Parceria permite que doentes sejam tratados fora do ambiente hospitalar, evitando possíveis casos de reinfecção da doença
A Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), em conjunto com o Hospital Universitário dos Campos Gerais, deu início às atividades do novo Ambulatório Multiprofissional de Reabilitação. Inaugurado com o intuito de inicialmente atender pacientes recuperados da Covid-19, o espaço auxiliará tanto no combate à pandemia como no tratamento de demais patologias que necessitam de reabilitação. O projeto é considerado pioneiro entre as universidades brasileiras pela união das mais diversas áreas de atuação profissional voltadas para a reabilitação, atrelada ao desenvolvimento de práticas laboratoriais de pesquisa, extensão e ensino.
De acordo com Juliana Schleder, fisioterapeuta e coordenadora do Programa de Residência Multiprofissional em Reabilitação, a realização do ambulatório era um sonho de quase cinco anos. “Eu sempre sonhei em ter um centro que possibilitasse a assistência de qualidade ao paciente, que fosse de forma multidisciplinar, porque a reabilitação só acontece se for de forma multidisciplinar, e que agregasse também a formação de novos profissionais”, relata.
A respeito do surgimento da parceria entre o Hospital Universitário e a universidade, Juliana informa que o ambulatório já existia, mas somente em âmbito acadêmico. Mas com a chegada da pandemia, a equipe de residência percebeu a necessidade de fornecer o serviço multiprofissional para os pacientes com sequelas da Covid-19. “A gente tinha esse ambulatório acadêmico no quinto andar do hospital. Porém, o quinto andar foi destinado à Covid-19. E como a gente levaria pacientes que estão se recuperando [da Covid-19] para dentro de um ambiente contaminado? Não tinha como”, explica. A disponibilização do laboratório de avaliação física da universidade ocorreu através do Setor de Ciências Biológicas e Saúde (Sebisa), do qual faz parte o Departamento de Educação Física da UEPG. A implementação de profissionais formados que atuam no hospital atendendo no espaço foi outro ponto que selou a parceria.
Atualmente, atendem no ambulatório as equipes da Residência Multiprofissional de Saúde do Hospital Universitário, bem como fisioterapeutas, nutricionistas, educadores físicos, psicólogos, assistentes sociais, fonoaudiólogos, pesquisadores, professores e alunos da graduação e pós-graduação da UEPG. Para o psicólogo e integrante da equipe do ambulatório, Hélcio Santos, a criação de novos espaços para atender a população era uma medida urgente. “Existe muito pouco investimento na saúde municipal fora do âmbito hospitalar. Essa doença está deixando marcas urgentes de serem cuidadas. E não é só no hospital que esse cuidado precisa acontecer, é fora dele também”.
Recuperação fora do ambiente hospitalar
O novo ambulatório possibilita que a recuperação de pacientes com sequelas da Covid-19 seja feita fora do ambiente hospitalar, o que garante maior segurança ao paciente ao evitar o contato com aqueles que seguem internados. Hélcio acredita que o espaço fora do hospital é benéfico para o processo de reabilitação dos pacientes. “A gente sabe que a instituição hospitalar traz muitas lembranças e vivências. Foi no hospital que o paciente teve a expressão da doença na sua forma mais grave, então ter esse outro espaço possibilita que o paciente fale sobre questões da internação de uma forma mais distante”. Ele também explica que, após o primeiro ano de pandemia, a conclusão é que a preocupação principal do psicólogo é com o depois da recuperação do paciente. “A gente já passou pela doença. Agora a gente vai lidar com o que a doença deixou, e isso geralmente não é muito fácil para os pacientes pelas perdas, mudanças e sequelas.”
O nutricionista Wagner Kloster, que também atua no ambulatório, relata que seu trabalho antes era restrito ao período de internamento do paciente. Ele destaca que, no novo espaço, o trabalho da equipe é focado em dar continuidade ao que é feito em âmbito hospitalar. No caso da nutrição, o processo ocorre de forma ainda mais direta com o paciente, seja por meio do agendamento da consulta ou do atendimento individual. “Cada paciente é um processo diferente, porque cada um vem com sua história. Ele precisa se reabilitar para a vida novamente. Então é muito gratificante poder dentro da nossa área otimizar que todos os outros processos [de reabilitação] acontecendo com ele sejam benéficos”, explica.
Sobre a rotina no ambulatório, tanto os profissionais de nutrição como de psicologia destacam o caráter individualizado de atendimento ao paciente. No caso da nutrição, Wagner ressalta a importância do aporte nutricional adequado para a realização dos tratamentos que geram gasto energético, como é o caso das atividades físicas e da fisioterapia. “Muitas vezes o paciente pós Covid-19 tem uma grande perda de massa magra e tem inapetência, então ele precisa de uma nutrição equilibrada e forte para ter uma recuperação em todas as áreas dentro do esperado”.
Atividades de reabilitação
No caso das atividades de reabilitação de demais patologias feitas no ambulatório, Juliana destaca que algumas delas já estão sendo aos poucos ofertadas. “Antes da Covid-19 era feita a reabilitação ortopédica, neurológica, cardíaca, pulmonar e tratamento de dor crônica. E com a pandemia tudo foi fechado e esses pacientes ficaram desassistidos. Então com o retorno deste ambulatório os pacientes que realmente precisam já voltaram a receber atendimento.” Já sobre os desafios encontrados, a coordenadora ressalta a dificuldade dos pacientes de transporte até o ambulatório e a limitação de recursos materiais. “A gente ainda não tem todos os equipamentos suficientes para atender os pacientes com a qualidade que a gente queria e que seria um serviço de excelência”, explica. Em decorrência dessa limitação, a equipe precisou delimitar um fluxo de atendimentos destinados apenas aos pacientes que tiveram alta do HU após internação em decorrência da Covid-19. No entanto, segundo Juliana, a demanda atual do ambulatório já vai além dos pacientes do HU: “As pessoas já começaram a fazer procura direta. Inclusive tiveram pacientes com plano de saúde que solicitaram para ser atendidos lá”.
Para Hélcio, a possibilidade de visualizar a prática da psicologia se reinventando através da experiência de reabilitação de pacientes com Covid-19 representa um grande crescimento pessoal e profissional. “Eu espero que demore muito tempo pra gente reativar esse tipo de cuidado e de organização social, mas poder participar desse momento histórico nessa linha de cuidado é uma sensação de gratificação.”
Na visão de Wagner, o trabalho realizado de forma gratuita pelo ambulatório é fundamental, especialmente para a parcela da população que não têm condições socioeconômicas de financiar um tratamento de reabilitação após ter alta do hospital. Ele ressalta que o sentimento é de gratidão em ver seus pacientes recuperados. “Quem venceu essa doença é um guerreiro e merece essa reabilitação, nosso apoio e nosso incentivo. É muito gratificante a gente ver o paciente sorrir com o olhar, ver a alegria desses pacientes, então isso é muito recompensador”, finaliza.
Ficha Técnica:
Repórter: Manuela Roque
Publicação: Denise Martins
Supervisão: Kevin Kossar