Em Ponta Grossa e Maringá, estudantes precisam morar à uma distância mínima de mais de 1 km para terem direito ao passe estudantil. Cascavel é a única dentre as três cidades que não exige distância entre a residência do estudante e a instituição de ensino.

Publicado originalmente em 14/06/2017.

Texto atualizado em 08/07/2017

 

“Eu moro há menos de dois quilômetros da UEPG, mas moro longe do meu estágio. Tentei fazer o cadastro para o passe estudantil, levei todos os papéis e cópias de documentos, mas na hora de finalizar o passe fui impedido por causa da lei municipal que veta o passe estudantil pelo limite de distância”. O relato é do acadêmico de Direito da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Paulo Regailo.


Os trâmites que envolvem o cadastro, a aquisição e a utilização dos passes estudantis, oferecidos pelas prefeituras de Ponta Grossa, Maringá e Cascavel, apresentam detalhes que tornam o processo burocrático. A população dessas cidades fica entre 316 mil e 403 mil habitantes, sendo consideradas de porte médio.


Em levantamento, foi verificado que o processo dos passes estudantis é quase o mesmo, nas três cidades, exceto por alguns pontos, como: Cascavel é a única dentre as três que não exige distância mínima entre a residência do estudante e a instituição de ensino. Já Ponta Grossa e Maringá exigem uma distância mínima. Essas implicações restringem o acesso dos estudantes a ambientes fora do horário de aula.
“Eu ia utilizar o transporte público para ir para o estágio que tem total vínculo com a Universidade, fiquei bem decepcionado com um sistema que era para ser inclusivo, mas por conta de toda uma burocracia não pude utilizar”, relata Regailo.


Nas cidades investigadas, o passe estudantil isenta o usuário do pagamento de 50% ou 100% da tarifa do transporte. Como não há subsídio das prefeituras municipais em nenhuma das três cidades, todas as isenções do transporte público convencional são pagas pelos passageiros comuns.  Ou seja, o que a empresa deixa de arrecadar é diluído no preço das passagens.
O município de Maringá, diferente de Ponta Grossa e Cascavel, concede aos estudantes do ensino básico e superior dedução de 100% na tarifa do transporte coletivo. Em Ponta Grossa, o benefício é de 50% para estudantes cadastrados no sistema de meia passagem e de 100% para os estudantes cadastrados no sistema de passe livre. No cadastro do passe livre, o decreto n° 10.065 exige que o estudante comprove que é beneficiário de algum programa social do governo federal ou estadual. Já em Cascavel o desconto é de 50% no valor da tarifa.

 

Em Ponta Grossa, o benefício do Passe Livre teve início em 2015. Na cidade, o procedimento de aquisição do passe necessita de documentos como a folha resumo do Cadastro Único (CadÚnico) constando que o estudante ou seus pais são beneficiários de algum programa social do Governo Federal. O documento não é exigido no cadastro do passe livre em Maringá e Cascavel.
Ponta Grossa possui aproximadamente 100 mil estudantes, entre Ensino Básico e Superior. Cerca de 16 mil estudantes são cadastrados para a obtenção da meia passagem e do passe livre. Esse número representa 15% dos estudantes ponta-grossenses.


No município, o horário de utilização do cartão de estudante é limitado ao turno de matrícula do aluno. Por exemplo, se o estudante é matriculado no turno da manhã ele pode utilizar o passe estudantil das seis horas da manhã até uma hora da tarde, horário referente à matrícula. Essa restrição de horário limita a locomoção do estudante, já que as atividades estudantis não se restringem às aulas previamente estipuladas em um horário. Em 2016, acadêmicos da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) realizaram um movimento pela liberação do horário do passe estudantil. Segundo o estudante de História Licenciatura da UEPG e participante do movimento, Hugo Garcia, a utilização dos passes estudantis vai além das aulas em sala de aula. “A formação não se resume apenas à sala de aula, na participação nos eventos, grupos e espaços universitários, caso necessite buscar um livro ou mesmo utilizar o espaço universitário, a proibição nos horários é algo que prejudica os acadêmicos”, aponta.


