Questões legais, ambientais e religiosas são determinantes na escolha para cremação

A prática da cremação de cadáveres é um processo milenar, que surgiu nas civilizações grega e romana, como forma nobre de destino após a morte. Nessa técnica, o corpo é submetido a temperaturas entre 900 a 1300 graus celsius em câmaras crematórias, a fim de ser reduzido em cinzas. No Brasil, até meados dos anos 1990, apenas um crematório, em São Paulo, estava em atividade. Em 2020, segundo o Sindicato dos Cemitérios e Crematórios Particulares do Brasil (Sincep), o país contava com 132 crematórios registrados e 70 em funcionamento. 

 

LAURA URBANO 04 FORNO CREMATÓRIO PODE CHEGAR ATÉ 1300 GRAUS CELSIUS

Forno crematório pode chegar até 1300 graus celsius | Foto: Laura Urbano

 

O Paraná acompanhou o crescimento do rito fúnebre. No início dos anos 2000, apenas duas empresas na Região Metropolitana de Curitiba (RMC) faziam o procedimento. Em 2023, treze crematórios estão em atividade, sendo seis na RMC, e os demais no interior do estado. Ponta Grossa, mesmo com quase 400 mil habitantes, conta com apenas uma opção de crematório: o Cemitério e Crematório Parque Campos Gerais. Segundo o proprietário Ricardo Lievore, a procura pela cremação na região ainda é baixa. “Em Ponta Grossa acontecem em média 300 óbitos por mês, cerca de 10 por dia. Nós fazemos aproximadamente 7 cremações por mês.”, explica. 

 

Questões legais da cremação 

A Legislação Brasileira determina que, em casos de morte violenta, como suicídio, acidente de trânsito e homicídio doloso ou culposo, a cremação é vedada ou só pode ser realizada mediante autorização judicial. Ricardo explica que os crematórios devem manter unidades de conservação dos corpos, com temperaturas entre 0 graus a 10 graus negativos. “Nós precisamos manter os corpos armazenados por 24h, em casos de óbitos violentos. Nestas situações, os corpos podem passar por perícia. Além de que nós respeitamos a religião espírita que recomenda esperar 72h do óbito para que o corpo seja cremado”, explica. 

 

LAURA URBANO 06 SALA CREMATÓRIA É COMPOSTA POR CÂMARA FRIA E FORNO CREMATÓRIO

Sala crematória é composta por câmara fria e forno crematório | Foto: Laura Urbano

 

A burocracia por trás do procedimento envolve a apresentação de atestado de óbito assinado por dois médicos, autorização de cremação assinada por um parente de grau direto (cônjuges, pais, avós, filhos, netos e irmãos) e duas testemunhas, além de documentos pessoais do falecido. Nos casos em que a pessoa a ser cremada não tenha parentes diretos, deve ser requisitada por parentes do segundo grau uma autorização judicial para a cremação. 

 

Relações entre a cremação e o meio ambiente

O engenheiro ambiental e mestre em engenharia sanitária, Rhuan Felipe Jeranoski, conta que em Ponta Grossa, os cemitérios públicos foram construídos há mais de um século. Na época, as preocupações com o meio ambiente eram mínimas por parte da sociedade e o poder público não estabelecia determinações legais sobre as condições ideais estruturais e ambientais para a instalação de túmulos. 

Rhuan explica que a estrutura dos cemitérios, sem licenciamento ambiental correto, afeta diretamente o meio ambiente. “Esses cemitérios são fontes poluidoras por serem construídos sem qualquer preocupação com a drenagem superficial das águas das chuvas e sem o revestimento das camadas inferiores do solo para retenção de fluídos de necrochorume, liberados na decomposição dos corpos”, detalha.

ILUSTRAÇÃO DUNCAN URBAN 02 PROCESSO DE SEPULTAMENTO NOS CEMITÉRIOS CONVENCIONAIS EMITEM NECROCHORUME EM AQUÍFEROS

Processo de sepultamento nos cemitérios convencionais emitem necrochorume em aquífero | Ilustração: Duncan Urban

 

Para Jeranoski, além da questão ambiental, a liberação do necrochorume, dos corpos sepultados em cemitérios convencionais, é uma questão de saúde pública. “A contaminação do lençol freático pelo necrochorume pode trazer consequências adversas à saúde pública pela grande presença de vírus e bactérias causadoras de doenças, principalmente em locais que a água subterrânea, proveniente de poços rasos e cisternas, seja fonte de abastecimento de água para a população”, ele explica.

Um estudo realizado pela Associação Nacional dos Diretores Funerários dos Estados Unidos revela que a preocupação com o meio ambiente vem aumentando a procura por planos de cremação, um procedimento ecologicamente correto. Jeranoski explica que mesmo indo de encontro com normas ambientais, esse método também pode causar impactos para o meio ambiente, como a emissão de partículas, devido à incineração, na atmosfera e, em algumas situações, o consumo elevado de energia elétrica. 

