Com Vladimir Brichta e Julia Lemmertz no elenco, espetáculo discute arte, dinheiro, religiosidade e trabalho

 

“Como é que faz para não ter medo?” é a pergunta final do espetáculo ‘Tudo’, peça apresentada na abertura do 50° Festival Nacional de Teatro (Fenata), no palco principal do Cine Teatro Ópera, em Ponta Grossa. Dirigida pelo diretor paranaense Guilherme Weber, o trabalho é uma adaptação da comédia do dramaturgo argentino Rafael Spregelburd, e foi criada em um festival de teatro na Alemanha, em 2009, em comemoração aos 20 anos da queda do Muro de Berlim. A história acompanha três perguntas principais, cada uma com uma crítica moral. Logo no início,  define-se a trama com uma “fábula de Esopo, só que sem os animais”.

A primeira pergunta sem resposta é “Por que todo Estado vira burocracia?”, apresentada ao público a partir de funcionários públicos que questionam as regras impostas no trabalho. Mesmo sem a presença de um cenário, o ato é compreensível através das representações corporais e faciais dos atores. Em sequência, “Por que toda arte vira negócio?” retrata uma ceia de Natal onde as personagens discutem questões comuns ao pós-modernismo, como dinheiro, falta de criatividade e fetichismo do consumo. Por fim, a peça encerra com a questão “Por que toda religião vira superstição?”, onde um casal descobre que o filho está doente e tentam ter fé, mesmo sem acreditar em nada. No elenco, conhecidos nomes como Vladimir Brichta, Julia Lemmertz, Dani Barros, Claudio Mendes e Marco Vito. A atriz Dani Barros, contudo, não pôde participar da encenação, pois testou positivo para Covid-19. Em seu lugar, Marco Vito leu e interpretou as falas no palco, com auxílio do roteiro na mão.

Peça ‘Tudo’ discute Dinheiro, Arte e Religião | Foto: Victor Schinato/Lente Quente

 

‘Tudo’ apresenta uma cenografia simples, sem decorações, dependendo apenas dos atores, os diálogos e o trabalho de iluminação que, por sinal, brinca com as questões de luz e sombra, fazendo com que o palco com aparência de vazio no início, se preencha ao longo das cenas. Mesmo com nomes de peso do teatro e da televisão no elenco, o que ganha destaque nas cenas é o coletivo, pois cada ação dita apresenta uma reação no palco e também no público. Um destaque especial para o primeiro ato que, mesmo simples, mostra uma realidade que pode ser vista em diversos espaços, incluindo o universitário.

A peça também avança em discussões básicas de teatro: ao  se ver representado nos atores em meio a um ‘teatro do absurdo’, o público descobre um pouco sobre si mesmo. Afinal quem, em período pós-eleitoral como de 2022, gostaria de ser um burocrata conservador? Através da comédia, o teatro provoca o espectador a temas presentes na vida coletiva e, ao deixar as questões sem respostas, a apresentação conclui com maestria aquilo que foi apresentado no começo da peça: qual é a resposta pessoal de cada um ali presente para os porquês?

Como comédia, 'Tudo' apresenta um roteiro rápido, com tiradas e reflexões que  destoam da cena representada. Ao fazer o público pensar e reagir, os comentários acompanham o clima do País, mesmo sem variação no roteiro desde a estreia em abril de 2022. Por fim, com  apenas quatro atores no palco, o espaço ainda parece cheio: todos ocupam os papéis com desenvoltura, do narrador até uma bêbada em uma festa de Natal fracassada. Ao deixar mais dúvidas do que as apresentadas no primeiro ato, finaliza-se com "como é que nós, o público, podemos não ter medo?"

 

Peça: ‘Tudo’ - espetáculo de abertura do 50º Fenata (8/11/22, 21:30h)

Ficha técnica:

Dramaturgia: Rafael Spregelburd

Direção: Guilherme Weber

Elenco: Julia Lemmertz, Dani Barros, Claudio Mendes, Vladimir Brichta e Marco Vito

Classificação: 14 anos

Gênero: Comédia 

Duração: 90 minutos

Produção e Realização: Quintal Produções (Rio de Janeiro/RJ)