A adoção de crianças e adolescentes por casais homoafetivos foi e ainda é uma luta constante. A Constituição Federal, até meados de 2011, condicionava como “família” o casal representado por um homem e uma mulher. Com compreensão de que “família” é constituída por relações de afeto, o Supremo Tribunal Federal (STF) passou a reconhecer a união entre pessoas do mesmo sexo, abrindo então a possibilidade e o direito à adoção.

Obrigatoriedades para adoção são iguais, mas ainda existem barreiras culturais | Foto: Amanda Dombrowski

No Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) não há impedimentos a casais homoafetivos de realizarem a adoção. O Cadastro Nacional de Adoção (CNA), de responsabilidade da Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ainda não registra  dados referentes às adoções por casais homoafetivos. Embora as condições obrigatórias para adoção sejam iguais para todos, ainda há resistência cultural que problematiza a adoção por casais que homoafetivos. 

Professora de Direito e coordenadora do Núcleo Maria da Penha (NUMAPE) da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Maria Cristina Rauch Baranoski, em entrevista por e-mail explica como funcionava o processo de adoção, conforme assegurado pela Constituição Federal. “A lei não cita expressamente a condição hétero para adotar. O que acontecia era uma interpretação equivocada do sentido de família, como se essa pudesse ser constituída apenas por um homem com uma mulher. Ante as lutas para o reconhecimento dos direitos de todo(a)s seres humano(a)s como cidadão(a)s, houve a busca pelos Tribunais para reconhecer o direito que lhes era negado, em razão de um equívoco da própria Constituição Federal”.

Com atuação na área do Direitos da Criança e Adolescente e da Família, Baranoski desenvolveu pesquisa de mestrado sobre adoção homoparental. Já no doutorado, defendeu uma tese sobre a relação das instituições de ensino com famílias constituídas por casais homoparentais. “Quando desenvolvi a pesquisa de mestrado a respeito da adoção por pessoas do mesmo sexo, na ocasião ainda não havia sido julgada a ação que pleiteava os mesmos direitos dos casais héteros para os casais homossexuais, porém, muitos pedidos já estavam sendo postulados no judiciário. A experiência da época mostrou que há o preconceito em todos os meios. Após o julgamento do STJ equiparando os direitos das famílias, houve a necessidade de alterar também a postura de muitos juízes e membros do Ministério Público”, explica.

“Na tese de doutorado, pesquisei a respeito do relacionamento da escola e da família homoparental. Infelizmente, a tese resultou na invisibilidade da família homoparental na escola. Ou seja, o ambiente escolar não percebe que essa família existe e essa postura pode ocasionar violências em razão de preconceitos que não são trabalhados na escola”, argumenta a pesquisadora.

A psicóloga Bárbara do Carmo Noviski Gonçalves explica que  a escola tem obrigação de ensinar aos alunos a respeito das diversidades no ambiente familiar e que o diálogo pode facilitar essa compreensão. “O educador, considerado um substituto dos pais que recebe na escola a criança que sai do seu ambiente familiar, possui dever ético de apresentar as diversidades de configurações familiares. As crianças não criam transtornos. Esse tipo de questão vem das dificuldades encontradas nos adultos no exercício da sexualidade”, defende a Gonçalves.

O enfermeiro Antônio Carlos Gomes Araújo, 54, conta como foi o processo de adoção de Carlos, 13, adotado aos 6 anos,  e sobre a relação com o filho. “Tudo foi muito rápido e atípico. Fui fazer um trabalho voluntário na instituição onde ele estava, me encantei com ele e resolvi adotá-lo. Ao todo o processo levou cerca de um ano mais ou menos. Quando casado com outro homem, nosso projeto era ter quatro filhos. Já com duas filhas biológicas, optamos por adotar dois meninos. Mas o casamento acabou, agora sigo com o projeto sozinho”.

“Somos muito parceiros, conversamos muito. Quando me casei no civil com um homem, meu filho pediu para levar as alianças. No fim da relação,  ele foi bem solidário comigo. Não costumo conversar com ele sobre adoção homoparental, pois acho que o preconceito está no adulto e não na criança. O adulto julga, acusa e a criança só quer atenção e carinho. É o adulto que a induz a homofobia”.

Araújo também dá dicas para casais homoafetivos que queiram adotar crianças. “É necessário ter muita paciência, tanto antes da adoção, quanto depois da adoção. Muitos pensam que é fácil, mas não é. Nossa paciência, nossa capacidade de amar é testada todos os dias. Mas também ter muito amor no coração e, estar aberto a novas experiências. Quando adotamos alguém, estamos nos comprometendo a amar, educar e preparar a pessoa para a vida”.

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01/11/2019 - A chance de uma criança com mais de 14 anos ser adotada é de 0,38%

Ficha Técnica

Reportagem: Laísa Braga
Foto: Amanda Dombrowski
Edição: Raylane Martins
Supervisão: Professores Angela Aguiar, Fernanda Cavassana, Hebe Gonçalves, Ben Hur Demeneck e Rafael Kondlatsch
Monitores: Helen Scheidt

 

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