Linhas de ônibus não acompanham crescimento de Ponta Grossa

Distância e concentração dos terminais são problemas enfrentados pelos usuários do sistema de transporte público

 

O sistema de transporte público de Ponta Grossa atende, atualmente, uma malha urbana cada vez  maior e distante dos terminais de ônibus do município. Por não conseguir acompanhar essa expansão, a frota de ônibus da cidade se encontra cada vez mais concentrada nas vias principais dos bairros.

 

Das 103 linhas de transporte coletivo que circulam na área urbana de Ponta Grossa, que correspondem a 917 quilômetros quadrados, 47 delas têm o Terminal Central como ponto de partida ou chegada. Esse número representa pouco menos da metade do total de linhas da cidade.

 

Os outros três terminais da cidade - Uvaranas, Nova Rússia e Oficinas - também recebem grande parte dessa circulação, cada um com 18, 21 e 14 linhas, respectivamente. Atualmente, não há nenhuma linha de ônibus na área urbana do município que não passa por pelo menos um dos seus quatro terminais.

 

As vias principais fora do Centro - como as Avenidas Carlos Cavalcanti (Uvaranas) e Ernesto Vilela (Nova Rússia) - atuam como eixos, como explica a professora de Serviço Social pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Sandra Maria Scheffer. As duas vias determinam o fluxo dos bairros e são a principal forma de conexão entre o Terminal Central e as demais estações.


 
A professora aponta que a má distribuição das soluções de mobilidade acarreta o “afunilamento urbano”. O problema provoca a concentração de circulação de veículos, pessoas e serviços em espaços restritos da cidade. Essa situação pode ser observada mais claramente no área central da cidade, mas também nas ruas principais que ligam os bairros ao Centro.

 

“Ponta Grossa cresceu muito desde que foram criados os terminais, há mais de 20 anos”, afirma Scheffer, que destaca a demanda por construção de novos terminais em outras regiões, como no Santa Paula.

 

O bairro, apesar de distante do Centro, tem parte da sua frota conectada ao Terminal Central. Outra é atendida pelo Terminal Nova Rússia, o mais próximo da região, a cerca de 4 quilômetros de distância do Santa Paula.

image6Gráfico feito a partir de mapa retirado do Plano Diretor de Ponta Grossa

 

No mapa, podem ser observadas algumas peças-chave para se compreender a mobilidade pública em Ponta Grossa. A primeira delas é o fato de os terminais atenderem linhas com trajetos distantes, mas que passam próximo a outros terminais.

 


Exemplo disso é o Terminal Central, que recebe passageiros diretamente do Distrito Industrial, ao sul do município e próximo ao Terminal de Oficinas.  O Terminal da Nova Rússia também se destaca por cobrir a demanda de ônibus de toda porção oeste e norte da cidade.

 


A segunda questão-chave é que todos os terminais se encontram próximos a vias movimentadas das regiões. A localização de destaque favorece a concentração de pessoas e serviços em pontos restritos da cidade.
Por último, é possível notar que as três estações dos bairros se encontram relativamente perto do Terminal Central. E a distância em relação ao Terminal Central chega a ser menor que a percorrida por algumas linhas ligadas a esses terminais.   

 

Em 2018, após dois anos de atraso, a gestão municipal retomou a revisão do Plano Diretor da Cidade. O projeto inclui o Plano de Mobilidade Urbana (https://planodiretor.pontagrossa.pr.gov.br/entenda-o-plano-de-mobilidade-urbana/), instituído por determinação da Política Nacional de Mobilidade Urbana, instituída pela Lei 12.587 de 2013 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12587.htm).

 

Criada em 2012, durante o governo da ex-presidenta Dilma Rousseff, a política, administrada pelo Ministério das Cidades, é obrigatória aos municípios com mais de 20 mil habitantes. O objetivo é encontrar formas de integrar as diferentes regiões nos municípios e garantir acesso aos serviços públicos para os cidadãos.

 

Ponta Grossa possui problemas para conectar suas regiões, principalmente se consideradas mais periféricas.  Bairros novos e conjuntos habitacionais, como o Costa Rica e o Los Angeles, possuem poucas vias de acesso. “Em caso de enchente, não tem como sair do bairro”, alerta Sandra Sheffer.

 

A professora auxiliou nas oficinas comunitárias organizadas pelo Instituto de Planejamento e Pesquisa (Iplan) de Ponta Grossa e pela empresa de engenharia e urbanismo Urbtec, ambos responsáveis pela revisão do Plano Diretor. Durante as audiências públicas com a população, as reclamações apresentadas pela comunidade não se restringiram à falta de ônibus ou aos problemas do transporte público. Problemas como a falta de ciclovias organizadas, calçadas precárias e pouca acessibilidade aparecem entre as queixas dos participantes.

