O número de casos de violência contra a pessoa da terceira idade cresceu nos dois últimos anos, em Ponta Grossa. Em 2015, foram 246 casos de agressões físicas, psicológicas e morais. Quantidade supera os números do ano anterior quando 178 casos foram registrados pelo Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas).
Segundo o Estatuto do Idoso, “considera-se violência contra o idoso qualquer ação ou omissão praticada em local público ou privado que lhe cause morte, dano ou sofrimento físico ou psicológico”.
As denúncias, encaminhadas por casas de permanência, familiares e vizinhos são recebidas pelo Creas. A instituição fica responsável pela fiscalização, orientação e apoio às pessoas que tiveram direitos violados.
O aumento de casos de 2014 a 2015 se torna alarmante, principalmente, para entidades de apoio que se articulam em prol da pessoa idosa. Até o mês de maio deste ano, 82 pessoas da terceira idade já tinham sofrido com algum tipo de agressão na cidade.
O casal de aposentados Benedito Davanzo e Maria Davanzo se envolveu em um caso de violação de direitos. O problema surgiu quando eles tentaram realizar uma viagem para Santa Catarina no início de junho passado. O incidente aconteceu por volta das dez horas da manhã do dia primeiro.
Os aposentados não conseguiram o desconto de 50% da tarifa, como está previsto na Lei 10.741 de 2003, conhecida como Estatuto do Idoso. Eles explicaram que a atendente da empresa de transportes não reconheceu, inicialmente, a solicitação e, quando reivindicado o preço especial, ela orientou o casal a buscar os próprios direitos. O casal acabou recorrendo ao Programa de Proteção e de Defesa do Consumidor (Procon).
O casal recebeu uma carta do Procon e retornou para conversar com a atendente. Segundo Benedito, a funcionária da empresa alegou que as viagens com desconto estariam disponíveis apenas nos finais de semana, como condição imposta pela empresa. O horário indicado era, no entanto, inviável para o casal, uma vez que demandava que eles adiassem o retorno por mais alguns dias.
Benedito, que tem 69 anos, conta que a atendente respondeu com ofensas. Ela teria dito que idosos não fazem nada e, por isso, para eles seria possível viajar em um fim de semana e voltar no outro.
O casal ficou revoltado com a situação e continuou em busca de alguma providência. Para resolver o problema, eles recorreram ao Creas na quinta-feira (2), dia seguinte ao que ocorreu a agressão. A entidade entrou em contato com a empresa e aguarda resposta.
Maria já viajou várias vezes usando passagens com desconto. Ela afirma que sempre conseguiu viajar com a tarifa pela metade e nunca passou por esse tipo de problema. A aposentada, de 70 anos, veio de São Paulo com o marido, em 1980, para morar em Ponta Grossa.
No vídeo abaixo, o aposentado Benedito Davanzo descreve a situação de agressão vivenciada ao tentar comprar a passagem com o desconto de 50%, direito assegurado pelo Estatuto do Idoso:
O lado de quem trabalha pelos direitos dos idosos
O Creas oferece serviço de proteção a indivíduos e famílias vítimas de violação de direitos, como maus-tratos, violência e exploração. Em Ponta Grossa, os atendimentos mais frequentes são com os idosos.
A presidente do Creas, Lana de Cássia, conta que o número de casos de violação contra pessoas com algum tipo de deficiência física e contra a comunidade de Lésbicas, Gays, Travestis e Trans (LGBT) já chegou a zerar em alguns meses. Isso, no entanto, nunca aconteceu com pessoas da terceira idade.
Os casos de agressões físicas são, geralmente, encaminhados à delegacia. Nesses casos, o Creas se envolve, normalmente, promovendo reuniões familiares, assistência social e visitas a locais denunciados. Segundo Lana, há casos em que a fiscalização revela outras violações de direitos que não as indicadas nas denúncias.
O Disque 100 e o Ministério Público são os principais meios para o recebimento das denúncias. Desde 2008, o Creas trabalha com equipes de fiscalizadores, psicólogos e assistentes sociais justamente com o objetivo de dar solução às violações. Idosos abandonados ou que passam por algum tipo de situação precária são acompanhados. Busca-se, na maioria dos casos, abrir um diálogo com algum familiar para resolver o problema.
Semanalmente, são feitos relatórios de análise dos casos atendimentos. Em 2016, como Lana explica, o centro conseguiu uma formação técnica completa com psicólogos, assistentes sociais e fiscalizadores. Além disso, houve mudança da sede que ganhou uma estrutura mais compatível para atendimentos. O novo endereço é Rua Tiradentes, nº 910.
Em casos de emergência, o Creas encaminha pessoas da terceira idade para os asilos, chamados de casas de permanência. O idoso está, geralmente, ferido ou não possui autonomia para realizar atividades básicas.
Em Ponta Grossa, já foram encontradas cinco casas clandestinas. Lana explica essas casas são consideradas clandestinas, pois funcionam como albergues e os responsáveis por sua administração ficam com o dinheiro dos abrigados em troca de quartos e de alimentação.
Lana conta que há duas casas clandestinas em funcionamento em Ponta Grossa, que precisam ser regulamentadas para não fechar. Ela explica que é ruim ver os vínculos criados nas casas clandestinas serem quebrados, já que a maioria dessas ações de acolhimento é feita sem intenção de explorar o idoso. O principal problema é que por não seguir aspectos legais como a forma e o valor de pagamento.
