A cidade ainda passa por dificuldade para quantificar os dados de trabalho infantil

Passo pela principal do bairro e avisto uma criança segurando um daqueles suportes cheios de algodão doce, uma menina de baixa estatura e franzina. Parada encostada ao poste de luz com um sorriso tímido e com voz baixa pede “Moça compra um algodão doce meu?”. Feliz com o “sim”, entrega o algodão e eu procuro saber mais sobre ela. *Bianca tem 12 anos, e trabalha há cerca de dois anos no comércio, vinda de uma família de classe baixa vende algodão doce de segunda a sábado para ajudar sua renda da casa. Bem como toda sua família trabalha na venda de algodão doces. Moradora do conjunto habitacional Costa Rica- Uvaranas, em uma casa da Pró-lar, moram ela e mais os três pessoas, a mãe, o pai e seu irmão mais novo. Pela manhã frequenta a escola com um sonho ser veterinária. *Bianca não é uma exceção, mas é sim uma realidade de muitas outras crianças, outras Biancas, Carolinas, Pedros e Henriques espalhados pelas áreas urbanas e rurais da cidade de Ponta Grossa que são personagens da vida real de trabalho infantil.

 

 

Ponta Grossa tem cerca de 5,06% de crianças em situação de trabalho infantil, segundo os dados 2010 do DATASUS que é o estudo mais recente. Enquanto a média nacional 9,42% Ponta Grossa mostra um resultado abaixo desta média, porém ainda possui um dado alarmante. Thais Verillo diretora do Departamento de proteção especial de Proteção Especial de Ponta Grossa, lamenta que “infelizmente mapear um problema como esse é muito difícil, uma vez que parte desse trabalho é invisível”. Para contextualizar a situação do município, comparamos os dados de trabalho infantil com a cidade de Cascavel, pois possui similaridades com Ponta Grossa.

 

 

 

 

Thais Verillo ainda explica que dentro da política de assistência, o trabalho infantil é uma violação dos direitos da criança. A diretora afirma que há muita dificuldade em identificar o trabalho infantil em nosso município porque as pessoas não compreendem a gravidade deste problema.

 

 

O direito de brincar é reconhecido internacionalmente desde 1959 na Declaração Universal dos Direitos da Criança, que o prevê como uma vertente do direito à liberdade de meninos e meninas. E o não cumprimento dessas diretrizes podem causar diversos impactos psicológicos à criança e ao adolescente como a responsabilidade gerada na criança em participar da renda familiar; (ii) privação do processo de aprendizagem gerando danos em seu desenvolvimento cognitivo motor; (iii) impedimento do brincar. “É importante frisar que o brincar e o jogar não se resumem apenas a formas de divertimento e de prazer para a criança, mas são meios privilegiados dela expressar os seus sentimentos e aprender.”- explicita a psicóloga Tassiane Breus.

 

 

A infância, segundo a psicologia, é uma espécie de tubo de ensaio para as fases de vida subsequentes. Nesta fase, experimentam-se, desenvolvem-se e treinam-se competências e recursos essenciais ao longo da vida. O trabalho infantil amputa uma vivência plena da infância como brincar, aprender, sonhar, imaginar, gerando adultos frustrados sem perspectivas profissionais e emocionais, perpetuando um ciclo de pobreza passada por gerações.   

 

 

Esse obstáculo enfrentado por mais 9% das crianças do nosso país é reflexo da pobreza. Segundo o levantamento da Fundação Abrinq, 40,2% das crianças e adolescentes até 14 anos vivem em situação de pobreza e cerca de 4 milhões de crianças moram em favelas. Para a psicóloga Tassiane Breus a pobreza acarreta na inclusão dessas crianças em zonas de vulnerabilidade, como “exposição direta a violência, tráfico de drogas, assédio sexual, falta de saúde e educação, desgastes físicos e emocionais não compatíveis com suas faixas etárias. Entre essas vulnerabilidades também é importante destacar a imposição para a criança na realização de trabalho infantil.” - finaliza Tassiane.

 

 

Segundo a conselheira tutelar, Rafaela Zaze, o tipo de serviço mais comum que uma criança pratica em Ponta Grossa é a venda de algodão doce. A conselheira explica qual é a função do Conselho Tutelar. “Nós somos a porta de entrada, portanto somos nós que fazemos a abordagem e atendimento da criança, então entramos em contato com os pais, orientamos, procuramos saber se a criança está na escola, entendemos a condição da família e aí então damos o encaminhar ao CRAS (Centro de Referência da Assistência Social) ou para o Ministério Público se necessário.”

 

 

No CRAS esta criança receberá um acompanhamento para se ter o controle de sua frequência na escola e se não voltou a trabalhar nas ruas. Thais Verillo ressalta que podem existir casos em que a criança é única renda familiar, às vezes por não ter pai, ou a mãe precisar cuidar dos filhos pequenos. Neste caso, a assistência toma outro rumo. “Nós verificamos se a criança está frequentando a escola corretamente, mesmo que trabalhe”, explica a diretora, que ressalta que o rendimento escolar desta criança não será bom. Além do acompanhamento, o CRAS busca suprir as principais necessidades desta família, em alguns casos com um auxílio de cestas básicas, gás, entre outros tipos de auxílios.

 

 

Rafaela Zaze, explica quais são as atitudes corretas a serem tomadas em casos de trabalho infantil:

 

 

 

A Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, Art. 60. proíbe qualquer tipo de trabalho para menores de quatorze anos de idade, salvo na condição de aprendiz. Portanto a diretora do departamento de proteção especial, Thais Verillo, explica quais profissões são adequadas para cada idade. “Até 14 anos é expressamente proibido, de acordo com o ECA, de 14 a 16, pode apenas como estagiário e aprendiz, e de 16 a 18 anos, trabalhos que não a coloque em riscos, ou prejudique a saúde e/ou os estudos” esclarece Verillo.

