Dos cinco candidatos à prefeitura, apenas dois citam as palavras patrimônio histórico em seus planos de governo

 

A casa do ex-prefeito de Ponta Grossa, Eurico Batista Rosas, localizada no Centro da cidade, na esquina das ruas Coronel Bittencourt e Comendador Miró, foi demolida, à noite, no dia 2 de outubro. O imóvel demolido levantou discussões no grupo do Facebook chamado Preserva Ponta Grossa. Muitos participantes do grupo consideraram que a demolição foi um apagamento da história da cidade. Outros prédios já foram demolidos antes de passarem pelo processo de tombamento como o Cine-Império, Cervejaria Adriática e a Casa do Bispo. Os candidatos à prefeitura não se manifestaram sobre o assunto em suas redes sociais. 

Nos Planos de Governo dos candidatos à Prefeitura Municipal de Ponta Grossa há apenas duas citações diretas ao tema. O candidato Marcio Pauliki (Solidariedade) cita a preservação dos prédios históricos da cidade, mas de forma muito vaga, no item Cultura, ponto 16 chamado de Valorização do Patrimônio Cultural. O ponto diz que “Histórico, natural, artístico, museológico, iconográfico, literários e documentais. Abrangendo as suas categorias materiais (o patrimônio físico), bem como o imaterial (o saber e fazer da comunidade).” Apesar de citar corretamente, o candidato não mostra formas concretas de preservar o patrimônio.

Outra candidata que se propõe a debater o tema é Elizabeth Schmidt (PSD). Segundo o Plano de Governo, caso seja eleita integrará ações com a exploração inteligente do patrimônio histórico, porém não especifica de que forma isso será feito. A candidata também propõem um incentivo econômico a preservação de prédios que não sejam tombados oficialmente e sejam apenas antigos. O restante dos candidatos cita preservação ambiental e preservação da memória, ou então assuntos relacionados a Preservação Cultural, mas nenhuma dessas citações envolvem diretamente prédios históricos. 

O vice-presidente da APPAC (Associação de Preservação de Patrimônio Cultural e Natural) e pesquisador CNPq sobre patrimônio cultural e memória social, Leonel Brizolla Monastisky, que já foi representante da UEPG no ano de 2019 no Conselho Municipal de Patrimônio Cultural (COMPAC), comenta que não viu os candidatos citando o tema em suas campanhas. Para ele, será um desafio para o conselho do COMPAC. Isto porque a lei atual de formação do conselho é falha: “A lei prevê que 70% dos membros aprovem o tombamento. Ou seja, de todos os membros. Se um ou dois membros faltam é claro que eles não vão votar a favor. E esses votos [faltantes] contam. É um dos maiores absurdos que eu já vi, é claro que deveria ser 70% dos membros que estão lá.” 

O pesquisador também considera que 70% dos votos favoráveis é uma taxa alta para considerar um tombamento. Já que antes de levar a votação, o prédio passa por uma extensa pesquisa e é inventariado para então seguir ao tombamento provisório: “São representantes de entidades sociais. Acho que vale o voto dessas pessoas. Cinquenta por cento mais um das pessoas que estão lá já é suficiente. Houve uma proposta da APPAC com relação a nova lei que está ainda vetada, esperamos no futuro que isso venha ser mudado.” explica Monastisky.

Em abril deste ano o conjunto arquitetônico da rua XV, por exemplo, entrou em votação, mas os 11 prédios que compõem o conjunto não foram aprovados na sessão pública de tombamento. Faltaram dois conselheiros na votação e dois membros do COMPAC votaram contra. O prédio não foi tombado, mesmo com maioria presente na sessão a favor do tombamento, por conta da lei, já que é necessário 15 votos a favor para o tombamento ser oficializado. 