O Creas possui uma lista de espera a partir da qual são feitos a triagem e o encaminhamento para as casas de permanência. A preferência é dada aos casos mais graves que são avaliados pelo grau de dependência ou de emergência a partir de três níveis:
- Grau I (independente),
- Grau II (até dois tipos de dependência) e
- Grau III (total dependência).
Dependência se trata da necessidade do auxílio de outra pessoa para realizar qualquer atividade básica, como comer ou se movimentar.
A família é a responsável por fazer o cadastro no Creas através do serviço de proteção ao idoso. Ela relata a situação do idoso a fim justificar a necessidade de transferência para os asilos. A família tem a opção de deixar, permanentemente, o idoso nesses espaços.
De caráter filantrópico, existem quatro casas principais: Paulo de Tarso, Lar da Vovózinhas, Colmeia Espírita Cristã Abgail e o São Vicente. Elas são mantidas por convênios com a prefeitura e recebem 70% da renda da pessoa idosa para cobrir os gastos com a manutenção. Quem não tem condições de pagar permanece no asilo gratuitamente.
O asilo São Vicente completa 90 anos em setembro deste ano. A instituição é a única mista na cidade. Isto é, abriga tanto homens como mulheres e atende, atualmente, 109 pessoas. São 70 funcionários que ficam responsáveis pelo apoio e pelos cuidados físicos e psicológicos.
A assistente social do asilo São Vicente, Fernanda da Silva explica como recebe as pessoas idosas em condições de abandono e quais são os principais casos de violação:
Margarete Roberti, 61 anos, foi influenciada pela filha a morar em Ponta Grossa. Ela vivia em Curitiba e trabalhava como telefonista. Por dois anos, a idosa sofreu agressões físicas cometidas pela filha, que era usuária de drogas ilícitas. Ela conta que já precisou se esconder da filha dentro da própria casa, tendo contado com a ajuda dos vizinhos para sair do local.
A idosa está há dois meses no asilo São Vicente. Antes, logo quando ela chegou à instituição, Margarete ficou duas semanas na enfermaria. “Nunca imaginava na minha vida passar por isso”, desabafa. A idosa lembra que ficou com a saúde debilitada e entrou em depressão profunda. No entanto, ela faz questão de dizer que está melhor e em recuperação.
Com refeições e remédios disponibilizados na hora certa, Margarete fez novas amizades e vive com maior tranquilidade no asilo. Maria Ciesla, de 81 anos, que já morava no asilo, foi uma das pessoas que acolheu a nova moradora e é ela que, hoje, oferece apoio nas horas difíceis. As duas fazem questão de dizer que o São Vicente proporciona ótimas condições de vida.
No asilo, os idosos com maior autonomia podem sair, sozinhos, terça-feira, sexta-feira, final de semana e feriado. Eles realizam passeios, vão ao mercado e participam de atividades recreativas fora da instituição. Entre elas, estão teatro, colagem, bingos e bailes.
A permanência dos idosos na instituição depende muito do histórico da família. “Se existe a possibilidade de alguém cuidar do idoso, nós integramos desde que haja segurança”, lembra.
O asilo busca integrar suas atividades com os Centros de Assistência Social (Cras), as universidades, as unidades de saúdes e os Centros de Convivência (Cecons). “Tudo que está articulado na rede nós utilizamos para que o idoso tenha acesso aos serviços”, explica.
Saúde e lazer nos centros de convivência
A Fundação Proamor foi fundada como Fundação Municipal de Promoção ao Idoso (Fapi), em Ponta Grossa, em 27 de março de 1991. Em 2009, houve uma fusão de três departamentos: do Idoso, do Deficiente Físico e o Administrativo e Financeiro. Dentro do Departamento, há Cecons e grupos de idosos.
O corpo de funcionários conta com 14 pessoas que trabalham na Fundação, no bairro Nova Rússia. Eles são responsáveis pelo atendimento de mais de 1,4 mil pessoas da terceira idade. As atividades acontecem de segunda a sexta, das oito horas da manhã às seis horas da tarde. O Departamento do Idoso atende a população idosa tanto da área urbana como a da rural de Guaragi, Pinheiros e Itaiacoca.
No Centro de Convivência de Nova Rússia, são desenvolvidas atividades para outros Cecons. Ao todo, são oito centros espalhados pela cidade: Santa Paula, Ronda, Cará-Cará, Cipa, Borato, Taborá e Santa Luzia. O Cecon Nova Rússia é o único que possui uma clínica e equipe técnica. Todos os centros possuem equipes de assistentes sociais, estagiários e responsáveis por articulações.
Segundo o assessor da Fundação Proamor, James Proença, o Departamento do Idoso traz um serviço de proteção básica e fortalecimento de veículos para as pessoas da terceira idade. Ela conta que há o projeto de um Centro de Idoso que ofereça, na cidade, as atividades preenchidas diariamente.
Atualmente, o Cecon Nova Rússia oferece espaços para jogos de truco, sinuca, hidroginástica, caminhadas, treino de boxes, tardes culturais, fisioterapia, ensaio de corais, aulas de capoeira e fanfarra. Para participar de algumas atividades físicas, é necessário apresentar exames de aptidão cardiológica por questão de segurança.
Segundo a assistente social e integrante do Conselho do Idoso, Marlene Stelle, alguns idosos acabaram descobrindo que eram cardíacos através desses exames. “Muitos nunca fizeram o exame e descobrem que precisam do tratamento”, conta.
Sobre os casos de agressão, Marlene explica que dentro do Conselho do Idoso existem comissões e responsáveis por setores, como o da fiscalização. A integrante diz que muitos dos casos também são encaminhados pela Secretaria de Saúde e que eles são, geralmente, encaminhados para o Creas.
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