Com o tempo limite para o fechamento do aterro Botuquara se encerrando, a Prefeitura de Ponta Grossa discute a implementação de um novo empreendimento junto à empresa Zero Resíduos, em Teixeira Soares. Contudo, a população está descontente, principalmente pelo fato da origem do lixo ser de outra cidade. Liberada pelo prefeito da antiga administração de Teixeira Soares, Ivanor Luiz Muller (PSD), em 2013, é a atual administração que assume a responsabilidade. O aterro será construído em área vizinha à Colônia Guaraúna, nome do rio que passa pelo local, que fica na zona rural da cidade.
Trajeto de Ponta Grossa a Guaraúna, local da construção do aterro | Foto: Lorena Panassolo
O aterro Botuquara, em Ponta Grossa, era um antigo lixão e, hoje, é um exemplo de aterro “controlado”. “Hoje há captação de chorume e cobertura com solo. As novas células têm impermeabilização do substrato, que não havia no lixão original”, explica o geólogo e professor do Departamento de Geociências da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Mário Sérgio de Melo. No entanto, para o professor o Botuquara nunca será um aterro, pois “a escolha da área não seguiu os critérios necessários”, adverte.
Para a instalação de um aterro, existem normas a serem cumpridas. Segundo informações do site do Instituto Ambiental do Paraná (IAP), o aterro deve: “a) estar localizado fora da área de influência direta do manancial de abastecimento público; b) manter a área de disposição final a uma distância mínima de 200 m de rios, nascentes e demais corpos hídricos; em situações na qual forem previstas distâncias maiores, de acordo com o Código Florestal ou demais legislações aplicáveis no que diz respeito às áreas de preservação permanente - APP, estas deverão ser atendidas”.
No caso do aterro de Guaraúna, a população reclama pela proximidade com o rio e com muitas casas. “O local onde querem construir é ao lado do Rio Guaraúna, o qual deságua no Tibagi [cuja água que é abastece alguns municípios]”, destaca a moradora Alessandra Wosniask.
Além de enchentes, outro problema é em relação à fauna. “O local é cheio de vertentes, tem animais que vivem ali - capivara, lobo guará e até mesmo onça - e que certamente seriam afetados com a construção desse aterro”, alerta
Mesmo com reclamações dos moradores, não se sabe, ao certo, qual o local exato da construção do aterro, já que a área cedida à empresa é muito grande. O empreendimento é uma iniciativa particular, sem vínculo com a Prefeitura de Ponta Grossa.
Os efeitos do aterro Guaraúna sobre os poços artesianos, muito utilizados nas residências e em instituições, também geram preocupação nos moradores. Há o risco de contaminação das águas subterrâneas acontecer, principalmente, pela construção inadequada dos aterros, como ressalta Melo.
Embora ressalte que não conhecer a área destinada e o projeto específico do aterro, Melo adverte, em relação ao manancial da região, que “leis e normas técnicas definem a distância mínima em relação aos corpos d’água”. O professor ainda salienta que: “Como geólogo que sou, minha preocupação principal é com as águas subterrâneas e não as superficiais. Se contaminado o aquífero subterrâneo, ele não tem recuperação viável”.
LIXÃO X ATERRO
A diferença entre aterro e lixão passa pela compreensão das diferenças entre os tipos de rejeitos, como observa o geólogo Henrique Pontes, ressaltando que o lixo é aquilo que é descartado e não terá condições de reaproveitamento. “Boa parte dos resíduos sólidos é reciclável e boa parte é orgânica. Apenas uma porcentagem pequena pode ser considerado lixo [descartável 100%]”, esclare.
O geólogo defende ser necessário “mudar o conceito do que é lixo”, uma vez que o que mais é gerado são os resíduos sólidos. “O descarte ideal é um aterro bem feito e seguindo as regras da legislação ambiental”, opina o geólogo Henrique Pontes.
