Cerca de 11,3 milhões de brasileiras de baixa renda são afetadas diretamente

 

As pessoas que menstruam vivem em média 450 ciclos menstruais durante a vida, mas para parte das mulheres brasileiras, os itens de higiene básica necessários durante esse período estão fora de alcance. Segundo pesquisa realizada pela marca Sempre Livre, quatro em cada 10 pessoas convivem com a pobreza menstrual, sejam elas mesmas ou alguma conhecida. Sobre o ciclo menstrual, 36% dizem não saber bem o que acontece com seu corpo.
De acordo com o relatório Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos, realizados pelo Fundo de População das Nações Unidas e o Fundo das Nações Unidas para a Infância , 713 mil meninas vivem sem acesso a banheiro ou chuveiro em seu domicílio.
Segundo a mesma pesquisa, 900 mil não têm acesso a água canalizada em suas casas e cerca 6,5 milhões vivem em locais sem ligação com a rede de esgoto. O problema é ainda maior considerando o recorte racial: cerca de 24% das meninas brancas residem em locais avaliados como não tendo serviços de esgotamento sanitário, chegando a 37% entre meninas negras.


Os estigmas e a menstruação
Caroline Willing, jornalista e doutoranda com pesquisa sobre o tema “estigmas impregnados na menstruação’’, explica que as problemáticas estão relacionadas ao modo como a sociedade enxerga pessoas que menstruam. “Esse processo de se criarem estigmas envolvendo a menstruação coloca pessoas com útero dentro dessa cultura sexista. Estigmatizar a menstruação é parte desse processo de subalternização, porque a menstruação acomete as pessoas com útero, pessoas que menstruam e desde muito tempo o patriarcado nos colocou como incubadoras humanas’’.
Segundo ela, os estigmas sobre a menstruação vem desde a Bíblia e continuam até os dias atuais, colocando a menstruação como algo sujo. “A mídia tanto tece a cultura como é tecida por ela, é colonialista, misógina e cisheteronormativa, então acaba que a grande mídia está a favor desses estereótipos”.
Caroline critica o essencialismo biológico e a utilização da categoria “mulher’’ quando se fala em pessoas com útero. “Muitas vezes vemos reportagens que colocam meninas que menstruam e ignoram homens trans e não binários. A mídia contribui para a manutenção desse sistema, da mesma forma que ela tem o poder de quebrar esses estereótipos.’’

 

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Quatro em cada 10 mulheres convivem com a pobreza menstrual | Foto: Ana Paula Almeida


A pobreza menstrual e o ambiente escolar
Ainda de acordo com a pesquisa da Sempre Livre, a maioria das pessoas que sofrem com a pobreza menstrual está em idade escolar, pois 40% das pessoas de baixa renda que são afetadas pela pobreza menstrual têm entre 14 e 24 anos.
“Considero a pobreza menstrual um problema criado pelo neoliberalismo, neocolonialismo e capitalismo, que empobrece a população e faz com que pessoas que menstruam não saibam o que tá acontecendo com seu corpo, não tenham condições financeiras, nem socioambientais de gerir seu ciclo de forma higiênica e saudável’’, destaca Willing.
Além dos riscos físicos e psicológicos, as faltas na escola aparecem nas pesquisas, apontando que 16% das estudantes costumam faltar durante o período menstrual por falta de banheiros limpos e 12% estão ausentes das aulas por falta de absorvente durante a menstruação.


Ações governamentais
Recentemente, o presidente Jair Bolsonaro vetou projeto de lei que previa a distribuição gratuita de absorventes íntimos para estudantes de baixa renda e moradores de rua. Com a repercussão negativa, o presidente voltou atrás e declarou que vai viabilizar a aprovação do projeto.
Para a pesquisadora Caroline Willing, é importante haver, também em âmbito municipal, políticas públicas que permitam que quem menstrua possa ter acesso a outras alternativas, além do absorvente descartável. Ela propõe que essas alternativas estejam alinhadas com pequenos negócios locais, fomentando assim a dignidade menstrual e fortalecendo a economia. Ela ainda ressalta a importância de cobrar das empresas um absorvente descartável ecológico.

Ficha Técnica
Repórter: Quiara Camargo dos Santos
Edição e Publicação: Gabriel Ryden
Supervisão de Produção: Vinicius Biazotti
Supervisão de Publicação: Marcos Zibordi, Maurício Liesen

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