 

Presente no Plano, o relatório de análise do sistema de transporte público aponta que, nos dias 01 e 07 de abril deste ano, a média semanal de usuários de é de cerca de 97.032 passageiros, volume que se verifica em dias normais. O estudo ainda aponta que, em dias mais movimentados, o número de usuários chega até 117 mil. Não há dados no documento que indiquem quantos desses indivíduos circulam pelos terminais.

 

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) lançou, no dia 29 de agosto, um relatório que aponta um crescimento habitacional dos municípios e Ponta Grossa supera a casa dos 348 mil habitantes. Em média, cerca de 27% dos ponta-grossenses utilizam o ônibus semanalmente.

 

O perfil do ônibus

 Diariamente, os usuários pegam, no mínimo, dois ônibus, quase sempre para o Centro. Este é o trajeto da maioria dos 30 entrevistados em enquete sobre a rotina de uso do transporte público, realizada pelo Portal Periódico.

 


O grupo de pessoas entrevistadas respondeu a perguntas referentes ao uso de ônibus no dia 29 de agosto, entre às 17h30 e 19 horas, horário de pico dos terminais Central e da Nova Rússia. Os locais foram escolhidos visto a movimentação de pessoas e a quantidade de linhas que ambos atendem. Foram feitas as seguintes perguntas às pessoas: qual o bairro de origem, a frequência com que pega ônibus, o que a leva a ir ao Centro e quantas linhas precisa pegar no caminho. Também foi perguntado sobre os problemas que enfrenta na linha de ônibus.

 

  image8

image7

 

 

image9

 

 

Percebe-se, através dos gráficos, que nem todas as pessoas entrevistadas vão ao Centro a trabalho. Muitas delas usam o terminal como uma ponte entre regiões da cidade que não se ligam diretamente. Como é o caso de Maria Emília, moradora de Uvaranas e cozinheira de uma escola pública na região da Santa Lúcia.

 

“Falta uma linha direta entre os bairros. É muito desgastante fazer esse caminho diário”, comenta. No mapa, retirado do Google Maps, é possível identificar a disposição geográfica dos terminais e identificar o motivo da reclamação de Maria Emília.

 

image2]

 

No Nova Rússia, as situações relatadas não diferem muito. O Terminal o segundo mais movimentado da cidade. Isso se deve, pois, além da região do Nova Rússia, ele atende os ônibus das zonas norte (Jardim Carvalho) e sul (Santa. Paula)  da cidade, que não possuem terminais próprios.

 

image1

image4

 

Importante perceber que o movimento que leva mais de dois terços dos entrevistados neste terminal a pegar condução, está ligado à oferta de empregos e de serviços em outros lugares, principalmente em regiões mais centrais. Ou seja, nem este, que é um dos pontos mais movimentados de Ponta Grossa, conseguiu escapar do afunilamento.

 

image5

 

 

Enquanto no Terminal Central o problema mais relatado foi o de lotação dentro dos veículos, na Nova Rússia ouviu-se muito sobre atraso. Isso se deve, como foi apresentado anteriormente, à grande demanda por transporte, em regiões afastadas, que é atendida pelas linhas desse Terminal.

 

José Carlos Biagini é pedreiro e mora no bairro Contorno. O trabalhador comenta que sai às 5h50 da madrugada de casa para pegar o ônibus a tempo, pois a linha que ele pega, onde ele mora, passa poucas vezes durante o dia. “Se eu perder, tenho que esperar o próximo, que passa só às 8h40 da manhã”, reclama. A última viagem para seu bairro é feita às 19h15 e, se perder, precisa andar a pé até em casa, algo que não gosta de fazer por conta da violência no caminho.

 

Passe livre

 No dia 21 de agosto, um grupo de seis estudantes da UEPG foi à sessão da Câmara de Vereadores apresentar um documento pedindo revisão da política de passe livre estudantil e preços mais adequados.Após a leitura da carta pelo acadêmico de História Gabriel Divardim, o vereador Florenal (PTN) reforçou a demanda por uma linha que conecte o Campus Uvaranas da Universidade direto ao Centro.

 

Divardim, que é membro da antiga chapa do Diretório Central Estudantil (DCE), relata que, em muitos casos, os problemas relativos ao transporte público em Ponta Grossa desestimulam alunos a irem à aula, chegando ao ponto de eles desistirem dos cursos. “Eu moro na Vila Estrela. Preciso pegar três ônibus até o Campus. Muitas vezes, o ônibus se atrasa e eu acabo perdendo aula e o horário do RU [Restaurante Universitário]”, relata o estudante.