Infográfico: Lorena Panassolo Fonte: Zero Resíduos
Com descarte a céu aberto, os lixões são os maiores poluidores do planeta. Essa áreas provocam a contaminação do ar, do solo e das águas, com substâncias tóxicas e cancerígenas. O prejuízo seria de R$ 3,6 bilhões, dinheiro usado para tratar de problemas ambientais, ainda segundo dados da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe).
Contudo, 60% das cidades brasileiras ainda utilizam o lixão, totalizando aproximadamente 3 mil municípios. É o que apontam dados de 2015 da Abrelpe. Já o gasto com a construção de aterros, que são projetos mais viáveis economicamente, gira em torno de R$ 1,2 milhões.
Atualmente, o mais viável é a instalação de aterros que, caso sejam bem feitos, podem ocorrer até mesmo dentro da cidade, sem que a população perceba. Economicamente falando o aterro é a melhor alternativa, gerando empregos e renda, como aponta a representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Conselho de Municipal Meio Ambiente de Ponta Grossa, Caroline Schoenberger Ávila. Ela também afirma a viabilidade, na conjuntura atual, do aterro e do tratamento de resíduos. Como projeto futuro, Schoenberger sustenta a possibilidade de uma usina, “desde que ela seja economicamente viável, já que ambientalmente ela”. Para ela, é importante considerar o aspecto econômico, uma vez que é preciso “pensar na questão de sustentabilidade".
Existem também dois tipos de aterro: o controlado e o sanitário. O primeiro é uma espécie de lixão um pouco melhorado, onde existe uma cobertura do lixo com solo para evitar vetores. Neste caso, o confinamento ainda preserva o local de problemas de saúde pública e evita o fluxo de catadores de lixos.
Já o segundo item segue as leis e normas ambientais. É necessária, nesse caso, observar critérios rígidos, como o principal deles, que é a escolha do local. “Aterro controlado nãopossui todas as células impermeabilizadas, devidamente preparadas onde é lançado o lixo. Já o aterro sanitário o lixo vem até o local, descartado e é aterrado e compactado”, completa Schoenberger.
O geólogo Mário Melo questiona o processo de concessão de licenças pelo IAP, que deve cumprir que prevê a legislação ambiental. Para o professor, o Instituto “não tem atendido essa premissa”. O resultado, alerta, seriam os inúmeros processos envolvendo dirigentes em crimes de “improbidade, corrupção, venda de licenças, o que deu razão ao conceito pejorativo de “moeda verde”, critica.
O termo, explica o geólogo, se refere à “venda de licenças para angariar verbas de campanha para políticos supostamente ambientalistas que são na verdade criminosos ambientais”.
Embora não haja a comprovação de irregularidades no projeto de construção do aterro de Guaraúna, a equipe de reportagem do Portal Periódico entrou em contato com a unidade local do IAP, mas somente a sede de Curitiba está autorizada a falar com a imprensa. O contato foi também realizado com a unidade da capital, mas até o fechamento desta reportagem, não houve resposta.
Foi realizado ainda o contato com a empresa Zero Resíduos, responsável pelo aterro em Teixeira Soares, mas não obtivemos respostas.
Vale lembrar que no primeiro semestre deste ano, o Superior Tribunal Federal (STF) julgou inconstitucional o item do Código Florestal que define “utilidade pública” e “interesse social” a gestão de resíduos sólidos. Isso impediria a construção de aterros sanitários em áreas de preservação permanente e em
Em entrevista ao jornal Diário dos Campos (https://www.diariodoscampos.com.br/noticia/moradores-da-colonia-guarauna-sao-contra-implantacao-de-aterro), o IAP alegou que a decisão do Supremo não afetaria a construção do aterro, já que a obra não se daria em área definida como APP. O Instituto também afirmou que o perfil de decisões para concessão de licenças já era de negá-las para APPs e para áreas de especial atenção, úmidas ou alagadas.