representa não só um nome, mas também um conforto e um bem-estar do indivíduo. A psicóloga Ana Rebeca Benevides explica que o nome dá a uma pessoa o direito de se reconhecer, ter dignidade e ser respeitado por aquilo que é chamado. “Ser chamado que se escolheu dá o sentimento de pertencimento por completo. O nome influencia diretamente na nossa identidade e como nos vemos”, analisa.

 

Ficha técnica:

Reportagem: Kathleen Schenberger e Maria Eduarda Ribeiro

Edição e Publicação: Tamires Limurci dos Santos

Supervisão de produção: Muriel E. P. Amaral

Supervisão de publicação: Marcos Zibordi e Maurício Liesen