Disciplinas como Psicologia, Filosofia e Sociologia integram campo humanístico.
Apenas 13% dos 2006 estudantes da rede pública de Ponta Grossa, que optaram por realizar o ensino técnico/profissionalizante de maneira subsequente (após o término do Ensino Médio) em 2019, possuem acesso às disciplinas voltadas para a formação humanística. Das oito instituições de ensino abrangidas pela rede pública, apenas a Escola Estadual Regente Feijó (EERJ) mantém disciplinas voltadas para a área humanística para os seus 258 alunos de cursos profissionalizantes. As disciplinas são distribuídas entre os cursos de Técnico em Secretariado, Administração e Recursos Humanos.
Para o Chefe de Educação do departamento de Pedagogia da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Oriomar Skalinski Junior, a constatação representa um problema para a formação dos indivíduos. “Ter conhecimento e formação humanística torna o indivíduo intelectualmente mais rico. A formação acalenta melhorias para a sua vida, para suas noções, percepções de habilidades e em relações interpessoais”, afirma o professor.
Skalinski frisa que “Quanto mais embrutecida (voltada exclusivamente a disciplinas pragmáticas e objetivas) for a formação do sujeito, mais vulnerável ele se encontra em relação às impulsividades que podem acomete-lo fora do trabalho”. Segundo o professor da UEPG isso é fruto de uma cultura na educação centrada demais na objetividade. “Hoje em dia estamos ligados a uma perspectiva muito pragmatista, que diz que algo é bom ou útil na medida que serve imediatamente. É muito comum notar isso, em uma divisão na história da educação entre o que é instrução (habilidade técnica adquirida por meios concretos e objetivos) e educação (formação no sentido amplo) ”, afirma o pedagogo.
Já para o diretor de ensino da Softgraf, Valcedir Menon, a inclusão das matérias não se justifica no contexto atual. “Como a maioria dos que procuram esse tipo de curso são recém-saídos do ensino médio, são formados ou ainda estão na faculdade, não há necessidade de incluir conteúdo humanístico, visto que os alunos já tiveram contato anteriormente”, afirma Menon.
A professora e coordenadora do curso de Técnico em Secretariado do colégio Regente Feijó, Thania Mara afirma que existe uma diferença notável entre aqueles que apenas cursam as matérias humanísticas no ensino médio e aqueles que cursam junto ao ensino técnico. “Vejo muito em nossos alunos maiores condições de interpretar, de conhecer, de saber se relacionar do que um aluno que possui apenas a formação no ensino médio, que muitas vezes precisa trabalhar para se manter, além de estudar. O objetivo de uma escola, independente da área da educação, é formar um cidadão, para depois formar um profissional. Isso vale para qualquer ramo”, argumenta Mara.
Thania Mara também descreve o método empregado no Regente Feijó e seus efeitos nos alunos. “Nossos professores são muito comprometidos em trabalhar a questão do se conhecer e se aceitar, para depois conhecer e manter bom relacionamento com os outros. Antes de serem profissionais, nossos alunos precisam ser humanos, eles aprendem a fazer tudo que se espera deles na condição de técnicos, mas priorizamos primeiro o ser e depois o fazer”.
O Boletim Quadrimestral Sobre Benefícios por Incapacidades de 2017 divulgado pela Previdência Social, coloca o afastamento por transtornos mentais como a terceira maior causa de desligamento do trabalho, com possibilidade de vir a ser a primeira até 2020. Apenas o afastamento por Lesões, envenenamentos e outras causas externas e Doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo, estão a frente.
O artigo 1º da Resolução CNE/CEB Nº 04/99, institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de Nível Técnico. Em parágrafo único, ele descreve a educação profissional, integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, com o objetivo de garantir ao cidadão o direito ao permanente desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva e social.
Principais danos que a falta de formação humanística traz ao indivíduo, segundo o Professor Oriomar Skalinski:
· Na falta de conhecimento sobre si próprio o indivíduo tende a perder a noção de sua capacidade de trabalho, e com isso pode exigir demais de si mesmo. O que culmina em: pressão exagerada, crises de autoestima, síndrome de Burnout (esgotamento físico e psíquico), contração de doenças psicossomáticas e vulnerabilidade a possíveis violências e abusos laborais imbuídas pelos seus superiores;
· Propensão a atividades escapistas (saída com amigos, happy hours, consumo de substâncias anestesiantes, como bebida alcoólica, narcóticos e até substâncias ilícitas) de modo compulsivo, culminando em vícios;
· Desgaste psicológico e stress além do comum, que acumulados podem ser revertidos no ambiente doméstico através de violência psicológica ou física;
· Ao estar envolto em ambientes pragmatistas e objetivos, como são o da área técnica, o sujeito tende a ter sua resiliência exigida constantemente, algo que o faz sofrer de reedificação/coisificação. Perda de sensibilidade nas relações interpessoais, empatia e comportamento robotizado são algumas das características.
Leia mais:
Nutead oferece cursos gratuitos de capacitação a distância
Cortes no Mais Educação prejudicam formação socio-cultural
Falta de concurso público afeta ensino fundamental e médio
Ficha técnica
Reportagem: Yuri Marcinik.
Edição: Hellen Scheidt.
Foto: Yuri Marcinik.
Supervisão: Angela Aguiar, Ben-Hur Demeneck, Fernanda Cavassana, Hebe Gonçalves e Renata Caleffi.