Diagnóstico de Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade aumentou na pandemia
Resumo
- Reportagem aborda a vida com TDAH sob a perspectivas de três pessoas diagnosticadas;
- O TDAH é mais comum em crianças e adolescentes e ocorre em 3 a 5% desse grupo;
- Padrões patriarcais dificultam o diagnóstico em mulheres;
- Diagnóstico é feito por profissionais de saúde mental e envolve testes de concentração e memória, além da psicoterapia e análise do histórico familiar e escolar.
O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é um mal neurobiológico que se caracteriza por sintomas como desatenção, inquietude e impulsividade. Ele tem sido bastante discutido nas redes sociais desde o começo da pandemia, quando muitos passaram a ficar mais em casa e tiveram mais tempo para perceber os sintomas. Mas o diagnóstico para o transtorno não é rápido e nem fácil.
O jornalista e fotógrafo Danilo Schleder só foi diagnosticado com TDAH e bipolaridade aos 26 anos. Segundo Schleder, o resultado do seu diagnóstico saiu em torno de 5 meses após sessões de terapia com psicólogo e psiquiatra. “Minha família suspeitava desde sempre, nunca fui uma pessoa muito ligada nas coisas. Meu ensino na universidade e na escola nunca foram normais, sempre fui muito visual.”
O fotógrafo conta que aprendeu a viver com o transtorno. Assim, faz as atividades comuns da maneira como pode. “Eu estudo desenhando, tento aprender as coisas de forma prática.” Ele também gosta bastante de ler, mas tem dificuldades para isso. “Às vezes eu demoro dois dias para ler um livro de 700 páginas, mas posso demorar três meses, depende do meu foco”.
Outra pessoa que convive com o TDAH é a estudante de arquitetura Renata Pereira. Ela foi diagnosticada com o transtorno há dois anos, quando tinha 19 anos. A universitária conta que aos cinco anos de idade uma professora havia alertado seus pais sobre seu desempenho escolar. Renata fazia acompanhamento com uma psicóloga e após um alerta de sua namorada, que também tem TDAH, foi conversar com um psiquiatra. O diagnóstico só saiu depois de três meses, após ela e sua família realizarem um teste para descobrir mais sobre seu comportamento. “Eu tinha muita dificuldade para focar em coisas que não tinha muito interesse, falta de atenção, muito esquecimento também. Isso acaba fazendo você se culpar, achando que é preguiçoso mas na verdade é o déficit na tua cabeça”.
Tratamento do TDAH deve envolver sessões de terapia | Foto: Lilian Magalhães/Foca Livre
Após iniciar a medicação, ela começou a ter mais concentração e menos esquecimentos. A estudante conta que, com a pandemia, o aprendizado caiu muito, tendo muita dificuldade em se habituar com o ensino a distância. “Em casa eu não conseguia focar em nada, ainda mais por estar trabalhando. Eu chegava para ver quatro horas de aula na frente do computador.”
A também estudante de arquitetura Joyce Muzinoski conta que foi diagnosticada há cinco anos, quando tinha 14. Ela fazia terapia e desconfiava que podia ter TDAH. Depois de alguns testes, recebeu o diagnóstico em cinco meses. Ela tinha muita dificuldade em se manter focada, principalmente em atividades escolares. “Depois que eu descobri meu diagnóstico, facilitou a minha vida e as relações que eu tenho à minha volta porque eu consigo explicar para as pessoas o porquê de eu não conseguir me manter tão focada em alguma conversa.”
Joyce conta que ouviu muitas vezes que ela devia se portar como menina, sendo mais quieta. Ela também destaca, assim como Renata Pereira, a dificuldade em se diagnosticar o transtorno em mulheres por conta do padrão que a sociedade impõe.
A estudante teve dificuldade no ensino a distância durante a pandemia, pois em casa é muito fácil perder o foco e deixar as tarefas acumularem. “Eu aprendi nesse tempo algumas coisas na internet para conseguir lidar com o EAD como a tarefa do ‘só’: eu vou só fazer esse trabalho, eu vou só assistir essa aula. Também comecei a trocar de cômodos na casa quando sentia que estava perdendo o foco e usar peças de roupa que me remetiam ao estudo. ”
Especialista
Para o diagnóstico, um paciente com TDAH deve passar por profissionais de saúde mental (psicólogos, psiquiatras, neuropsicólogos e neuropsiquiatras) que irão realizar testes envolvendo atenção, concentração e memória. Também devem realizar a psicoterapia, na qual será analisado o histórico familiar e escolar do paciente junto com seus responsáveis, no caso de crianças e adolescentes. O processo pode levar semanas. As explicações são da psicóloga Heloisa Gonçalves, que tem uma página no Facebook sobre a doença e outros assuntos de psicologia.
Na página, a profissional destaca que o tratamento do TDAH deve envolver sessões de terapia. A medicação e o acompanhamento psiquiátrico devem ser realizados também para que esses sintomas sejam amenizados e não atrapalhem a vida escolar, profissional e pessoal. “O TDAH costuma ser identificado com mais frequência durante os anos do ensino fundamental, pois aí começam a ser vistos os sintomas mais clássicos de falta de atenção, hiperatividade motora, inquietação e impulsividade excessivas. A pessoa também pode ser facilmente distraída por estímulos externos, ter dificuldade para organizar atividades e completá-las, esquecer coisas e afazeres, falar demais, e ter dificuldade para esperar sua vez”.
Heloisa destaca que nem todos os sintomas irão aparecer e que devem ser alvo de preocupação apenas quando estão presentes em dois ou mais ambientes, como casa e escola. O TDAH tem três opções de diagnóstico, uma delas não envolve a percepção da agitação. Sendo assim, não se deve ater ao sintoma de hiperatividade. Ela também nota que o transtorno é mais frequente no sexo masculino, mas quando há em pessoas do sexo feminino, o maior sintoma é a desatenção em tarefas ou brincadeiras, dificuldade de seguir instruções até o fim, esquecimento e sofrimento com esforço mental prolongado.
Associação Brasileira do Déficit de Atenção
Segundo a Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA), o TDAH é mais comum em crianças e adolescentes, e ocorre em 3 a 5% dessas pessoas em várias partes do mundo. São muitas as causas do transtorno: hereditariedade, substâncias ingeridas durante a gestação, sofrimento fetal, exposição a chumbo e problemas familiares.
A ABDA oferece em seu site tabelas de avaliação sobre TDAH para que profissionais possam usar com seus pacientes, além de todas as leis aprovadas e em trâmite com relação ao transtorno.
Ficha técnica
Reportagem: Ana Paula Almeida
Edição: Levi de Brito
Publicação: Matheus Gaston
Supervisão de Produção: Jeferson Bertolini
Supervisão de Publicação: Marcos Zibordi e Maurício Liesen