 

 

Assim como acontece com Bianca, o trabalho infantil já é uma realidade muito antiga e uma das principais causas de analfabetismo no Brasil. Em entrevista com a professora da EJA (Educação para Jovens e Adultos) de Ponta Grossa, Enese Fabrício, grande parte dos alunos que frequentam suas aulas, deixaram de estudar quando criança, para poder trabalhar e auxiliar nas despesas da casa.

 

 

Tipos de trabalho infantil segundo o Tribunal Superior Trabalho (TST):

 

  • Doméstico:
    Trabalho infantil exercido atividades domésticas em casa de terceiros, segundo o TST é um dos mais comuns tipos de trabalho e que podem ser considerados “invisível” pois seu trabalho é realizado no interior de casas de terceiros e não na casa da própria criança. Fica entre o grupo mais vulnerável e explorado, bem como o mais difícil de proteger. Segundo o Decreto 6481/2008, o trabalho doméstico apresenta sérios riscos ocupacionais às crianças, tais como posições não ergonômicas e movimentos repetitivos, tracionamento da coluna vertebral, sobrecarga muscular, traumatismos, queimaduras, entre outros.

 

  • No campo
    Geralmente são  casos de famílias que enfrentam dificuldades – mães criando a famílias sozinhas, ou pais desempregados. Parte desses meninos e meninas garante a feira da família e o pagamento de água e energia.  Expõem a vulnerabilidade da criança em dois agentes agressivos: vida precária, com alimentação e moradia inadequadas situações de riscos psicológicos, sociais, físicos, químicos e biológicos. Prejudicial à saúde e segurança, o trabalho com fumo, algodão, sisal, cana de açúcar, assim como na pulverização e manuseio de agrotóxicos, ou ainda com tratores e outras máquinas agrícolas.
    O menor de idade só pode trabalhar na lavoura na condição de aprendiz, seguindo os parâmetros do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e da Constituição: maior de 14 anos, matriculado e frequentando a escola.

 

  • Nas ruas
    Reflexo da pobreza O trabalho infantil nas ruas é uma situação degradante e perigosa. muitas crianças são expostas a serviços como Vendedor ambulante, flanelinha, lava pára-brisas nos sinais e dentre outras situações de risco para complementar a renda familiar, sacrificando seus estudos e a garantia de futuro melhor. Os tipos de riscos, são os mais variados entre eles: assédio, especialmente as meninas. Podem ser atropeladas, além dos danos causados à saúde física e psicológica. O trabalho nas ruas e outros logradouros públicos, seja no comércio ambulante, guardador de carros, transporte de coisas, pode comprometer o desenvolvimento afetivo, gerar dependência química, atividade sexual precoce, desidratação, hipotermia, ferimentos, além de outros malefícios, conforme descrito na lista das piores formas de trabalho infantil.

 

  • Exploração sexual
    A violência sexual pressupõe o abuso do poder onde crianças e adolescentes são usados para gratificação sexual de adultos, sendo induzidos ou forçados a práticas sexuais. Essa violação de direitos interfere diretamente no desenvolvimento da sexualidade saudável e nas dimensões psicossociais da criança e do adolescente, causando danos muitas vezes irreversíveis. Em 2014, o Disque-Denúncia Nacional da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR) registrou mais de 91 mil denúncias de violações de direitos de crianças e adolescentes. Esse número não representa, necessariamente, o tamanho do problema, mas traz uma dimensão de como está fortemente inserido na sociedade.
    É considerado também prejudicial à moralidade, o trabalho na produção ou distribuição de objetos pornográficos, realizados em salas ou lugares obscenos ou na venda de bebidas alcoólicas.

 

  • Perigoso
    Trabalhos que expõem a criança a abuso físico, psicológico ou sexual. Trabalho subterrâneo, debaixo d'água, em alturas perigosas ou em espaços confinados.Trabalho com máquinas, equipamentos e instrumentos perigosos ou que envolvam manejo ou transporte manual de cargas pesadas. Trabalho em ambiente insalubre que possa, por exemplo, expor a criança a substâncias, agentes ou processamentos perigosos, ou a temperaturas ou a níveis de barulho ou vibrações prejudiciais a sua saúde.Trabalho em condições particularmente difíceis, como trabalho por longas horas ou noturno, ou trabalho em que a criança é injustificadamente confinada ao estabelecimento do empregador.

Dia 18 de maio é o dia nacional de combate ao abuso e a exploração sexual  contra crianças e adolescentes. No mundo, a cada sete minutos uma criança ou adolescente entre 10 a 19 anos morre vítima de violência. Confira na matéria de Raylane Martins:

Fotos: João Pedro Santos Teixeira

A maioria das crianças desaparecidas já foi encontrada pelo Serviço de Investigação de Crianças Desaparecidas (Sicride) da Polícia Civil do Paraná em 2017. Das 109 solicitações de investigação pelo sumiço de crianças, feitas até o mês de junho, apenas dois casos continuam em aberto e sem indícios do paradeiro das vítimas.
O Sicride recomenda que se uma criança desaparecer ou fugir de casa, é preciso acionar a polícia imediatamente. Nesses casos, os familiares não precisam esperar 24 horas para realizar o boletim de ocorrência. O Serviço de Investigação alerta que os pais devem sempre ensinar as crianças a usar telefone, explicar o endereço de casa e orientar os filhos sobre possíveis locais para procurar ajuda caso estejam perdidos.
Só no ano passado, o Sicride registrou 184 casos de desaparecimento de crianças no estado. Mais informações procurar o Sicride pelo telefone (41) 3224 6822 ou a Polícia Militar pelo 190.