O termo passou a integrar a Classificação Internacional de Doenças em 1948 e foi considerado desvio sexual

 

 

Neste mês de maio, completam 32 anos que a homossexualidade deixou de ser classificada como doença mental pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Esta orientação sexual era vista como transtorno mental pela Classificação Internacional de Doenças (CID), mas no dia 17 de maio de 1990, a OMS a retirou da lista após revisão das doenças no documento. Por conta da medida, a data se tornou o dia internacional contra a homofobia.

 

Cirlene Felde é psicóloga cognitiva comportamental e sexóloga. Ela destaca que a identificação sexual é natural e não pode ser considerada uma doença psicológica. “A homossexualidade é da pessoa, ela cresce, vai se encontrando e durante a adolescência, a pessoa vai se perceber. Às vezes, percebe antes, desde criança mostra sinais”, afirma. Mas, segundo ela, atualmente há pais que ainda levam seus filhos que se identificam homossexuais à terapia.

 

Cirlene afirma que no passado, médicos também viam a homossexualidade como um problema, mas que o cenário mudou ao longo do tempo. “Quando a medicina começou a estudar e entender o processo, foi movida uma luta para envolver a política e também a questão internacional da medicina. Por isso, é algo que dura mais de 30 anos”, aponta.  

 

Para não atribuir qualquer intenção de doença, foi criado o termo homossexualidade. Assim, a palavra homossexualismo foi retirada do vocabulário, pois há diferenças entre as duas palavras na gramática: o sufixo -dade representa modo de ser, comportamento, enquanto o sufixo -ismo, é ligado à ideia de doença ou enfermidade. Por isso, utilizar o termo homossexualismo é pejorativo.

 

Eduardo Barbosa é designer e se considera gay. Ele destaca que além da medida de retirar a homossexualidade da lista, a revisão de vocabulário também auxiliou na luta por direitos iguais. “Ao retirar a palavra homossexualismo do vocabulário também foi um começo para entender que homossexualidade não é uma doença e como forma de expressão, o impacto foi enorme no contexto de vidas LGBTQIA+”, afirma. 

 

Ele complementa que a informação e maior visibilidade à comunidade LGBTQIA+ também são fundamentais para que o preconceito deixe de existir: “É necessário entender que somos normais como qualquer outra pessoa, e nisso eu quero dizer que devemos sim ter cada vez mais conteúdos informativos sobre nós, representatividade e igualdade”, diz.

 

Ficha técnica

Reportagem: Vinicius Sampaio

Edição e publicação: Diego Chila e Heryvelton Martins

Supervisão de produção: Muriel E. P. Amaral

Supervisão de publicação: Marcos Zibordi e Maurício Liesen

98% dos casos contra crianças e adolescentes são praticados por familiares

 

“Tomei a decisão de contar tudo o que eu sofri na infância apenas no começo desse ano quando o meu abusador faleceu. Agora eu tenho paz, porém sinto que contei tarde demais. O meu silêncio não me protegeu durante muito tempo, na verdade só protegia o meu abusador”.
Este é o relato de Laura, nome fictício, que com 10 anos sofreu assédio e abuso sexual pelo seu avô materno. Hoje, aos 22 anos, ela ainda carrega alguns traumas todas as vezes que vai à casa do familiar onde era abusada. Para Laura, falar sobre o assunto nunca foi fácil, e por ser uma criança, faltava coragem para contar aos pais. A fala dela ilustra a necessidade de discutir a violência contra crianças e adolescentes, especialmente neste mês, chamado Maio Laranja, dedicado ao combate do abuso sexual.
Uma outra vítima que também preferiu não ser identificada, sofreu aos oito anos abuso por parte de um primo de segundo grau. “Comecei a me afastar e não queria mais estar reunida com a família, pois sentia que ele tocava demais. Como eu era criança, a reação que tive foi parar de brincar. Ainda hoje, consigo lembrar dos olhares estranhos que ele me dava”.
A situação dessas vítimas não são casos isolados, pois a maioria dos abusos que ocorrem com menores são cometidos por parentes e pessoas próximas da família. “Quase todos os relatos de violência sexual que chegam até nós são praticados por pessoas que as crianças conhecem e que apresentam uma relação de persuasão, podendo intimidá-las, como pai, avô, padastro, irmão, entre outros”, relata a delegada do Núcleo de Proteção Contra Crianças e Adolescentes (Nucria) de Ponta Grossa, Ana Paula Cunha Carvalho.

