Plano Diretor é o instrumento básico para orientar políticas de desenvolvimento da cidade. Foto: Divulgação IPLAN

O Plano Diretor é uma lei municipal que estabelece a política de desenvolvimento e expansão de um município. Segundo a arquiteta e professora de Urbanismo da Unopar Kathleen A. Coelho de Andrade V. Biassio a lei é um instrumento para a organização de uma cidade. “Através do Plano Diretor o governo vai propor todas as diretrizes que a cidade tem que ter para um crescimento adequado e sustentável nos próximos 10 anos”, explica.

O Estatuto da Cidade (lei 10.257/2001) é considerado a base para o planejamento dos municípios brasileiros. Ele estabelece as normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental. De acordo com o artigo 40, inciso terceiro deste estatuto, “a lei que instituir o plano diretor deverá ser revista, pelo menos, a cada dez anos”. A última lei, em Ponta Grossa, foi aprovada em 2006 e deveria ter sido renovada há três anos.

O Plano Diretor é um conjunto de leis, conforme explica a arquiteta. “Dentro do Plano Diretor, a gente vai ter uma legislação bem ampla de outros tipos de leis, de uso do solo, zoneamento, parcelamento urbano, impacto de vizinhança, IPTU progressivo, transferência do direito de construir”, aponta Biassio. Em 2006, somente o projeto amplo foi aprovado, como afirma a arquiteta responsável pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Ponta Grossa (IPLAN), Karla Volaco Gonzalez Stamoulis. “As leis complementares não foram aprovadas [em 2006], então basicamente ele não se tornou efetivo. As propostas, as diretrizes que estão nessa lei não se efetivaram”, comenta. “Você vai ter essa diretriz para que ela cresça assim, mas no momento de realizar as ações, elas talvez não tenham uma obrigatoriedade”, completa Stamoulis.

A discussão sobre a atualização da lei começou no ano passado e foi dividida em quatro fases: apresentação da proposta e metodologia, sistematização do diagnóstico da cidade, formulação das propostas e, finalmente, a organização das etapas para a implementação. O IPLAN, órgão responsável pelo planejamento urbano da cidade, contratou, através de licitação, uma empresa de consultoria especializada para estudar e apresentar o projeto. A Urbtec foi a empresa vencedora da licitação e firmou um contrato com a Prefeitura que somou R$ 1.484.847,05.

Segundo o Termo de Referência assinado pela Urbtec e pelo IPLAN, a empresa seria responsável por “definir objetivos, diretrizes e ações para a política municipal de desenvolvimento territorial e de expansão urbana”. A elaboração do Plano Diretor deveria levar em conta a garantia do direito à cidade sustentável, o direito à terra urbana, moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte, serviços públicos, trabalho e ao lazer.

Ao todo foram realizadas seis audiências públicas e seis oficinas comunitárias para planejar a proposta, que já foi entregue ao Prefeito e deveria ter sido enviada à Câmara de Vereadores para a aprovação. De acordo com a assessoria de imprensa da Prefeitura Municipal de Ponta Grossa, a média de público das audiências foi de apenas 54 pessoas. Cerca de 21 instrumentos legais devem ser alterados no novo projeto. O volume de documentos foi entregue ao prefeito Marcelo Rangel (PSDB) no dia 30 de setembro. O Plano Diretor (PD) e o Plano de Mobilidade Urbana (PlanMob) de Ponta Grossa foram revisados pelo IPLAN e devem orientar os investimentos, políticas de desenvolvimento e de ordenamento da expansão urbana do município pelos próximos dez anos.

Desafios da Mobilidade Urbana em Ponta Grossa

Um dos desafios do século XXI é conter o crescimento desordenado da cidade. Para a professora Kathleen Biassio, o planejamento urbano é um assunto que deve ser levado em conta. “Quando a gente não tem um planejamento urbano adequado, a gente observa o que tem acontecido aqui em Ponta Grossa. Cada vez temos mais congestionamento, não conseguimos mais andar nas ruas. Aí vamos começar a pensar em determinadas rotatórias, em estacionamento, vamos começar a diminuir calçadas”, aponta a professora de Arquitetura e Urbanismo.
Para Biassio, as cidades brasileiras devem pensar em soluções modernas e sustentáveis. “O que a gente tem que pensar é que cada vez mais os países da Europa estão assinando acordos em relação à diminuição de automóveis e do uso de combustíveis fósseis, e a gente está aumentando a largura das ruas, retirando os estacionamentos para que a gente possa ter mais carros na rua”, critica. “A gente sabe que esse não é um caminho, que é um caminho a curto prazo e que não vai resolver nem a médio prazo, nem a longo prazo”.

