Pesquisa indica que maioria já foi alvo ou presenciou problema 

 

SEGUNDA VERSAO INFOGRAFICO VALERIA mulheres engenharia

 

“Já ouvi de um professor que eu seria melhor lavando as cuecas dele do que cursando a sua matéria”. “Escutei de meus colegas que só passei em uma disciplina porque sou bonita”. “Para meu professor, bom mesmo era quando só homem cursava engenharia”. Estes são relatos de estudantes de Engenharias em Ponta Grossa. Elas preferem não ser identificadas.

Uma pesquisa feita pela reportagem com 58 acadêmicas dos cursos de engenharias de universidades da cidade mostra que 62,9% delas já se sentiram intimidadas, excluídas e desconfortáveis por serem mulheres ou presenciaram alguma situação desagradável vivida por uma colega do curso. 

As engenheiras em formação reclamam principalmente da dificuldade de validação das opiniões e do questionamento frequente do profissionalismo.

Para Lara Wasilevski, estudante do 3° período de Engenharia de Materiais, ter senso de profissionalismo dentro do curso é uma tarefa difícil e por muitas vezes desanimadora. “Não é fácil sentir na pele que alguém acima de você na hierarquia não ouve suas ideias só por ser mulher”, desabafa. 

 

Especialista

 

De acordo com Maria Rosa Lombardi, pós-doutora em Ciências Sociais com enfoque em Gênero e Trabalho e pesquisadora da Fundação Carlos Chagas, a naturalização dos comportamentos machistas de colegas de classe e professores como “característica” do perfil da engenharia é um dos principais fatores que levam as estudantes a criarem mecanismos de defesa para serem aceitas e respeitadas. 

Para a pesquisadora, as mulheres inseridas em núcleos mais masculinos como a Engenharia Mecânica e a Civil criam uma espécie de barreira para a proteção de si mesmas nestes ambientes ainda na faculdade. “Desde o início da formação elas precisam ser fortes, resistir à rudeza e ao assédio moral que impera nestes locais. Muitas vezes o fazem adotando comportamentos estereotipados masculinos, falando alto por exemplo”, explica Lombardi. 

A menção de Maria Rosa vai ao encontro do relato de Mariana Moiada, aluna do 10° período de Engenharia Mecânica. A estudante diz que, por conta das situações e piadas desagradáveis durante o curso, precisou desenvolver uma postura rígida para reprimir atitudes machistas dos colegas. “Ainda que eu tenha desenvolvido mecanismos de defesa, sinto que não sofro muito assédio por ter muitos amigos homens, infelizmente homem só tem medo de homem”, comenta. 

 

Participação

 

A falta de participação feminina nos cursos dificulta a criação de uma rede de proteção maior entre as estudantes. Conforme a pesquisa feita pela reportagem, 28,57% das acadêmicas não se sentem confortáveis ou têm medo de relatar os episódios de assédio moral. Como consequência, fatores importantes de mudança, como a denúncia, o informe à coordenação dos cursos e o comunicado às universidades são fragilizados. 

De acordo com Paula Melani, doutora em Ciências Sociais, o primeiro passo para eliminar o medo institucionalizado da denúncia é tomar consciência dela em todos os setores da sociedade. “Só tratamos uma ferida quando reconhecemos sua existência, por isso a necessidade de frentes de políticas públicas para romper esses valores e tratar nossos ferimentos”, diz Paula.

Iniciativas acadêmicas voltadas à promoção da mulher nas engenharias são frentes de mudança importantes dentro do ambiente universitário. O Coletivo Marie Curie e o Projeto de Extensão Mulheres na Engenharia da UTFPR são exemplos de práticas que colaboram com esse objetivo. Contudo, para Mariana Moia, deveria haver mais incentivo na fase escolar. “Se as engenheiras e estudantes em formação dessem palestras nas escolas, as meninas se sentiriam apoiadas para seguir a profissão, crescemos acreditando que é uma área masculina”, reitera. Na opinião de Paula Melani as modificações devem atingir o âmbito político também, escolhendo representantes que reconhecem as desigualdades de gênero e defendem políticas públicas em prol da igualdade.

 

Este texto é parte do conteúdo da edição recém-publicada do jornal-laboratório Foca Livre, produzido pelo 2º ano de Jornalismo da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Acesse a edição completa em https://periodico.sites.uepg.br/index.php/foca-livre

 

Ficha técnica: 

Repórter: Valéria Laroca

Editor de Texto: Prof. Muriel Amaral e Lilian Magalhães

Publicação: Levi de Brito 

Supervisão Foca Livre: Rafael Kondlatsch e Jeferson Bertolini

Supervisão Site Periódico: Marcos Zibordi, Maurício Liesen