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Atendimento na VII Semana de Enfrentamento às Violências contra Crianças e Adolescentes. Foto: Maria Eduarda Ribeiro

 

De janeiro até maio deste ano, o Nucria registrou 103 inquéritos envolvendo crianças, sendo um de estupro e 34 de estupro de vulneráveis, que é quando ocorre violência sexual com menores de 14 anos. Esse dado indica possibilidade de aumento, pois representa metade das 205 denúncias de 2021, um mês antes do meio do ano. Os registros chegam até o Núcleo por meio das escolas e hospitais, ao observarem marcas no corpo das crianças. Essas instituições fazem a denúncia pelas famílias e até mesmo pelas próprias vítimas.

 

Perfil
Segundo a delegada, não há um perfil das crianças, uma vez que ela abrange todas as idades e classes sociais. “A violência contra menores é sempre mais fácil de ser praticada. Hoje, posso dizer que a faixa etária que predomina os atendimentos é de quatro a 12 anos”, ressalta.
Para além do abuso e da violência sexual, as crianças também são vítimas de violência física, psicológica e negligência. Segundo os dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), no Paraná, desde o início de 2022, houve mais de 1.780 denúncias de violências contra a criança e o adolescente.
Em Ponta Grossa, 99% dos casos que a Vara da Infância e da Juventude (VIJ) atendeu estiveram voltados à negligência. Até o dia da produção desta matéria, houve aproximadamente 60 crianças sendo atendidas pela Vara, desde recém-nascidos com apenas um mês de vida até adolescentes de 17 anos.
Quando acionada, a VIJ atua na proteção e acolhimento em lares temporários, processos de guardas e para garantir saúde, educação, alimentação e atendimento público. A assistente social da Vara, Karla Beatriz Maia, explica que todos os dias menores são acolhidos. “Nós recebemos, fazemos acompanhamento para promover o bem-estar e saúde da criança e do adolescente e em alguns dias até desacolhemos quando sai a liberação da guarda”, pontua.

 

Movimentações
No município, são poucas as ações feitas para a conscientização da população sobre a violência e abuso infantil. De acordo com Thaize Carolina Rodrigues de Oliveira, coordenadora da Comissão Municipal Intersetorial de Enfrentamento às Violências Contra Crianças e Adolescentes (Ceves), além do mês de maio, apenas no carnaval há maior engajamento nessas movimentações. “Ponta Grossa ainda precisa dar mais visibilidade às ações assim durante o ano inteiro”, destaca.
Para ela, movimentos que pautem a violência infantil são importantes para promover a discussão. “Precisamos falar sempre para que as pessoas saibam que têm violências e saibam para quem recorrer. Se a sociedade não estiver articulada, a criança acaba ficando desprotejida”, pontua.

 

Canais de denúncias em Ponta Grossa
As denúncias podem ser feitas diretamente no Nucria, que é o melhor canal de investigação, mas também há outros canais, como o 181 e o Disque 100, que realizam denúncias anônimas.

 

Ficha técnica:

Repórteres: Ana Luiza Bertelli Dimbarre e Maria Eduarda Ribeiro

Edição e publicação: Janaina Cassol

Supervisão de produção: Muriel  E. P. Amaral

Supervisão de publicação: Marcos Zibordi e Maurício Liesen

Dados mostram que a comunidade transgênero vive à margem da sociedade.

 

A Associação Nacional de Travestis e Transsexuais (ANTRA) registrou 80 assassinatos de pessoas transgênero no primeiro semestre de 2021. No entanto, esse número não consta no censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pois a apuração limita-se ao registro de homicídios divididos entre sexo ou órgão genital.
Entre muitas das estatísticas sociodemográficas presentes na plataforma online do IBGE, nenhuma abrange a comunidade transgênero, como homens e mulheres trans, travestis e pessoas não-binárias. Os seis segmentos presentes no site levam em consideração apenas o sexo ou órgão genital, sem abordar a questão de identidade de gênero.
Para Noah Louise de Souza, pessoa não-binária, a relação entre a exclusão de pessoas trans de estatísticas oficiais e a marginalização dessa população é muito clara. Ela aponta a necessidade de que essa população seja vista pelas instituições de poder: “Já passou da hora de pessoas trans serem incluídas nos censos, porquê nossa comunidade carece de amparo por parte do Estado, e o primeiro passo para que esse amparo possa existir com um grupo tão marginalizado é o recolhimento de dados para entender mais a fundo o problema.”, opina.
Noah acredita que esse problema tem relação direta com a organização capitalista em que o Brasil está inserido. “A exclusão social da comunidade trans é uma consequência que infelizmente a gente já vive e que grande parte dos nossos representantes políticos não estão preocupados em mudar. O que não é de se surpreender, porque a gente vive em sistema que para ter as pessoas no topo, tem que ter as pessoas em baixo.”