Segundo projeções do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (IPARDES), em 2017, Ponta Grossa concentrava uma população de 344.332 habitantes e, de acordo com dados do DETRAN, 198.376 veículos foram registrados nesse ano. Através da projeção do IPARDES, feita em 2016, acredita-se que a população ponta-grossense pode chegar a 355.685 em 2020 e 381.051 em 2030. O número de veículos cadastrados em Ponta Grossa passou de 130 mil em janeiro de 2010 para 207 mil em maio de 2019, segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Detran).

Outra lei que também influencia diretamente na política urbana do município é a Lei do Sistema Viário (Lei nº 4.841/92). Em Ponta Grossa, a legislação possui mais de duas décadas. Aprovada em 1992, define as categorias e tamanhos das ruas. O crescimento da cidade propõe uma reformulação completa de toda a dinâmica urbana. “Com as mudanças que a gente teve na cidade, a gente teve um desafogo no trânsito, mas foi momentâneo, durou pouco tempo. Temos que pensar em transporte coletivo, temos que pensar em modais ativos, caminhada, bicicleta, mesmo pensando numa cidade que tem uma topografia bem complicada como Ponta Grossa”, explica Biassio.

De acordo com o IPLAN, o Plano de Mobilidade Urbana tem o objetivo de “integrar o planejamento urbano, transporte e trânsito, observando os princípios de inclusão social e da sustentabilidade ambiental”, além disso, prioriza “o transporte coletivo e não motorizado na matriz de deslocamentos da população”. Outras funções do Plano de Mobilidade visam a redução de desigualdades, a promoção da inclusão social, do acesso aos serviços básicos e equipamentos sociais, melhoria nas condições urbanas da população e acessibilidade.

 

Fonte: LEI Nº 4841/92 (1992)

 

Uso e Ocupação do Solo

Segundo o censo realizado em 2010 pelo IBGE, 97,8% dos ponta-grossenses residem em área urbana e apenas 2,2% da população está na área rural. Conforme os estudos do novo Plano Diretor, historicamente o centro de Ponta Grossa foi ocupado pelas classes de renda alta e média, enquanto os loteamentos mais distante ficaram com a população de baixa renda. “Ponta Grossa já se espalhou tanto pela sua periferia que já adquiriu a maior mancha urbana do interior do Paraná. A cidade ganha em alguns quilômetros quadrados da mancha de Londrina por causa dos nossos imensos vazios. A nossa mancha deixa vazios aqui e vai aparecer quilômetros à frente”, afirma o Engenheiro Civil e Arquiteto Joel Larocca.

A ocupação da cidade se deu de modo desordenado. Segundo os estudos que constam no projeto do Plano Diretor, “até 1960, a área urbanizada restringia-se às áreas centrais e a quatro eixos de ocupação ao longo das avenidas Dom Pedro II, Monteiro Lobato, Carlos Cavalcanti e Visconde de Mauá”. Conforme os estudos, o crescimento desordenado resulta em grandes vazios urbanos.

 

O sentimento de crescimento da cidade a partir da verticalização

O novo Plano Diretor prevê regras mais claras para o que os especialistas chamam de verticalização, ou seja, a construção de prédios altos em determinadas áreas. O IPLAN dividiu a cidade em cinco eixos centrais, levando em conta a largura das avenidas e a capacidade de infraestrutura. As áreas adensadas pelo novo Plano seriam a Avenida Visconde de Mauá, Avenida Visconde de Taunay, Avenida Dom Pedro II e, em menor escala, a Avenida Monteiro Lobato e a Avenida Carlos Cavalcanti.