Ainda assim, a cremação segue sendo uma alternativa menos prejudicial ao meio ambiente em relação ao sepultamento em cemitérios convencionais. “Na cremação não ocorre a geração de necrochorume e não requer espaço físico extenso, gerando economia de área, especialmente em meio urbanos onde o espaço é limitado”, conclui Rhuan.

 

Alternativas de destino para as cinzas

O destino das cinzas é uma preocupação para familiares e amigos do ente querido que partiu. A escolha da família e crença em determinada religião é fundamental para o armazenamento. Nos casos em que a decisão seja mantê-las  armazenadas, as urnas cinerárias podem ser colocadas em espaços destinados à elas, como os columbários, um memorial, ou ainda, em pequenos espaços em túmulos e jazigos. 

Outras alternativas são: confecção de acessórios com pequena quantidade de cinzas; urnas feitas de materiais biodegradáveis que, ao serem plantadas, tornam-se árvores; manter no lar da família do falecido ou espalhar as cinzas por lugares que foram significativos durante a vida da pessoa que partiu. 

Em Ponta Grossa, caso o desejo seja o armazenamento em jazigos familiares, nos cemitérios públicos, o Serviço Funerário determina que seja solicitada uma guia, no valor de 55 reais, para a abertura das gavetas ossuárias dos túmulos. No momento da solicitação deve ser apresentada a documentação de propriedade dos túmulos ou declaração de permissão de abertura, assinada pelos proprietários. 

O subsolo da Catedral Sant’Ana de Ponta Grossa conta com a estrutura da cripta, local destinado a armazenar os ossos de pessoas falecidas há mais de cinco anos ou urnas cinerárias. A edificação, mantida pelo Cemitério Parque Jardim Paraíso, abriga 8858 lóculos e, atualmente, menos de mil espaços estão ocupados. Os lóculos vazios estão disponíveis para compra no valor de 1500 reais e pagamento de taxa anual de 130 reais, destinada à manutenção, válida para 2024. Enquanto que, no mesmo cemitério, um jazigo está sendo vendido por 5700 reais, além da taxa anual de 350 reais. O espaço da cripta também abriga os túmulos dos dois primeiros bispos de Ponta Grossa, Dom Antônio Mazarotto e Dom Geraldo Micheletto Pellanda. 

 

LAURA URBANO 02 CRIPTA NA CATEDRAL SANT ANA CONTA COM 8858 LÓCULOS

Cripta na Catedral Sant'Ana conta com 8858 lóculos | Foto: Laura Urbano

 

A estrutura do Cemitério e Crematório Parque Campos Gerais, além de disponibilizar salas para velórios, copa e salas de descanso, mantém o columbário, como forma de memorial aos falecidos. As cinzas são guardadas em gavetas com portas de vidro, de maneira que possibilite à família guardar a urna cinerária, objetos, cartas, fotografias e lembranças da pessoa que faleceu. O espaço no columbário pode ser locado, anualmente, por 650 reais. 

 

Valores da cremação e de sepultamentos convencionais

O Crematório Parque Campos Gerais, único crematório de Ponta Grossa, está em atividade desde 2014 e, em média, realiza sete cremações ao mês. Segundo a tabela de valores do crematório, o procedimento, que conta com cremação, aluguel da câmara fria e locação do columbário por um ano, custa, aproximadamente, cinco mil e quinhentos reais. O crematório disponibiliza planos funerários que facilitam as formas de pagamentos. Em relação ao sepultamento no Cemitério Parque Campos Gerais, apenas a compra de jazigo custa entre sete mil e oitocentos reais até nove mil reais. Estes valores desconsideram procedimentos de preparação do corpo, caixão e salas de velório, além de que, em casos de planos funerários, os valores podem apresentar variação. 

ILUSTRAÇÃO DUNCAN URBAN 01 CICLO DA CREMAÇÃO É COMPOSTO POR ARMAZENAGEM EM CÂMARA FRIA INCINERAÇÃO DO CORPO E ARMAZENAGEM EM URNAS CINERÁRIAS

Ciclo da cremação é composto por armazenagem em câmara fria, incineração do corpo e armazenagem em urnas cinerárias | Ilustração: Duncan Urban

 

Ficha Técnica:

Produção: Laura Urbano

Edição: Joyce Clara e Iolanda Lima

Publicação: Radmila Baranoski e Lucas Veloso

Supervisão de produção: Carlos Alberto de Souza

Supervisão de publicação: Luiza Carolina dos Santos e Cândida de Oliveira

Adicionar comentário

Registre-se no site, para que seus comentários sejam publicados imediatamente. Sem o registro, seus comentários precisarão ser aprovados pela administração do Periódico.