 

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Foto: Arquivo Periódico

Estatísticas
Enquanto isso, o Brasil segue sendo o responsável por 40% dos assassinatos de pessoas trans que ocorrem no mundo todo. Segundo o boletim da Associação Nacional de Travestis e Transsexuais (ANTRA) foram mapeadas 33 tentativas de assassinatos, 27 violações de direitos foram denunciadas e 9 casos de suicídios confirmados no primeiro semestre de 2021. Em 2020 o Brasil alcançou a maior taxa de assassinatos dos últimos dez anos. Na área da educação, 70% da comunidade transgênero não concluiu o ensino médio e apenas 0,02% encontram-se no ensino superior.
Foram registrado aproximadamente 14 casos de pessoas trans infectadas pela COVID-19, mas, de acordo com a ANTRA, o número não é preciso, pois as estatísticas seriam ainda maiores se houvesse o cuidado de identificar as pessoas a partir de suas identidades de gênero e não exclusivamente pelo sexo/órgão genital.
O dossiê completo sobre as estatísticas da população transgênero no ano de 2021 será publicado pelo ANTRA em janeiro de 2022. Os censos oficiais de proporção nacional não expressam a possibilidade de reformular o método das próximas apurações.

 

Ficha técnica:
Repórter: Maria Eduarda Kobilarz Silva
Edição e Publicação: Larissa Onorio
Supervisão de Produção: Vinicius Biazotti
Supervisão de Publicação: Marcos Zibordi e Maurício Liesen

Dona de Mim quer ajudar moradoras de Ponta Grossa

 

'Dona de Mim' é um projeto criado em agosto deste ano, mês que representa a conscientização e combate à violência contra a mulher, para oferecer às vítimas de violência doméstica em Ponta Grossa a oportunidade de empreender e gerar renda. Violência doméstica, segundo a Polícia Civil do Paraná, configura-se como qualquer ação que possa causar morte, lesão, sofrimento físico, sexual, psicológico, dano moral ou patrimonial.

O objetivo do projeto é atender especificamente mulheres que foram amparadas por medidas protetivas pela Patrulha Maria da Penha, para que obtenham recursos necessários e alcancem independência financeira. De acordo com a Prefeitura de Ponta Grossa, a Patrulha deve indicar integrantes que  apresentem habilidade ou ideias de negócios a serem desenvolvidas.

A iniciativa conta com quatro encontros semanais, que acontecem presencialmente. Na primeira edição, o grupo reuniu 25 participantes. A primeira turma iniciou o programa com o encontro 'Resgate da essência feminina’, com orientações sobre os métodos contraceptivos. Já nos próximos três encontros o objetivo será orientar sobre como começar a empreender, tendências de mercado e economia criativa.

Ainda conforme a Prefeitura, as novas turmas do projeto 'Dona de Mim' serão organizadas conforme a demanda dos grupos com medidas protetivas que são acompanhadas pela Patrulha Maria da Penha.

De acordo com o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR), entre os meses de janeiro e junho de 2021 foram registrados 21.598 novos casos de violência doméstica no Estado. Foram 94 casos de feminicídio. Em comparação com 2020, foram registrados mais de 40 mil casos de violência doméstica durante o ano.

 

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Foto: Acervo Periódico | Maria Fernanda de Lima

 

Tipos de violências contra a mulher

A Polícia Civil do Paraná determina que violência física é entendida como qualquer conduta que agrida a integridade ou saúde corporal. A violência psicológica pode ser caracterizada como causas de danos emocionais e diminuição da autoestima, o que gera a degradação das ações, comportamentos, crenças e decisões.  Entende-se como violência sexual todo ato que constranja a presenciar, manter ou participar de relações sexuais não desejadas, a partir da intimidação, ameaça, coação ou o uso da força. A violência patrimonial pode ser definida como a retenção, subtração, destruição parcial ou total dos objetos pessoais de outras pessoas. E, por fim, ainda de acordo com a Polícia Civil,  a agressão moral é compreendida como a violência que configura a calúnia, difamação ou injúria.