 

Hierarquização do Sistema Viário

Sistema viário de Ponta Grossa

 

De acordo com o Engenheiro Civil e Arquiteto Joel Larocca Junior, Ponta Grossa sempre foi pouco vertical. Para ele, a cidade “está despertando para a verticalização atualmente”, tendo em vista o programa Minha Casa MInha Vida, por exemplo. “[O programa] deu um toque nesse tipo de coisa quando criou o que eu vou chamar de verticalização periférica. São os edifícios de quatro pavimentos, alguns de seis, que ficam mais ou menos a quatro quilômetros e meio da cidade em linha reta. É uma distância considerável”, comenta Larocca.

Segundo dados do Plano de Habitação de Interesse Social do Estado do Paraná, cerca de 7.211 famílias vivem em assentamentos precários em Ponta Grossa, sendo 4.360 moradias distribuídas em 48 favelas, e 2.851 edificações em 15 loteamentos clandestinos. Uma das preocupações registradas no projeto do Plano Diretor deste ano é o desenvolvimento urbano a partir da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do município.

Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010, a renda média dos domicílios particulares permanentes em Ponta Grossa era de R$ 1.058,15. Segundo o IBGE, a renda média na área urbana era de R$ 1.070,91, enquanto que, na área rural, o valor cai para menos da metade, cerca de R$ 484,51. Para Joel Larocca, os apartamentos são, por definição, moradia da classe mais abastada. “Ponta Grossa sempre foi o patinho feio na verticalização porque é uma cidade de poucos recursos nas mãos do povo. Ela tem a indústria mais dinâmica do interior do Paraná, mas esse dinheiro não fica nas mãos das pessoas que trabalham”, ressalta o engenheiro.

Embora a verticalização seja uma realidade nas grandes cidades brasileiras, especificidades devem ser levadas em conta, como o entorno dos grandes prédios, o saneamento básico e a mobilidade urbana. Joel Larocca chama a atenção para o que considera verticalização estelar. “Toda em estrela, sem excessos no centro, mas com os cinco grandes eixos bastante nítidos”, explica o engenheiro. “A gente pode dizer que o ponta-grossense está se sentindo, de um certo modo, em um processo de crescimento. Se esse crescimento é real, se ele vai ser bom, não é o caso, ele está simplesmente sentindo que a cidade cresce”, completa.

 

Projeto deve ser aprovado na Câmara de Vereadores

Apesar de anunciado pela Prefeitura que os documentos seriam enviados à Câmara no dia 1º de setembro, vereadores ouvidos pela reportagem afirmam que o projeto ainda não chegou no legislativo. A informação foi confirmada pelo presidente da Casa, Daniel Milla (PV). Em nota, a Prefeitura de Ponta Grossa afirmou que o Plano Diretor ainda não foi encaminhado à Câmara porque “o formato em que ele foi produzido não estava de acordo com a Lei Orgânica e foi devolvido para a empresa responsável pela elaboração para adequação. O documento já retornou e aguarda tramitação interna”.

Embora não tenha chegado oficialmente à Câmara, os vereadores já estudam o tema. Para Felipe Passos (PSDB), as prioridades serão as calçadas. O vereador é cadeirante e está preocupado com a acessibilidade. “Em uma das reuniões, eu enviei um requerimento mostrando a necessidade de ser um piso de cimento para não dar espasmos [nos cadeirantes]”, afirma Passos.

Se depender do vereador Pastor Ezequiel (PRB), o projeto não será aprovado na íntegra. “Tem muitas coisas que vão ser modificadas e quem têm nos procurado são os construtores que estão preocupados com o Plano Diretor”, relata. O IPLAN afirmou que está à disposição dos vereadores para debater o assunto.

 

Arquivo Portal Periódico

26/10/2019 -  Documento do Plano Diretor é finalizado com atraso de três anos

30/07/2018 - Prefeitura de Ponta Grossa revisa Plano Diretor Municipal com dois anos de atraso

 

Ficha Técnica

Reportagem: Thailan de Pauli e Hygor Leonardo dos Santos
Edição: Thaiz Rubik
Foto: Divulgação IPLAN
Mapa:URBTEC
Supervisão: Angela Aguiar , Fernanda Cavassana e Helena Maximo

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