- Detalhes
- Produção: Maria Helena Denck
- Categoria: Opinião
- Acessos: 11923
Sem nome, sem empatia e sem esperança. É difícil tentar imaginar que alguém consiga se identificar com uma personagem com essas características. Entretanto, é exatamente isso que ocorre com aqueles que se aventuram e decidem assistir Fleabag, série de 2016 idealizada por Phoebe Waller-Bridge. A personagem principal tem todas as características que ficam escondidas no subconsciente, aqueles traços de personalidade que todo mundo finge não possuir: ela é mal educada, calculista e não sente carinho nem pelas outras pessoas, nem por ela mesma.
Fleabag conta a história de uma mulher não nomeada (no roteiro, ela é chamada pelo nome da série, que, no inglês, se refere a uma pessoa suja, sem moralidade), enquanto ela tenta passar pela vida ignorando a tudo e a todos. No momento em que a conhecemos, a personagem está passando por processos de luto e dificuldades financeiras, além de ter que encarar uma relação das mais complicadas com sua família. A narrativa é construída na análise das interações de Fleabag com as outras pessoas, além de suas interações com a câmera, que serve como um segundo relato da personalidade da personagem.
Imagem: Reprodução
A genialidade do roteiro de Phoebe Waller-Bridge está justamente na utilização de uma personagem que ao mesmo tempo é a pior pessoa do mundo e o retrato dos seres humanos que já passaram por uma situação complicada. Fleabag é fruto de todos os acontecimentos e todas as pessoas que já a afetaram. Ao invés de superar suas dificuldades e encontrar o amor em lugares incomuns, a personagem se tornou entorpecida, dormente. A obra de Phoebe Waller-Bridge é uma viagem às camadas mais profundas da mente humana, as partes que nem nós conhecemos sobre nós mesmos.
Fleabag é a externalização do lado triste da humanidade e, mesmo assim, é difícil não gostar dela, imaginar o processo que leva uma pessoa a enxergar a vida de maneira tão negativa, olhar no espelho e enxergar uma pessoa genuinamente ruim. A questão é que a personagem não é ruim, e, ao longo das duas curtas temporadas, é possível entender que a atenção que não recebeu durante toda a sua vida faz com que ela faça coisas odiosas, já que, para Fleabag, qualquer reação, mesmo que ruim, significa que ela finalmente está sendo vista. Essa característica da personagem é demonstrada, também, pelas piadas constantes que ela faz com ela mesma e com as outras pessoas. Para alguns, essas piadas podem parecer de mal gosto e indelicadas, mas, de alguma maneira, na série elas funcionam, e trazem um tom engraçado e dramático ao mesmo tempo para a narrativa.
O sucesso de Fleabag não quer dizer que todas as pessoas são ruins, e sim que reconhecem os processos que fazem com que suas dores fiquem escondidas. A personagem tem a coragem de falar o que não é dito, não é pensado e não é refletido.
Ficha Técnica
Aluna: Maria Helena Denck
Publicação: Maria Helena Denck
Supervisão de produção: Mauricio Liesen
Supervisão de publicação: Mauricio Liesen
- Detalhes
- Produção: Emelli Schneider da Silva
- Categoria: Opinião
- Acessos: 1003
Uma Skatista Radical: é esse o nome de um filme que se encontra no catálogo da Netflix. O enredo vai contar ou, melhor dizendo, mostrar a descoberta de Prerna, uma adolescente Indiana que, após se apaixonar pelo skate, precisa decidir se irá cumprir as expectativas da sociedade ou realizar seu sonho de participar no campeonato de skate.
O filme me levou a refletir sobre coisas que são impostas às meninas desde muito cedo e que devemos cumprir, deixando de lado nossas próprias vontades. Outra coisa a ser notada no filme é que Prerna se encontra numa situação de trabalho infantil, deixando a escola de lado.
