De acordo com pesquisa realizada pela União Brasileira de Compositores, pandemia causou perda integral de renda em 30% dos profissionais da música no Brasil

O período da pandemia tem sido difícil para a classe musical. Com o cancelamento de shows e o fechamento de bares e restaurantes, diversos músicos precisaram se reinventar e sofreram gravemente com a perda de renda. É o que expõe a pesquisa da União Brasileira dos Compositores (UBC) em parceria com a Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). De acordo com o estudo, 86% dos profissionais da música alegam terem sofrido com diminuição da renda mensal, enquanto 30% dos entrevistados perderam completamente a renda no período.


Em Ponta Grossa, a dificuldade enfrentada pela classe musical não foi diferente. Com a necessidade de buscar formas para continuar sobrevivendo da música mesmo durante a pandemia, alguns artistas ponta-grossenses se adequaram as lives transmitidas pela internet para tentar angariar recursos. Porém, os profissionais da música sofreram com outro problema: A tentativa de exploração por parte dos estabelecimentos. Na busca por espaços para realizar as lives, os músicos recorreram aos bares e restaurantes que pudessem ceder o local para a transmissão dos “shows virtuais”. Entretanto, alguns estabelecimentos da cidade de Ponta Grossa passaram a cobrar para ceder o espaço aos músicos. É o que conta Erick Conche, cantor e musicista que já passou por mais de 10 bandas do cenário local. “No começo da pandemia havia uma febre de fazer lives, até por ser uma forma de dar continuidade nas apresentações. Então decidimos ir atrás de um estabelecimento que já havia cedido o espaço para outras bandas, mas o dono do local cobrou um valor de 400 reais, algo que ficaria inviável”, relata Erick.


Além dos 400 reais pela utilização do espaço do estabelecimento, a banda de Erick teria que desembolsar mais 200 reais para pagar a equipe de filmagem e de transmissão. Por conta do custo de 600 reais para realizar a live, o músico optou por desistir da ideia. “Para quem vive da música como ganha pão, as lives eram uma maneira de tentar arrecadar algum dinheiro. Foi uma situação bem chata, pois ficou mais caro que o valor que nós poderíamos ganhar com a transmissão, então fazer a live não rolou por conta disso”, explica o músico.
Sem conseguir se apresentar em shows e preferindo não se expor ao vírus em apresentações em bares e restaurantes, Erick viu a necessidade de conseguir uma segunda fonte de renda durante a pandemia. Em julho, o músico, que também é estudante de Engenharia da Computação na UEPG, conseguiu estágio na área em que estuda. “Até um determinado momento da pandemia eu consegui me manter com o dinheiro do cachê que recebi antes da pandemia, mas como eu estava pagando parcelas de equipamentos e instrumentos novos que eu comprei antes de março, chegou uma hora que precisei ir atrás de estágio e estou estagiando na área desde então”.


No começo de setembro deste ano, o Prefeito Marcelo Rangel anunciou que Ponta Grossa receberia um auxílio de mais de 2 milhões de reais do Governo Federal. Trata-se de um recurso originário da Lei Aldir Blanc, que tem por finalidade ajudar artistas de todo o país durante a pandemia com cinco parcelas de 600 reais por mês. Dessa maneira, alguns músicos que fizeram o cadastro pela internet foram contemplados. Erick soube da oportunidade por acaso e conseguiu entrar na lista dos artistas locais que estão recebendo o auxílio. “Eu estava no site da Prefeitura procurando uma outra informação e encontrei o edital sem querer. Fiz o cadastro e agora a primeira parcela já foi depositada na primeira semana de dezembro. É um dinheiro que vai salvar e vai ajudar a dar continuidade nos projetos que temos para o ano que vem”, relata Erick.


Outro músico conhecido no cenário artístico ponta-grossense é Allan Lutierre, que atua de maneira solo e também com as bandas Samba Trio e Grupo Pela Hora. Para Lutierre, mesmo com a volta gradativa das apresentações em bares e restaurantes, a dificuldade ainda permanece. “Foi muito complicado. Eu vivia só de música e do dia para a noite eu perdi uma renda que não saberia quando voltaria a ter e na verdade ainda não sei.”, relata o sambista.
Com o decorrer dos meses, Luttierre teve a sorte de ser chamado para um concurso público na área de zeladoria das Unidades Básicas de Saúde e desde então essa tem sido a renda principal do artista. “No final de julho passei a trabalhar registrado. Fiz um concurso da Prefeitura em 2018 e por conta da pandemia, muitas pessoas foram afastadas, por ser uma área de risco e envolver muitas pessoas de idade. Então com o afastamento de muitos profissionais acabei sendo chamado e desde então isso tem me ajudado muito”, conta Luttierre.
Com o trabalho em um novo emprego, Luttierre preferiu não se cadastrar para receber o auxílio da Lei Aldir Blanc. “Vários amigos meus conseguiram esse auxílio. Esse valor vai ajudar muito na renda familiar deles, mas eu não me cadastrei para não tomar o lugar de outro que precise mais. Não que eu não precisasse, mas achei melhor dar o espaço para alguém que está dependendo 100% da música neste momento.”, explica o músico.


De acordo com Eduardo Godoy, diretor da Fundação Municipal de Cultura de Ponta Grossa, não existe um estudo ou alguma pesquisa que consiga mensurar o quanto os músicos ponta-grossenses foram atingidos pela pandemia nos mesmos moldes da pesquisa da UBC e da ESPM. Porém, o diretor afirma que 261 agentes culturais da cidade têm recebido o auxílio de 600 reais por mês.


Mesmo com o auxílio sendo depositado, ambos os músicos sabem que a volta a uma realidade “normal”, ainda está muito longe de acontecer. Por isso, eles receiam que os bares e restaurantes voltem a fechar num futuro próximo. Para Erick, é necessário “equilíbrio” neste momento em que os casos sobem, mas ao mesmo tempo o fechamento completo não pode acontecer, pois isso voltaria a prejudicar a classe musical da cidade. Já para Luttierre, a sociedade precisa de “empatia” para se colocar no lugar dos músicos e entender o lado desses profissionais.

Confira a reportagem de Marcus Benedetti:


Ficha técnica

Repórter: Marcus Benedetti

Edição: Marcus Benedetti

Supervisão: Angela Aguiar, Jeferson Bertolini, Vinicius Biazotti e Cíntia Xavier

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