Ponta Grossa tem queda na cobertura vacinal pelo terceiro ano consecutivo

 

Baixos índices de vacinação podem facilitar a volta de doenças consideradas erradicadas, como  sarampo e poliomielite

 

Resumo:

  • Em 2021 Ponta Grossa não atingiu a meta recomendada pelo Ministério da Saúde em nenhuma das nove vacinas obrigatórias para crianças de até um ano de idade;
  • A Fundação Municipal de Saúde afirma que a queda na cobertura vacinal foi provocada pela pandemia e que deve ser normalizada nos próximos meses;
  • A Secretaria de Estado da Saúde afirma que em 2019, após 20 anos sem registros de sarampo, o Paraná confirmou 1653 casos da doença;
  • Especialistas reiteram a carência de um canal de comunicação que destaque os imunizantes como uma ferramenta de proteção e atue no combate à desinformação.

 

O medo provocado pela pandemia de covid-19 afastou a população das salas de vacinação. Neste ano, em Ponta Grossa, nenhuma das nove vacinas obrigatórias para crianças de até um ano de idade atingiu a meta recomendada pelo Ministério da Saúde, que é de 90% para rotavírus e BCG e de 95% para as outras vacinas. Ponta Grossa já chegou a atingir quase 114% de cobertura geral, em 2015. De lá para cá, esse índice não ultrapassou 85% e segue em queda pelo terceiro ano consecutivo. Há poucos dias do fim do ano, a cobertura vacinal geral na cidade é de 60%, uma das mais baixas desde 2016, quando chegou a 49%, de acordo com dados do Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI) coletados até 13 de dezembro deste ano. A baixa cobertura vacinal acende o alerta para a volta de doenças até então consideradas controladas, como o sarampo e a poliomielite.

Em Ponta Grossa, um dos menores índices é o da segunda dose da tríplice viral, que previne contra o sarampo, caxumba e rubéola. A cobertura da vacina atingiu pouco mais de 22% do público-alvo. Enquanto isso, a primeira dose está próxima de atingir a meta, chegando a 94%. Para completar o ciclo de imunização, a criança deve receber duas doses: uma aos 12 meses e outra aos 15 meses de vida. A segunda dose pode ser substituída pela vacina tetra viral, que também previne contra a varicela. O imunizante, que nunca atingiu a meta recomendada, apresenta a pior cobertura vacinal na cidade, cerca de 17%.

Por meio da assessoria da Prefeitura de Ponta Grossa, a Fundação Municipal de Saúde (FMS) disse que a queda na cobertura vacinal foi provocada pela pandemia e que deve ser normalizada nos próximos meses. Sobre medidas para incentivar a vacinação, a FMS informou que tem orientado a comunidade através dos agentes comunitários de saúde, além de realizar vacinação itinerante e ampliar o número de salas de vacina. O órgão afirmou ainda que não há falta de vacinas nas Unidades Básicas de Saúde. Também foram questionadas quantas ações de vacinação geral foram realizadas em 2021 e se o município pretende promover alguma campanha até o fim do ano, mas a reportagem não obteve resposta até a publicação desta matéria.

 

 

Em 2019, após 20 anos sem registros de sarampo, o Paraná confirmou 1653 casos da doença, segundo a Secretaria de Estado da Saúde. No ano passado, foram 428 diagnósticos. O sarampo é causado por um vírus altamente contagioso e pode provocar febre, tosse, coriza e manchas vermelhas pelo corpo. A transmissão ocorre de uma pessoa para outra por partículas expelidas ao falar, tossir ou espirrar. Em casos mais graves, a doença pode causar pneumonia e encefalite e até mesmo levar à morte. 

Outra doença que preocupa especialistas é a poliomielite, que pode causar paralisia infantil. Em 2021, Ponta Grossa registrou a menor cobertura vacinal da pólio nos últimos 27 anos, cerca de 65%. Um dos reforços da vacina, aplicado aos 4 anos de idade, está entre os piores índices do município, com apenas 40% das crianças vacinadas.

 

Brasil

No Brasil, onde a poliomielite é considerada erradicada, o último caso foi confirmado em 1989. No entanto, a circulação do poliovírus em países como Afeganistão e Paquistão pode provocar o ressurgimento da doença em outros locais. “A cobertura da pólio nunca foi tão baixa nos últimos 20 anos no Brasil. Quando a cobertura vacinal não é atingida, começam a surgir pequenos surtos da doença”, alerta Heloísa Gianberardino, pediatra e presidente da regional paranaense da Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim).