Em 2019, três edifícios deixaram de ser tombados. Dois imóveis de arquitetura modernista, um de autoria do renomado arquiteto Vilanova Artigas e um imóvel de autoria de Miguel Juliano. O prédio conhecido como Eletrônica Parcz, localizado na Rua Ermelino de Leão também deixou de ser tombado neste dia. Ao todo apenas cinco imóveis são tombados como patrimônio histórico na cidade e estão sob os cuidados da prefeitura. Oito deles são tombados a nível estadual.

Monastisky relembra que devido a história da cidade, o número de prédios tombados é pequeno. “Pelo número de edificações que foram construídas ao longo da história especialmente no final do século 19 e início do século 20, acho que Ponta Grossa poderia ter muito mais edificações tombadas. Existe, é claro, um movimento a partir da criação do COMPAC, mas perto do que tinha e do que ainda tem ainda é muito pouco.” observa o pesquisador. 

O COMPAC age com legislação própria. Um prédio privado, para ser tombado oficialmente, primeiro precisa ser inventariado e levado o pedido pelos donos do imóvel ou por meio de ação popular. Então o COMPAC faz uma pesquisa, levando em conta a arquitetura, relevância do patrimônio, memória que evoca, ou se for de uma figura pública. Se o COMPAC deliberar que o tombamento é necessário, o prédio entra em estágio de tombamento preliminar. O proprietário do imóvel tem 60 dias para impugnar a ação. O COMPAC pode se opor a impugnação e é neste momento que acontecem as sessões públicas de votação. As sessões públicas necessitam de 70% dos votos favoráveis ao tombamento para que o prédio seja tombado. O conselho conta com 21 cadeiras e 1/3 dessas são escolhidas a cada gestão da prefeitura. Ou seja, o próximo a ocupar o cargo, irá escolher 7 dos representantes que definem se um prédio deve ser preservado devido sua história. 

Outra questão são as leis do COMPAC que o novo gestor irá lidar. Monastisky observa que embora o COMPAC exista, ele não funciona tão bem quanto poderia. “As leis são ruins em relação ao tombamento e cabe ao prefeito ir contra o interesse dos rentistas e das imobiliárias que sempre vão contra os tombamentos.” O setor econômico compõem 1/3 das cadeiras do COMPAC, ou seja, sete cadeiras. 

Devido ao isolamento social, as reuniões do conselho foram interrompidas por meio de decreto lançado em março. Houve uma impossibilidade de fazê-las de forma remota devido à idade de alguns conselheiros e a impossibilidade de conexão. Antes de interromperem a atividade, havia uma lista de 14 imóveis em processo de inventário que o conselho esperava votar e deliberar ao longo do ano. No entanto, já de início, quatro proprietários não queriam que seus imóveis constassem na lista de inventário do COMPAC.

Por que há uma resistência para tombar prédios?

 

Donos de imóveis privados apresentam resistência ao tombamento. Segundo o diretor do Departamento de Patrimônio Cultural, Alberto Portugal, que tem uma cadeira representativa no COMPAC, há alguns fatores que interferem nessa decisão. Os donos de imóveis creem que preservá-los leva ao impedimento do avanço da cidade, desvaloriza o imóvel e custa caro. “Não podemos jogar simplesmente uma camada de tinta em um imóvel tombado. É necessário que seja feito um processo de revitalização técnico ou até mesmo a restauração que acaba saindo até três vezes o valor de uma construção nova.” explica Portugal. Atualmente, donos de imóveis tombados tem 70% no desconto do IPTU. 

Já os imóveis de propriedade da prefeitura de Ponta Grossa enfrentam outros problemas. Um deles é a carência de recursos para a área. “Nós temos recursos limitados, não estou falando desta gestão. Estou falando que é histórico. Sempre se tem recursos limitados para a Cultura de modo geral e para a restauração desses imóveis.” comenta Portugal. 

 

Ficha técnica:

Repórter: Jessica Allana

Edição: Amanda Gongra

Supervisão: professores das disciplinas de textos III e NRI II