Esse filme foi lançado em 2021. Coincidentemente, no ano em que o skate fazia a sua estreia nas Olimpíadas, e vimos pela primeira vez, mundialmente, a força do skate feminino e aonde esse pode chegar. Uma continuação do que foi visto nas olimpíadas é o mundial de skate street (SLS) que, no ano passado, consagrou a brasileira Pamela Rosa como bi campeã mundial.
Capa do filme "Skater Girl". Foto: reprodução
Neste ano, no final de semana de 16 e 17 de julho, tivemos a primeira etapa de 2022 da Street, em que a japonesa Yumeka Oda fez História ao atingir 9.4, a maior nota feminina no campeonato.
Esses exemplos remetem ao filme porque a personagem precisava lidar com uma cultura que não aceita que ela ande de skate e nem que ela se dedique a isso, mostrando quantas meninas precisam de incentivos, pessoas que apoiam e mostrem que elas podem fazer aquilo que quiserem.
Grandes skatistas como Rayssa Leal, Pamela Rosa, Yumeka e muitas outras devem ser vistas pelas próximas gerações para que essas tenham coragem de fazer aquilo que tem vontade. No filme, Prerna precisou de incentivo para ir atrás de seus sonhos, como na cena fortíssima que retrata quando ela foge de ser apresentada para pretendentes e vai para o campeonato de skate. Isso mostra sua paixão pelo esporte, além de quebrar padrões e incentivar o encontro com a Liberdade.
Outro elogio ao filme, antes de concluir, é a lição de vida que traz, além de mostrar outra cultura e uma certa dose de esperança para um mundo mais justo e melhor.
Ficha técnica
Aluno: Emelli Schneider da Silva
Publicação: Ana Luiza Bertelli Dimbarre
Supervisão de produção: Marcos Zibordi
Supervisão de publicação: Marcos Zibordi e Mauricio Liesen
- Detalhes
- Produção: Camila Souza
- Categoria: Opinião
- Acessos: 5814
Stranger Things era pra ser do gênero drama, segundo a Netflix, criadora da série. E, em sua proposta inicial, a história trazia fortemente a amizade de quatro garotos: Will, Dustin, Mike e Lucas, típicos nerds de doze anos, mais ou menos. Com o desaparecimento misterioso de Will, foi possível perceber muito forte o amor e o companheirismo dos amigos. Foi graças à amizade e também com a ajuda de uma misteriosa garota, muito esquisita, que apareceu do nada, que foi possível resgatar Will.
Capa da série "Stranger Things". Foto: Reprodução
Porém, o problema, ao menos para mim, começa na segunda temporada, com a chegada de dois novos personagens, os irmãos Billy e Max. O primeiro, completamente desnecessário, o típico garoto escroto que quer pagar de bad boy e que se acha bonitão com aquele corte de cabelo Mullet (que, convenhamos, é horrível).
A sua irmã é uma menininha que também não agrega nada e que nessa temporada só sabe jogar joguinho de fliperama e criar o caos no grupo. Infelizmente, logo acaba sendo aceita, sem um motivo válido. Acontece que, com a chegada dela, a série passou a dar um maior enfoque em romancezinho adolescente: logo Max passa a se relacionar com Lucas e a menina esquisita, carinhosamente chamada de Onze, também passa a se relacionar com Mike.
Com isso, senti que o grupo se dividiu e a proposta inicial da amizade se rompeu e se perdeu. Começou a focar mais nos casais e suas picuinhas desnecessárias, como ciúmes ou disputa por atenção. Já os solteiros acabaram ficando de lado na trama. Com isso, a série de drama foi bruscamente direcionada para um romance (talvez o drama tenha ficado por parte dos casais somente).
Com toda essa enrolação, aparentemente não só o público, mas os criadores da série, se apegaram aos personagens, pois não foram capazes de dar um o final necessário justamente pelo apego emocional a personagens que deveriam sair de cena, coisa que o público esperava.
Quanto à quarta temporada, problemática, contou com a chegada de vários novos personagens e vilões. O cenário prometia levar o público ao delírio, e a história começou com muito drama e mistério, além dos quatro protagonistas retornarem à série mais maduros, tendo que lidar com a distância forçada que aconteceu na temporada anterior.