No município, ainda há muitas reclamações não somente pelo sistema dos passes estudantis, mas também pela falta de informações, pela disseminação de informações errôneas, pela ineficácia do cadastro online e pelo mau atendimento por parte dos funcionários. Para o acadêmico de Engenharia Mecânica da Universidade Tecnológica do Paraná - Ponta Grossa (UTFPR-PG), José Vinícius Ribeiro do Nascimento, o principal problema é a falta de informação sobre qual tipo de comprovante de residência utilizar. “Eu tive que ir cerca de seis vezes na praça de atendimento da prefeitura, no terminal central, para conseguir renovar o meu cadastro, tudo isso pela falta de informação sobre como deve ser o comprovante, grande parte dos problemas que enfrentei seriam resolvidos se tivesse informações mais direcionadas”, afirma.

 

 

Foto: Arquivo Periódico

Prefeitua de Ponta Grossa afirma que problemas no recadastramento online foram causados por estudantes que não souberam operar o sistema. 

 

A renovação do passe estudantil em Ponta Grossa, em 2017, passou a ser feita no site da prefeitura do município. O novo método apresentou problemas de informação e recadastramento. A estudante de Engenharia Química da Universidade Tecnológica Federal do Paraná - Ponta Grossa (UTFPR-PG), Angélica Henrique, conta sobre as dificuldades que enfrentou na renovação on-line: “Fiz meu recadastramento on-line e quando fui recarregar o cartão no terminal central disseram que estava faltando documentos. Então voltei outro dia e levei os documentos, mas ainda sim faltou documentos. Depois disso, tive que voltar lá mais três vezes porque continuou dando problema, até realizarem o procedimento manualmente. O processo todo durou mais de dois meses”, relata.


Em Cascavel, a estudante de Direito da União Educacional de Cascavel (UNIVEL), Adrielli Sagatelli, é cadastrada no sistema do passe estudantil e o utiliza exclusivamente para se deslocar para o estágio universitário. Ela conta que utiliza o passe somente para o estágio, já que a cidade não exige distância mínima entre instituição de ensino e residência. Cascavel possui aproximadamente 91 mil estudantes. Destes, 10 mil (cerca de 11%) são cadastrados para a obtenção da meia passagem e do passe livre. Já Maringá possui aproximadamente 110 mil estudantes e  cerca de 24 mil (aproximadamente 22%) estão cadastrados para a obtenção da meia passagem e do passe livre. Maringá exige ainda uma distância mínima de dois quilômetros entre a instituição de ensino do estudante e sua moradia. A distância tem que ser comprovada no ato do cadastro por um comprovante de endereço atualizado.

 

Segundo o Chefe da Divisão de Transportes Urbanos da Autarquia Municipal de Trânsito e Transporte (AMTT), Fernando Cardoso Bueno, a distância mínima é um critério definido em lei que considera possível o deslocamento a pé do estudante sem a necessidade de investimento por parte do poder público. A exigência do comprovante de residência é uma das principais dificuldades enfrentadas no cadastramento e no recadastramento do estudante para o benefício do passe estudantil.

 

Além disso, em Maringá, no ato do cadastro o estudante tem que fazer preferência por quatro linhas de ônibus que serão utilizadas no transporte entre a residência e a instituição de ensino, duas dessas linhas são destinadas para a ida à instituição e duas para a volta para casa. A graduanda em Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), Carolina Pinho Kinippeberg, conta a dificuldade que enfrenta com a escolha das linhas.  “Muitas vezes eu preciso pegar uma linha diferente de ônibus para ir para o centro da cidade ou para fazer algum trabalho da universidade e não posso usar o passe estudantil, pois as linhas não fazem parte do meu cadastro, isso afeta muito meu deslocamento com assuntos ligados à universidade”, afirma.

 

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Infográfico: Scarlet Rodrigues.

 

O QUE DIZEM AS PREFEITURAS?


