Ausência de políticas públicas prejudica saúde de pessoas em situação de rua

 

Campanhas de vacinação não contemplam essa população que fica mais suscetível a doenças

 

Até o fim deste ano, a Fundação Municipal de Saúde (FMS) imunizou cerca de 280 mil pessoas em Ponta Grossa, com a primeira dose da vacina da covid-19. Nesta estatística, divulgada pela Secretaria de Saúde do Estado do Paraná (SESP/PR), está inclusa a população geral, indígenas e quilombolas. Porém, não há dados relacionados à população de rua. No município, essas pessoas não são público-alvo em campanhas de vacinação devido à ausência de políticas públicas.

Segundo dados da Fundação de Assistência Social de Ponta Grossa (FASPG), no período de janeiro a setembro deste ano, o município contava com 144 pessoas em situação de rua inclusas no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico). Mas esse número pode ser maior, uma vez que nem todas as pessoas realizam os cadastros. Em conversa com algumas delas na praça Barão do Rio Branco, centro da cidade, a reportagem averiguou que houve a imunização com apenas uma dose da vacina porque a pessoa entrevistada procurou uma unidade de saúde (UBS) para se vacinar. Todavia, não houve nenhuma ação municipal para realizar a imunização.

A situação de pessoas em condição de rua é precária, sendo que algumas delas não sabem como proceder em caso de doenças ou imunização. Sérgio, que não lembra do seu sobrenome, vaga pelas praças da cidade há mais de 10 anos e conta que em 2020 não entendia o porquê das pessoas usarem máscara no rosto. “Depois de meses eu fiquei sabendo que um vírus estava circulando por aí e as pessoas precisavam ficar trancadas em casa porque o vírus era perigoso. Fiquei pensando em nós [pessoas em situação de rua] que nem casa temos”, desabafa.

Mara Costa Ferreira soube da pandemia e para se proteger, quis tomar a vacina, mas não conseguiu por conta dos agendamentos que eram feitos exclusivamente pela internet. Apenas esse ano, com os mutirões da vacina, ela conseguiu se vacinar. Mara foi à Unidade de Pronto-atendimento (UPA) Santana com a intenção de tomar uma dose do imunizante, porém, foi instruída por uma enfermeira para ir até o Ônibus da Vacina, que circula em determinados pontos do centro, onde profissionais da saúde estavam aplicando as doses. Segundo ela, a aplicação da vacina foi constrangedora e com empecilhos desde o momento em que estava esperando para ser atendida. “As pessoas na fila me olhavam como se eu fosse um bicho. Quando chegou a minha vez, eu fiquei esperando mais um tempo porque a moça (enfermeira) não sabia se podia aplicar a vacina em mim só porque eu era moradora de rua e não tinha documentos”, relata. 

 

VACINAÇÃO Luiz Zak

Apenas pessoas em situação de rua que procuraram espontaneamente por uma Unidade Básica de Sáude ou Ônibus da Vacina foram vacinadas | Foto: Luiz Zak

 

Com a falta de campanhas de conscientização durante o período de vacinação para esse público, algumas pessoas não se vacinaram porque não sabiam dos cuidados que precisavam tomar para se proteger. Como é o caso de Zeca Rodrigues, 34 anos, que não tomou nenhuma dose contra a covid-19 e não lembra da última vez que se vacinou contra outras doenças. “Eu tenho medo de tomar essa vacina porque acho que pode ser para o mal. Não me preocupo muito com o vírus. De todas as preocupações que tenho na vida, pegar doença é o menor dos males”, conta. Rodrigues ainda desabafa que se sente excluído não somente pelos órgãos públicos, mas por toda a sociedade, que enxerga a população de rua com desprezo. “Para a maioria das pessoas, nós somos o refugo da sociedade, seres descartáveis que podem ser tratadas de qualquer maneira, mas ainda que com problemas e dificuldades nós somos seres humanos”, encerra. 

A reportagem procurou a FMS por meio da assessoria de imprensa para questionar sobre os dados da vacinação para as pessoas em situação de rua. Porém, até o momento da produção desta matéria, a entidade não se manifestou para explicar se esta população foi assistida para ser imunizada contra a covid-19. 

 

Ficha técnica:

Reportagem: Maria Eduarda Ribeiro

Edição e publicação: Kadu Mendes

Supervisão de produção: Muriel E. P. de Amaral

Supervisão de publicação: Candida de Oliveira e Marcelo Bronosky

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