Houve várias mortes misteriosas e a chegada do querido Eddie, que comanda um clube chamado Hellfire, reunindo garotos do colégio para jogar D&D (Dungeons & Dragons). Logo com a chegada do personagem, muitos passaram a acreditar que o Eddie seria o responsável pelas mortes, ele faz o perfil abominado por certos setores da sociedade: roqueiro, cabeludo e em um clube chamado Hellfire, era inevitável associá-lo às mortes. Mais adiante, foi comprovada a sua inocência através dos quatro amigos que voltaram a se reunir.
Depois de bolarem um plano para matar o verdadeiro vilão, a morte de graça do Eddie chocou e desapontou o público. A falta de capacidade dos criadores em elencar melhor a série ficou bem clara. Poderiam ter poupado alguns personagens e matado outros. Um exemplo da falta de capacidade se deu na própria morte do Eddie: mataram o personagem unicamente por não conseguirem comprovar sua inocência.
Como a série foi dividida em duas partes, havia a expectativa para a parte final. A morte de personagens era certa para o público e gerou burburinho nas redes sociais. Todo esse questionamento foi equivocado e nada do que havia de especulação realmente aconteceu. Isso fez com que grande parte do público se decepcionasse: os criadores mobilizaram sentimentalismo e apego para poupar a vida de personagens que um dia foram úteis.
Ficha Técnica
Aluno: Camila Souza
Publicação: Maria Helena Denck
Supervisão de produção: Marcos Zibordi
Supervisão de publicação: Marcos Zibordi e Mauricio Liesen
- Detalhes
- Produção: Sara Dalzotto
- Categoria: Opinião
- Acessos: 370
Todo Dia a Mesma Noite, nome escolhido por Daniela Arbex para seu livro-reportagem, traz junto a cada linha a torturante memória para quem lê e quem sentiu o acontecimento, um incêndio que matou 242 pessoas na boate Kiss. A jornalista cumpre os preceitos do gênero livro-reportagem, apuração intensa que dá ao leitor um entendimento o mais completo possível sobre determinado assunto.
Capa do livro "Todo dia a mesma noite". Foto: Sara Dalzotto
A história é traduzida de relatos da noite de 27 de janeiro de 2013, na boate Kiss, em Santa Maria-RS, uma cidade universitária. Ao ler, pude me imaginar em diversas das situações citadas pela autora. Imagens que possivelmente continuarão em meus pensamentos, bem como os jovens em uma simples ida à balada no final de semana, coincidentes ocasiões que fizeram outros estarem lá, e ainda mais: cinco amigas se arrumando juntas para comemorar um aniversário, enquanto a mãe de uma delas reforçava o clichê “filha, te cuida”. A passagem é a seguinte:
“Com fome de viver, ela se preocupava pouco com o futuro. Deixava a mãe, Ligiane, preocupar-se pelas duas, afinal tinha tempo de sobra pela frente, e isso lhe bastava.
— Filha, te cuida — pedia Ligiane.
— Mãe, sabe o que eu descobri? Que quando uma mãe diz ‘te cuida’ para a filha ela quer dizer ‘eu te amo’.
— Então te cuida!”.
Algumas horas depois, os corpos das meninas estavam no último ponto de procura dos familiares: o Centro Desportivo Municipal.
Nas palavras e frases usadas para descrever a busca por sobreviventes, telefones tocam simultaneamente e a palavra “mãe” nas telas acesas muitas vezes é visível; gritos por socorro de pessoas que seriam mais difíceis de salvar são contados. Detalhes dos relatos como esses fizeram toda a diferença para mim, que pude tentar compreender o caos, a tristeza e a agonia perpetuada, que exigiu grande força dos profissionais de salvamento, que precisavam ignorar as centenas de ligações perdidas nos telefones em meio a corpos caídos.