PREFEITURA DE PONTA GROSSA
A prefeitura de Ponta Grossa, ao ser contatada, afirmou, via assessoria, que o que chamamos de burocracia é o processo necessário para "garantir que os beneficiários sejam, de fato, aqueles a quem a lei dá o direito de recebimento". Disse, também, que os problemas enfrentados pelos estudantes no recadastramento online foram causados porque "alguns usuários não souberam operar o sistema, que era extremamente simples e intuitivo" e "a partir do momento em que as equipes da AMTT identificaram o problema, foi criado, dentro da página sobre o benefício, um tutorial passo a passo".


Com relação aos limites de horários para a utilização do passe estudantil que prejudica muitos estudantes, a prefeitura afirma que "os limites existem para assegurar que o benefício seja utilizado exclusivamente para seu fim, previsto em lei, que é o deslocamento aluno de sua casa até a instituição de ensino". Ao ser questionada com relação às atividades extra-curriculares, afirmou que "embora relevantes para a formação do aluno, as atividades extra-curriculares não foram beneficiadas pelo programa passe-livre. À AMTT, cabe estritamente o cumprimento do que é previsto em lei, portanto, não cabe ao órgão fazer juízo de valor sobre esse assunto". Com relação à questão do benefício só ser válido, na cidade, a quem mora a mais de dois quilômetros da instituição de ensino, a resposta da prefeitura foi breve, "não cabe à AMTT discutir mudanças na legislação e, sim, cumprir o que foi instituído".


                    
PREFEITURA DE MARINGÁ
Já a Prefeitura de Maringá, que também se manifestou via assessoria, ao contrário da Prefeitura de Ponta Grossa, não negou a existência de uma burocracia, mas afirmou que "as exigências documentais são uma forma de garantir o máximo de transparência na relação entre o poder concedente (prefeitura), a concessionária (empresa de transporte) e o estudante" e que estão estudando "tornar o acesso e o uso do benefício menos burocrático". Com relação ao limite de linhas que o estudante deve escolher para usar, a prefeitura afirma que o trajeto que o estudante passa para ir de sua casa até sua instituição é atendido por uma ou duas linhas e, "portanto, o entendimento é de que esse número basta para atender o deslocamento do estudante até sua escola".
Já com relação ao limite de horário que priva os estudantes que realizarem atividades fora do horário das aulas normais, a prefeitura garante que "trata-se de uma questão em estudo pela nova administração, que busca entender com mais rigor esse impacto para, eventualmente, estender o benefício" mas que "esse debate está em fase inicial e que o tema faz parte de uma abordagem mais ampla de estudos para a modernização do transporte público". Segundo a prefeitura, a questão da distância mínima da instituição de ensino exigida para beneficiar os estudantes é mais uma questão que está em estudo.

 

PREFEITURA DE CASCAVEL
A prefeitura de Cascavel, também contatada via assessoria, acredita, com relação à burocracia, que, já que os documentos são exigidos nas instituições de ensino de qualquer forma, é fácil para o estudante apresentá-los na hora de conseguir o passe estudantil. A prefeitura também explicitou que o município não possui "subsídio público para custear o desconto de 50% nas passagens de estudantes", sendo metade da passagem paga pelo estudante e a outra metade dividida entre os demais usuários.
A prefeitura foi questionada com relação ao fato de ser a única dentre as três cidades médias analisadas na reportagem que não exige que o estudante more a uma distância mínima da instituição de ensino em que está matriculado (em Ponta Grossa, o estudante precisa morar a 2 quilômetros da instituição; em Maringá, a distância exigida é de 1,5 quilômetro). O município não faz a imposição porque "a exigência restringe-se ao fato de que a instituição de ensino deve ser obrigatoriamente em Cascavel".
Em Cascavel, o estudante tem o limite de 50 meio passes por mês, mas, segundo a prefeitura, "caso comprove necessidade de frequência em atividades estudantis além do turno matriculado, poderá adquirir quantidade superior de meio passe por mês, até o limite de 100 unidades, conforme a legislação".

 

 

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