Em meio à pandemia, movimentos antivacinas persistem nas redes sociais

Perfis que veiculam informações contra a vacinação chegam a 14 mil membros

Em meio à pandemia do Covid-19, juntamente com o recordes de mortes diárias e média móvel dos casos, o Brasil ainda apresenta movimentos antivacinas nas redes sociais. Em uma busca rápida pelo Facebook, rede social considerada hoje um dos polos destes movimentos negacionistas da imunização, periculosidade do vírus e distanciamento social, foram encontradas pelo menos cinco espaços destinados apenas para questionar a necessidade de vacinação. O maior deles, a página denominada “O Lado Obscuro das Vacinas” continha cerca de 3 mil e 300 curtidas e um grupo com mais de 14 mil membros.

 

Para especialistas, vacina é a forma mais eficaz de conter a pandemia. Foto: Emanuelle Benício

A página que chega a mais de três mil curtidas, possui postagens destinadas a questionar a vacinação. A média de curtidas dos posts é baixa, se comparada com o número de seguidores. Nas ultimas cinco postagens, o número de curtidas não passa de 100. A média de interações fica entre 10 e 30 publicações. Os conteúdos são em maioria informações falsas, ou fatos retirados de contexto. Encontra-se na página, post do último dia nove de fevereiro, prints com mensagens recebidas nos Whatsapp e Instagram (ambas redes sociais do mesmo dono do Facebook) com supostas mortes e reações negativas com as vacinas do Covid-19.

Na página também é possível visualizar os “memes”, frequentemente usados e publicados na internet, banalizando a imunização e a recomendação por partes das autoridades públicas e de saúde para que a população se vacine.

Dentro da página também existe uma publicação, com uma chamada para um grupo público. O grupo possui o mesmo nome da página, “O Lado Obscuro das Vacinas”, e é encontrado dentro da rede social e aberto para qualquer um entrar e aderir. O total de membros de acordo com a contagem fornecida pela rede social e de 14 mil membros. Nas postagens e discussões, visualiza-se postagens dos membros com links de notícias sobre as vacinas (geralmente fora de contexto) com conteúdos apontando mortes por conta da imunização. As maiorias dos portais são de caráter duvidosos, com posts sem informações confirmadas, e matérias com conteúdos duvidosos. Além dessas notícias, também aparecem declarações dos membros zombando da origem das vacinas, utilizando motivações xenofóbicas, como um membro que postou “Pergunta sincera: As variantes do vírus chinês surgiram antes ou depois da vachina?” Postou um membro do grupo.

Ele utilizou o termo “vachina”, com o objetivo de zombar com uma das vacinas produzidas pelo Instituto Butantã, da Universidade de São Paulo(USP), a CoronaVac. A vacina foi produzida pelo Instituto em parceria com uma Farmaceútica chinesa Sinovac. Memes, postagens com conteúdos alarmistas sobre reações colaterais da vacina, são frequentemente postadas no grupo com pouco mais de 14 mil membros.

Outra página com um número considerável de adeptos ao movimento negacionista da vacinação, é o Movimento Contra Vacina no Brasil – MCV . O perfil possui mais de 1.100 curtidas. Com caráter mais agressivo contra as medidas de segurança definidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), como uso de máscaras, distanciamento social e a vacinação, o perfil utiliza frases de teor conspiracionista, ou seja, com teorias sem fundamentos acerca das medidas de segurança recomendadas para combater a pandemia. No dia sete de março, a página publicou a frase “Lockdown, Vírus, V4c1na (o número 4 foi remetido a letra ‘A’, e o 1 a letra ‘I’, utilizado frequentemente na internet para frases com irônia) Máscara.. Faz parte de um projeto social que durará até 2025, povo que NÃO entendeu ainda”. Outro post feito pela página foi no quatro de Março, foi que “Ficar em casa é se acovardar! Sim, já estamos articulando manifestações no centro de Curitiba. Aguardem!”. Também são compartilhados na página vídeos, imagens, prints de whatsapp e conteúdos não confirmados e retirados de contexto.