Apesar da tristeza, o livro-reportagem é escrito de maneira sensível. A leitura é necessária, recomendada a quem gosta de ler histórias reais.
Ficha Técnica
Aluno: Sara Dalzotto
Publicação: Maria Helena Denck
Supervisão de produção: Marcos Zibordi
Supervisão de publicação: Marcos Zibordi e Mauricio Liesen
- Detalhes
- Produção: Gabriela de Paula Oliveira
- Categoria: Opinião
- Acessos: 21667
A canção “Desconstrução”, de Tiago Iorc, é a primeira faixa do álbum Reconstrução, lançado em 2019. Composta por Iorc, a música retrata a (de)pressão causada pelas redes sociais e as relações líquidas.
A história cantada pelo músico parece ser de uma garota tímida que não tinha os pais presentes e, por isso, buscou a atenção de outras pessoas. Tal busca por atenção nas redes sociais é um pedido de ajuda de pessoas que tentam preencher o vazio que sentem. Só que nem sempre este pedido é ouvido; como diz um dos versos da canção: “Ninguém notou a sua depressão. Seguiu o bando a deslizar a mão para assegurar uma curtida”.
A falta de sensibilidade para não perceber que o outro precisa de ajuda é resultado de querer mostrar uma vida perfeita nas redes sociais. Acredito que isso gera pressão e depressão em quem não se encaixa no padrão. Nós perdemos nossa sensibilidade porque só enxergamos o que o outro posta e convenhamos que a maioria das pessoas não gosta de aparentar uma vida imperfeita no mundo virtual.
A música ainda nos convida a refletir sobre as relações líquidas. O filósofo e sociólogo polônes Zygmunt Bauman defende a tese da sociedade líquida, pois, com o decorrer do tempo, as relações estão ficando cada vez mais superficiais e o contato entre indivíduos fora do mundo virtual está cada vez menor. No verso “Viralizou no cio da ruína, ela era só uma menina”, é perceptível que a personagem da música estava descobrindo o mundo e a si mesma, e acabou chegando à ruína porque as relações estabelecidas por ela eram tão superficiais que não perceberam que ela precisava de ajuda.
Isto é um triste retrato de que as redes sociais estão minando as relações e contatos entre indivíduos fora do mundo virtual. A reflexão causada pela melancólica canção de Tiago Iorc é profunda e nos faz visitar memórias e questionamentos que estão escondidos em nossa mente, o que pode ser desconfortável porque a música toca brilhantemente em aspectos que nós não queremos tocar. Ela, apesar dos pesares, possui a sensibilidade que nos tem faltado.
Iorc poderia ter sido mais brilhante na parte final da canção, porém. Nos versos “estilhaçou seu corpo celular. Saiu de cena pra se aliviar. Vestiu o drama uma última vez. Se liquidou em sua liquidez”, ele poderia ter explorado a questão do suícidio de uma forma mais aprofundada ou até mesmo sair da obviedade, se a intenção é retratar a (de)pressão das redes sociais, porque o suícidio vem bem antes da morte e, geralmente, há mais de um motivo.
Além de provocar reflexão, Tiago Iorc beirou a genialidade na composição desta música. Isso se deve ao fato de que dialogou com a canção “Construção”, de Chico Buarque, lançada, em 1971, no álbum de mesmo nome. Buarque compôs a música com versos terminando em proparoxítonas. Iorc compôs “Desconstrução” com versos acabando em oxítonas e demonstrando que a música brasileira respira — mesmo que com a ajuda de aparelhos.
A escolha de Buarque por palavras proparoxítonas e a escolha de Iorc por oxítonas terminando os versos estão relacionadas ao ritmo, que tem o objetivo de deixar o ouvinte cada vez mais envolvido nas histórias de ambas canções. Eles conseguem.
Ficha Técnica
Aluno: Gabriela de Paula Oliveira
Publicação: Isadora Ricardo
Supervisão de produção: Marcos Zibordi
Supervisão de publicação: Marcos Zibordi e Mauricio Liesen