 

 

Assim como o sarampo, a poliomielite também é uma infecção viral altamente contagiosa. Sua transmissão acontece pelo contato direto com infectados ou pela ingestão de água e alimentos contaminados com fezes de portadores do vírus. Os principais sintomas são febre, dor de cabeça, dor no corpo, náusea e rigidez muscular. Em quadros mais graves, pode causar a paralisia de membros inferiores.

De acordo com o artigo 14 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a vacinação infantil é obrigatória nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias. Por mais que seja um direito garantido, Heloísa lembra que alguns pais optam por não vacinar os filhos. “Se o pai e a mãe não querem se vacinar, isso é uma opção do adulto. Mas, a criança não tem essa opção. Não vacinar é um ato de negligência”, explica a pediatra. 

Em caso de descumprimento da lei, os pais ou responsáveis pela criança podem ser penalizados com uma multa que varia de três a vinte salários mínimos, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.

 

Baixa cobertura

A realidade de baixa taxa de imunização a doenças controladas que acontece em Ponta Grossa não é exclusividade do município. No Brasil, a redução constante ocorre desde 2018. Até 13 de dezembro, a cobertura nacional não contemplou nem metade do público-alvo, chegando a 48,3%, patamar muito próximo do que era registrado entre 1995 e 1996. 

 

 

Um dos fatores que derrubou as taxas de vacinação é a circulação de conteúdos falsos nas redes sociais. “As fake news fazem com que as pessoas hesitem em tomar algum tipo de vacina. Esse é o maior problema para a cobertura vacinal”, afirma Leandro Torres, professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e criador do perfil Hora de Vacinar.

Por mais que acreditem na segurança e eficácia das vacinas, algumas pessoas não se imunizam no momento adequado, o que pode facilitar o retorno do sarampo, poliomielite e difteria, segundo especialistas. Com o aprimoramento dos imunizantes, os casos e mortes provocados por determinadas doenças diminuíram expressivamente. Por mais positivo que seja, o controle epidemiológico merece atenção. “As pessoas acham que as doenças não estão ocorrendo e deixam de se vacinar, o que é um grande erro”, ressalta a pediatra Heloísa Gianberardino. “Muitos esquecem que as doenças só foram controladas por causa das vacinas”, destaca Leandro Torres. 

Em alguns casos, a subnotificação da aplicação de doses também pode interferir na cobertura vacinal. Isso acontece quando uma pessoa é vacinada, mas o registro não é incluído no Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunizações e em plataformas municipais e estaduais. Dessa forma, por mais que a vacina tenha sido aplicada, o dado não é contabilizado nas estatísticas de imunização.

 

Incentivo

Diante do cenário de baixa cobertura vacinal, ações que incentivem a população de todas as faixas etárias a atualizar a carteira de vacinação são essenciais. Especialistas reforçam a necessidade de um canal de comunicação que destaque os imunizantes como uma ferramenta de proteção e atue no combate à desinformação. Para Heloísa, não cabe discutir se a vacina é importante ou não. “Ela é um recurso inquestionável. Depois da água tratada, a medida que mais salva vidas é a vacina“, destaca.

Leandro Torres adverte que alguns profissionais de saúde desconhecem as vacinas que uma pessoa deve receber ao longo da vida. “Esse tipo de informação precisa ser comunicada por diferentes especialidades. Seria interessante que, durante um atendimento, o médico, enfermeiro ou auxiliar perguntasse ao paciente se suas vacinas estão em dia”, sugere. 

Os especialistas também defendem que as ações e estratégias de vacinação, seja no âmbito municipal, estadual ou nacional, devem ser orientadas por decisões técnicas. 

 

Serviço

A população de Ponta Grossa pode se vacinar gratuitamente em qualquer uma das vinte Unidades Básicas de Saúde que possuem sala de vacinação: Adam Polan, Alfredo Levandoski, Antero de Mello, Antônio Russo, Carlos Ribeiro, Cleon de Macedo, Cyro Garcia, Egon Roskamp, Jayme Gusmann, José Bueno, José Carlos de Araújo, Julio de Azevedo, Lauro Muller, Lubomir Urban, Luiz Conrado Mansani, Nilton de Castro, Ottoniel Pimentel, Roberto Portela, Rômulo Pazinato e Zilda Arns (clique aqui e confira o endereço de cada UBS).

Os postos de vacinação funcionam de segunda a sexta-feira, das 9h às 16h. 

 

Ficha técnica

Reportagem: Matheus Gaston

Edição e publicação: Levi de Brito

Supervisão de produção: Muriel Amaral

Supervisão de publicação: Marcos Zibordi e Maurício Liesen