 

Canais para denúncias

Para denunciar casos de violência doméstica em Ponta Grossa basta entrar em contato com os telefones listados abaixo:

  • Patrulha Maria da Penha: 153 ou (42) 3220-1040 ramal 2105
  • Delegacia da Mulher: (42) 3309-1300
  • Polícia Militar: 190

 

Ficha técnica

Reportagem: Larissa Godoi

Edição e Publicação: Ana Paula Almeida

Supervisão: Profs. Jeferson Bertolini, Marcos Zibordi e Maurício Liesen

Grupo diz que levantamento seria necessário para encaminhar ajuda na pandemia

 

A falta de dados oficiais sobre pessoas LGBTQIA+ em Ponta Grossa dificulta a análise da situação da comunidade na cidade. Dados nacionais do coletivo #VOTELGBT mostram aumento da vulnerabilidade da população LGBTQIA+ no período da pandemia.
De acordo com o coletivo, houve um impacto maior na piora da saúde mental e na obtenção de renda após a Covid-19. Pesquisa realizada entre abril e maio de 2021 revela que seis em cada 10 pessoas LGBT+ sofreram com a diminuição ou ausência de renda, 59,47% estão desempregados há um ano ou mais e 55,19% relataram uma piora na saúde mental diante dos problemas decorrentes da pandemia.

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Manifestação a favor dos direitos da comunidade LGBTQIA+ em Ponta Grossa | Foto: Saori Honorato/Arquivo Lente Quente


Entretanto, em Ponta Grossa não é possível ter uma dimensão da condição da comunidade, visto que não existem levantamentos oficiais sobre este grupo. Atualmente o cuidado com os indivíduos em vulnerabilidade recai sobre as ONG's e instituições com foco na comunidade LGBTQIA+.
Segundo Débora Lee, educadora social e fundadora do Grupo Renascer, percebe-se uma piora na situação da comunidade em diversas áreas e, principalmente, um agravamento da condição das mulheres travestis e transsexuais. “Eu que trabalho diretamente com a população vejo que aumentou a vulnerabilidade não só social, mas também a saúde integral da nossa população, perdendo o direito à moradia, um trabalho digno e formal, direito à educação, direito a uma família”, diz.

 

Ações

De acordo com Bruna Iara Chagas, assistente social, pesquisadora sobre políticas públicas LGBT+ e integrante da Associação Flor de Lis LGBT, para que houvesse uma melhora no auxílio à população LGBTQIA+ de Ponta Grossa seria necessário ao menos duas ações do poder público: a operacionalização das políticas públicas e a produção de dados oficiais em relação à comunidade. “Há uma lacuna entre o que é previsto nas políticas e planos, e o que é realizado em termos de ação, e a ausência de dados oficiais estanca o processo de planejamento de políticas públicas específicas que poderiam ser sustentadas a partir destas informações.”
Em Ponta Grossa, as instituições se mobilizaram para cuidar das necessidades básicas da população LGBTQIA+. O Grupo Renascer apresenta no momento uma lista de espera para auxílio psicológico e também colaborou com a distribuição de uma média de 248 cestas básicas para a população. “Essa é a realidade de uma cidade provinciana e preconceituosa, que nessa pandemia, fingem não ver aquela população que está à margem da sociedade sem direito algum, em vulnerabilidade social acrescida” enfatiza Débora Lee.

 

Conselho

A secretária-executiva da Secretaria de Políticas Públicas Sociais de Ponta Grossa, Leila Cristina, diz que o Conselho Municipal LGBT é responsável pela discussão de projetos e políticas públicas voltadas à população LGBTQIA+. Segundo Leila, o conselho está passando por uma reestruturação, na qual foi criada uma comissão responsável pela eleição dos conselheiros da gestão 2020 através de fórum.
Em março de 2020 foi realizado o Fórum Municipal LGBT na sede da OAB em Ponta Grossa para indicação dos representantes da sociedade civil, mas devido à falta de candidatos para a formação da nova representação do conselho ele foi impossibilitado e também diante do agravamento da pandemia o planejamento de um novo fórum foi adiado.

 

Este texto é parte do conteúdo da edição recém-publicada do jornal-laboratório Foca Livre, produzido pelo 2º ano de Jornalismo da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Acesse a edição completa em https://periodico.sites.uepg.br/index.php/foca-livre

 

Ficha técnica

Reportagem: Catharina Iavorski

Edição: Lilian Magalhães

Publicação: Matheus Gaston

Supervisão Foca Livre: Jeferson Bertolini, Muriel Amaral e Rafael Kondlastch

Supervisão Periódico: Marcos Zibordi e Maurício Liesen