Dados indicam ausência do Estado no combate à homofobia

O relatório do Grupo Gay da Bahia mostra que no Brasil, em 2018, ocorreram 320 homicídios de pessoas LGBTs, enquanto que os suicídios foram 100. | Foto: Veridiane Parize

Entre 2015 e 2018, os homicídios de vítimas LGBT+ (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais) aumentaram em 187,5%, no Paraná. As mortes motivadas por homofobia foram de oito, em 2015, para 15, em 2016, chegando a 23 em 2017 e 2018. Os dados são do levantamento do Grupo Gay da Bahia (GGB), com base em notícias publicadas em veículos de comunicação, informações de parentes das vítimas e registros policias.

Os casos levantados pelo GGB são como o de Gaby Sheifer, transexual de 19 anos, atingida por dois disparos e atropelada ao pedir ajuda no trecho da PRC-373 entre Ponta Grossa e Carambeí. Ou como a morte da travesti Scarlety, de 33 anos, em dezembro do ano passado, esfaqueada e espancada no Centro de Londrina por três homens.

À lista do GGB, somam-se Juliana Ferreira, travesti morta em Mandaguaçu no interior do Paraná; Roberta Moraes, morta com disparos de arma de fogo em Maringá; Gabriel Batista de Souza, 21 anos, homossexual morto em Cascavel; José Carlos de Oliveira Mota, 57 anos, homossexual e cabeleireiro morto em Curitiba; Aisha, 26 anos, travesti morta em Curitiba. Os acontecimentos mostram que a população LGBT é alvo de violência no Estado.

O estudante Luciano Rodrigues, 26 anos, conta que já passou por várias situações desconfortáveis por causa de sua orientação sexual, desde xingamentos na rua por estar acompanhado do namorado, até mesmo agressão física saindo de uma festa. “O sentimento de impotência é o pior possível, em saber, que pela minha orientação sexual sou alvo de críticas e violência. Se registro um boletim de ocorrência, aparecerá apenas uma agressão, sem menção à homofobia”, afirma Rodrigues.

O relatório do GGB mostra que no Brasil, em 2018, ocorreram 320 homicídios de pessoas LGBTs, enquanto que os suicídios foram 100. Mesmo havendo uma diminuição no número de mortes referente a 2017, quando foram computadas 445 mortes, recorde desde o início do relatório, o número de vítimas continua alto em comparação ao início da década. Das 130 vítimas registradas em 2000, o número de casos aumentou para 420 em 2018, um crescimento de 223,08%.

O antropólogo e fundador do GGB, Luiz Mott, comenta que o aumento do número de vítimas LGBTs no Brasil se deve à tradição herdada desde os tempos da escravidão no país. “A escravidão fez com que a violência e a tortura fossem naturalizadas na sociedade brasileira, sendo o racismo, o machismo e a homofobia causadas pela mesma matriz histórica. E ainda a tradição religiosa muito forte no Brasil preserva essa intolerância à comunidade LGBT”, explica Mott.

Os dados mostram que, a cada 20 horas, um LGBT é morto ou comete suicídio no Brasil, o que coloca o país como recordista no ranking de países que mais mata LGBTs no mundo. Com relação às causas das mortes, de acordo com o relatório, os crimes são por arma de fogo, representando 29,5% das mortes; 23,6% por arma branca, 5,2% por asfixia, 3,6% espancamento, 2,4% pauladas e 1,4% por apedrejamento. Porém o número de suicídios chega a 23,8%, sendo a segunda maior causa de morte entre LGBTs.

O presidente do Grupo Universitário de Diversidade Sexual e Identidade de Gênero (GUDI) da Universidade Estadual de Ponta Grossa, Brendo Carvalho, explica que a homofobia dentro das universidades também contribui para o aumento do número de vítimas. “Na própria UEPG está presente a LGBTfobia, principalmente em cursos aonde a heterossexualidade é regra, dificultando, às vezes, para uma pessoa LGBT, o bom andamento da sua vida acadêmica,” afirma Carvalho.

Em 23 de maio, o Superior Tribunal Federal (STF) votou, por seis dos onze ministros, pela criminalização da homofobia e transfobia, equiparando-as ao crime de racismo, cuja conduta é inafiançável e com penas que variam de um a cinco anos de reclusão. Porém, a discussão foi suspensa antes da votação de todos os ministros. Em nova votação no dia 13 de junho deste ano, o STF decidiu pela criminalização da homofobia e transfobia, por 8 votos a 3. 

Para a presidente da Comissão da Diversidade Sexual OAB/PG, Thais Boamorte, a população LGBT encontra-se marginalizada judicialmente sem uma legislação penal especifica. “As pessoas LGBTs estão sujeitas a um silenciamento e exclusão, sem contar as diferentes formas de discriminação e preconceitos que sofrem diariamente, tanto no âmbito judiciário e social brasileiro. E com essa aprovação pelo STF, a comunidade terá um resguardo legal, para punir o agente por suas práticas homofóbicas”, diz Boamorte.

Carvalho defende que a criminalização da homofobia é importante, apesar de não ter acontecido nenhum debate aprofundado a respeito na região de Ponta Grossa. “Essa medida paliativa é importante já que os crimes de ódio têm se intensificando no Brasil. Porém, não é saudável para uma democracia que as decisões desse tipo sejam tomadas pelo STF e não pelo Congresso Nacional, que deveria ter pautado esse tema há muitos anos já”, comenta Carvalho.

O promotor de Justiça do Ministério Público do Paraná, Rafael Osvaldo Machado Moura, afirma que várias atividades estão sendo trabalhadas junto com diferentes órgãos no Estado para a diminuição de mortes de LGBTs. “Estamos orientando com cartilhas os juízes, promotores, delegados e policiais, para que possam tratar da melhor forma os casos envolvendo a comunidade LGBT no Estado. Um outra aspecto de combater a homofobia no Paraná tem sido a criação de núcleos voltados a atender e auxiliar a comunidade LGBT”, explica Moura.

A Assessoria de Imprensa da Prefeitura de Ponta Grossa explica que o município trabalha com ações educativas sobre o tema LGBT, dentro de instituições de ensino, escolas e faculdades, através da Fundação Municipal de Assistência Social e também pela Secretaria Municipal de Políticas Públicas Sociais. A Assessoria também destaca a disponibilidade de colocar o nome social no cartão do SUS, por meio da Fundação Municipal Saúde.

Ficha Técnica:
Reportagem: Alesxander Marques
Foto: Veridiane Parize
Edição: Alunos do 2º ano do curso de Jornalismo e Mariana Santos
Supervisão: Professores Angela Aguiar, Ben-Hur Demeneck, Fernanda Cavassana, Hebe Gonçalves e Rafael Kondlatsch