De acordo com a professora do Departamento de Enfermagem da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Jacy Aurélia Vieira de Souza, essa é situação preocupante pois acredita que a vacina é nossa maior esperança. “A vacinação, sem dúvida, é a principal esperança para conter a disseminação do novo Coronavírus. À medida que aumente o número de vacinados, o vírus tende a circular menos, reduzindo transmissões e infecções.” A professora ainda afirma que a vacinação é um dos recursos mais potentes da saúde pública, e o que mais impactou positivamente no controle de diversas doenças, melhoria na qualidade de vida e aumento da expectativa de vida da população. “Dito isso, deve-se lembrar de que vacinar é um pacto coletivo, ou seja, além da proteção individual. Para além do risco individual em não se vacinar, temos o risco do reaparecimento de doenças já controladas, como foi o caso do sarampo” relembra a professora.


Fake News: Uma aliada ao negacionismo

Segundo Wasim Aluisio Prates Syed, membro do grupo de combate a desinformação e em defesa da imunização, União Pró Vacina da USP, aponta que “Os usuários desses perfis expõe a desinformação clara, enganando com a falsa premissa de que toda opinião e posição é válida quanto o consenso científico.” O membro do grupo completa que a permanência destes perfis nas redes sociais como o Facebook, mostram duas possibilidades: ou essas redes têm desinformação, ou são coniventes por interesses financeiras. “Conspirações são altamente viralizáveis e promovem muito engajamento, fatores interessantes pros algoritmos sociais” completa Syed.

O membro do grupo, que é ativo nas redes sociais com checagem de notícias falsas e compartilha informações reais sobre esse debate, acredita que combater essas notícias falsas que circulam sobre a vacina é um trabalho com muitos atores. “A imprensa deve fazer uma comunicação clara, com agências de checagem cada vez mais promovidas, e os cientistas e universidades devem se empenhas ainda mais em comunicar e educar a população” opina Syed. As notícias falsas e a desinformação são armas utilizadas frequentemente por adeptos ao movimento de negação da vacina e da ciência.

Pesquisadora em Comunicação Política e graduada em Jornalismo pela UEPG, Camilla Tavares explica que esse movimento antivacina já permeia em alguns anos aqui no Brasil. “O movimento antivacina, embora tenha voltado com a questão do Covid-19, ele surgiu na década de 90. Ele surge em uma desconfiança de um estudo científico na época, associando o autismo a um determinado tipo de vacina”. A pesquisadora completa que com as redes sociais, essa realidade se potencializou e virou um fator preocupante.

Tavares toca em um ponto que atrela os movimentos de negação da vacina e da ciência, com o contexto político. Tivemos desde o início da pandemia, políticos e membros de cargos público liderando movimentos a favor da negação da ciência e dos cientistas. Incluindo o Presidente da República Jair Bolsonaro, que investiu dinheiro público na produção de Cloroquina, por acreditar que o remédio combatia o Covid-19. Porém, nunca foi comprovado cientificamente que a Cloroquina era eficaz contra o vírus. Dentre seus aliados políticos, tivemos outros episódios com fatores que descredibilizaram a ciência. “Existem estudos preliminares fora do país que apontam que a posição da população em virtude da pandemia varia conforme os grupos políticos no poder. Portanto, acredito que esse estudo possa ser trazido para a realidade do Brasil”. Tavares afirma que para que as pessoas entenderem a gravidade dessas negações, e que o país avance positivamente no combate à Pandemia, os políticos e lideranças públicas devem mudar seu discurso e suas ações. “A gente vai conseguir avançar nessa discussão, fazer com que as pessoas entendam a gravidade, quando nossos políticos de fato, principalmente o Executivo, quando deixarem a negação da ciência de lado, e adotar um discurso em prol da ciência”.

De acordo com o relatório antivacina da Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim), feito em parceria com a Avaaz.org, 57% dos que não se vacinaram ou não vacinaram uma criança citam uma razão considerada incorreta pela Sbim e/ou a OMS. Ainda segundo o relatório, 8% dos brasileiros consideram as vacinas inseguras. Destes 8%, 72% viram notícias negativas sobre as vacinas nas redes sociais.

Segundo dados do Programa Nacional do Ministério da Saúde(PNI/MS) , nos últimos dois anos a meta de ter 95% da população alvo-vacinada não foi alcançada. Vacinas importantes, como a tetra-viral, que previne Sarampo, Caxumba, Rubéola e Varícela, teve o menor índice de cobertura: 70,69% em 2017.

Ficha técnica: 

Repórter: Germano Busato

Supervisão: Vinicius Biazotti

Publicação: André Ribeiro